Com votos a favor de quem é contra e votos contrários de quem é a favor, o financiamento exclusivamente público chega à reta final. Será mesmo aprovado?
Sociólogo e Presidente do Instituto Vox Populi Nestes dias em que as primeiras propostas de reforma política chegam ao plenário do Senado e enquanto a comissão da Câmara sobre o tema conclui seus trabalhos, muitos se movimentam para apresentar sugestões a respeito do que fazer. É difícil dizer o que sairá disso tudo (se é que alguma coisa vai sair).
Do lado petista, as principais iniciativas vieram do ex-presidente Lula. Cumprindo sua promessa de ser um "embaixador da reforma" depois que deixasse o Planalto, ele dedicou a ela a maior parte de sua agenda ao longo de setembro.
Foram três encontros, com objetivos bem diferentes. O primeiro, restrito a seus correligionários, parece ter sido para que ele se informasse sobre o andamento da matéria no Congresso. Nele, o deputado Henrique Fontana (PT-RS), relator da Comissão Especial da Reforma Política da Câmara, bem como outros parlamentares e lideranças petistas, apresentaram suas opiniões.
O segundo teve o intuito de mobilizar alguns partidos da base aliada para a realização de manifestação popular, em Brasília, a favor da reforma, que deverá acontecer no começo de outubro (se tudo correr como imaginam seus idealizadores). Entre os presentes estavam os presidentes das fundações do PT, do PDT, do PSB e do PCdoB. A ideia era engajá-las no esforço de arregimentar sindicatos, associações de estudantes e entidades de mulheres, negros e outros segmentos, para comparecer e pressionar o Congresso.
O terceiro, o mais importante, foi realizado com as lideranças desses partidos e do PMDB, reunidas no Palácio do Jaburu. Contou ainda com a participação do vice-presidente Michel Temer e de outros cardeais peemedebistas. A pauta era mais objetiva, visando a definir um elenco de propostas em torno das quais todos convergissem. O saldo foi magro. Só concordaram com o financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais.
A proposta consta do anteprojeto elaborado por Henrique Fontana na Câmara dos Deputados e esteve presente nos trabalhos do Senado desde sua famosa Comissão Especial de Reforma Política, aquela dos "notáveis", criada por José Sarney, no início do ano legislativo, com toda pompa.
Lá, ela tinha sido aprovada por ampla maioria: dos 17 senadores presentes à sessão em que foi discutida, 12 votaram pela mudança, incluindo os integrantes do DEM e do PPS. Entre os cinco que preferiram manter o modelo de financiamento que temos, onde recursos públicos e privados são combinados, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) chegou a afirmar ter "até certa simpatia" pelo financiamento exclusivamente público, mas que não votava na proposta por descrer que seu complemento natural, o voto em lista fechada, fosse aceito pelo Congresso. (Curiosamente, o ex-senador Itamar Franco votou pelo financiamento público usando raciocínio oposto, dizendo que fazia isso por ter votado contra a lista fechada.)
Na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, ela foi aprovada, recusada e aprovada de novo.
Primeiro, a CCJ derrubou o relatório do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), contrário à proposta.
Depois, rejeitou o voto em separado do senador José Pimentel (PT-CE), que lhe era favorável.
Com isso, pareceu que a Comissão rejeitara o financiamento público e não apenas o voto de Pimentel. Foi, aliás, o que proclamou seu presidente.
Estava errado, e Renan Calheiros (AL), na qualidade de líder do PMDB, pediu a retificação do resultado. Foi atendido, o que fez prevalecer a aprovação do novo modelo. Mas a CCJ foi além, considerando que isso significava uma aprovação terminativa, que dispensava a apreciação da proposta pelo plenário e autorizava seu envio direto à Câmara. A oposição não aceitou a decisão e procura as assinaturas necessárias paraa impedir o que entende ter sido manobra de Renan.
Assim, aos trancos e barrancos, entre equívocos e espertezas, com votos a favor de quem é contra e votos contrários de quem é a favor, mas com um time de patronos poderosos, o financiamento exclusivamente público chega à reta final. Será mesmo aprovado?
Duas coisas são certas. Uma, que é um dos temas da reforma política que mais rejeição enfrenta na opinião pública. A vasta maioria das pessoas não concorda que recursos orçamentários sejam destinados às disputas eleitorais. Outra, que é fraco o principal argumento de seus adversários, de que não impede as doações privadas ilegais.
A pergunta não é se o financiamento público resolve o problema, mas se o diminui. E se o modelo vigente é, nesse aspecto, preferível (o que não parece ser). |