Ficaram famosas no meio político nacional as palavras de Juracy Magalhães, um dos tenentes dos anos 20 e participante do golpe militar de 1964, que, inquirido sobre as condições em que assumia, em junho de 1964, o posto de embaixador brasileiro em Washington, respondeu: “O Brasil fez duas guerras como aliado dos Estados Unidos e nunca se arrependeu. Por isso eu digo que é o que bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil".
Passaram-se muitos anos a partir de então, mas a última frase seguiu sendo exemplificativa de um certo tom de subserviência que, ao longo do tempo, vem marcando as relações entre Brasil e Estados Unidos, sendo também um emblema para posturas de exagerado louvor à América, notadamente por parte da mídia majoritária em nosso país.
Essas considerações me vêm a propósito da atual situação por que passam os americanos, mergulhados em uma crise sem precedentes e de difícil equacionamento. O jornalista Paul Krugman , conceituado colunista do “New York Times”, chega a mencionar que a evolução do problema poderá “empurrar os EUA para um padrão República de Bananas”, acrescentando que o desfecho final dos desentendimentos que redundaram em um discutível acordo, “põe todo o sistema de governabilidade em questão”.
Voltando à frase de Juracy Magalhães, ela não surgiu do nada. Na realidade, foi cunhada a partir de uma outra, de Charles Erwin Wilson, um manda-chuva da General Motors que, nomeado Secretário de Defesa pelo governo Eisenhower, teria dito, no Senado americano, que “o que é bom para a General Motors é bom para os Estados Unidos, e vice-versa”. Ela também mereceu divertida versão do Presidente Lula que, interrogado (em sua primeira visita a Washington) sobre as ligações entre o PT e o regime comunista da China, respondeu : “Eu não conhecia a China muito bem, até que o governo americano fez da China seu parceiro comercial preferencial. E eu pensei comigo mesmo: se é bom para os americanos, deve ser bom para os brasileiros.”
Penso que o panorama que agora se vislumbra na economia americana permite a construção de uma nova frase , que parodia todas as anteriores: definitivamente, o que está sendo um mal para os EUA não pode vir a ser um mal para o Brasil.
Obama está sendo empurrado contra a parede e derrotado em suas intenções por um segmento cujo fundamentalismo econômico abomina os valores sociais. A presença crescente, nas grandes decisões nacionais, do “Tea Party” – grupo ultradireitista, que prega a diminuição do Estado e radicaliza em relação à imigração e à religião - aponta para o ideários de uma sociedade cada vez mais fechada e avessa aos interesses dos menos favorecidos. Questões básicas, como a aplicação de maiores impostos às grandes fortunas, ou a retirada de incentivos fiscais à indústria de petróleo, ou a diminuição de gastos com armamentos, ou a manutenção/implementação de benefícios sociais, não encontram eco na maioria dos congressistas americanos.
Decididamente, o que é bom para os republicanos americanos não é bom para os brasileiros. Precisamos, por isso, ficar atentos. E faço essa observação porque não é difícil perceber ligações ideológicas entre o que pensam os políticos americanos mais retrógrados e o que defendem, em nossa política, os segmentos derrotados nas últimas eleições e encastelados na oposição, sustentados pela grande mídia. Aqui também se reage às ações que buscam vincular às atividades do Estados às causas populares. E aqui também, perigosamente, se tenta, pelo viés da instauração de um clima de ingovernabilidade, evitar o prosseguimento de políticas voltadas para as grandes causas sociais.
Penso que os Estados Unidos e os outros endividados países da Europa (Grécia, Espanha, Portugal, Itália, etc) estão pagando o preço devido pela atual versão do capitalismo, o preço de um liberalismo que se quer absoluto e que, em nome das leis de um mercado elevado à condição de Deus, dispensa preocupações sociais e reduz a quase zero os valores humanitários. A crise americana é (mais uma) crise do capitalismo. Realmente, pelas suas dimensões, pode provocar consequências sem precedentes, inclusive em nosso país, dado o perverso sistema de vasos comunicantes que interliga planetariamente o fato econômico. A desarticulação de uma economia (mesmo localizada) enfraquece a todos. Por isso, é preciso muito cuidado para não embarcarmos, aqui, nesse navio em vias de afundar.
Não sou dos que acreditam na morte das ideologias. Não acho, por exemplo que , com a queda do muro de Berlin, caíram os valores socialistas. Os próprios alemães, que derrubaram o muro, não fizeram os mesmo com as estátuas dos filósofos Marx e Engels, que lá estão, em Berlin, como objeto de diária romaria dos simpatizantes. Porque uma coisa é a prática indevida, a ação nefasta, que deve ser rejeitada, e outra coisa são as ideias que preconizam a redenção das grandes massa humanas no sentido da superação das injustiças, ideais imorredouros enquanto perdurarem as desigualdades sociais.
Obama, é óbvio, está longe de ser socialista. As soluções que propõe buscam apenas minimizar ou mascarar as perversidades de um sistema fundado no capital. Mas enfrenta uma turma que até se arrisca a perder os dedos, por não querer ceder os anéis...
E eu fico, aqui, com as palavras de Eduardo Galeano, escritor e pensador uruguaio, que, num misto de visão profética, construção poética e convite à prática política, afirma que o sistema neoliberal não é o único possível e diz pressentir que há, mesmo neste mundo enlouquecido e infame , a gestação de um outro, uma gestação difícil , mas que vingará. Não sei se a minha geração assistirá a esse nascimento, mas é nisso que, firmemente, deposito todas as minhas crenças.
Em tempo:
Por falar em palavras e crenças, quero deixar aqui meu abraço ao Eliakim e a todo o pessoal do DR , esse espaço que, nos seus dez anos de existência, propugna pelo exercício irrestrito da liberdade de expressão , crença maior do ideário democrático.
Rodolpho Motta LimaAdvogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil. Direto da Redação
9 comentários:
Excelente artigo!!! Diz tudo de maneira simples e direta. Eu também NUNCA acreditei na morte das ideologias e sempre disse isso em sala de aula. Muita gente acreditou que com o fim da segunda guerra mundial o nazi-fascismo estaria morto. Infelizmente (nesse caso...) isso não aconteceu e estamos de novo às voltas com um reacionarismo CEGO. E por quê? Porque os nazi-fascistas SABEM que o socialismo NÃO MORREU!!!! É MEDO, e isso conduz à barbárie em oposição ao humanitarismo.
Exatamente, matou a pau.
O socialismo é o caminho mais longo e difícil até o capitalismo.
Cuba está em crise há 5 décadas e com mais de 100 mil assassinatos, por exemplo. Um "paraíso" em que você [e impedido de sair de tão "bom" que é.
A esquerdas não vão se satisfazer enquanto não houver um paredão governamental em cada cidade do mundo.
E por favor o termo "neoliberal" além de errado em termos econômicos é anacrônico e ultrapassado, além de não dizer absolutamente nada.
Que defendam assassinos, vá lá, mas nos poupem dos clichês e frases feitas, da cartilhinha de 1915.
Cuidemos da crise do capitalismo, senão os socialistas vão morrer de fome.
Aqui, os anônimos sabem mais ...
Mery
Eles não se importam com ninguém, afinal matam milhões de inocentes nas guerras pelo petróleo e poder.
Bando de assassinos MALDITOS.
Anônimo vai pro bajular os bandidos.
"Aqui, os anônimos sabem mais..." escrever merda!!!
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
Mesmo com o boicote promovido pelos EUA, em Cuba não há, por exemplo, os 70 MILHÕES de MISERÁVEIS como os deixados pelo FGAGAC-rei-da-privataria-e-do-baseado como herança "bendita" ao LULÃO!!!
E BEM MAIS de "100 mil assassinatos", em MENOS de 5 décadas, também será a herança "bendita" que o PSDBostas deixará, quando for varrido do DESgoverno de SP, o que espero, será em breve!!!
E sobre "defender assassinos" vcs entendem muiiito bem, pois são os maiores tira-sapatos, arria-calças, lambe-bundas e vira-latas dos ianques, os mais ferozes genocidas de todos os tempos!!!
E usar a palavra NEOLIBERAL em relação a vcs, da direitalha, realmente já é um termo anacrônico!!! O correto seria ultraliberal, pois nunca vi gentalha mais favorável a que os pobres sejam EXTERMINADOS, do que os PSDBostas e os demos!!! Não completamente, porque, do contrário, quem limparia suas sujeiras, né não!!!
BABACA!!!
Postar um comentário