sábado, 11 de maio de 2013

Enquanto isso...Mesmo com salários astronômicos, médicos não querem trabalhar no interior do país



Brasília – Mesmo a peso de ouro, prefeituras enfrentam dificuldades para contratar médicos no interior e até na periferia das grandes cidades. Nada menos do que 1.228 municípios pediram ajuda ao Ministério da Saúde para atrair recém-formados neste ano. A intenção era preencher 7.193 vagas, mas só 1.460 médicos demonstraram interesse, o equivalente a 20% da demanda.
Os números são do Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab), iniciativa do Ministério da Saúde para levar médicos a rincões do país e áreas carentes nas capitais e regiões metropolitanas. O Provab oferece bônus de 10% nas provas de ingresso em residências médicas a recém-formados que trabalharem por um ano em cidades do programa.
Médico de São Félix do TO tem maior salário da cidade. Foto: Givaldo Barbosa
Balanço do Ministério da Saúde mostra que 233 cidades não atraíram nenhum interessado. Todos os 1.640 médicos inscritos foram selecionados em fevereiro, isto é, ficaram aptos a fechar contrato imediatamente com as prefeituras. Até a semana passada, porém, só 460 profissionais já tinham começado a trabalhar, enquanto outros 140 estavam em processo de contratação.
A formação e distribuição de médicos em território brasileiro entrou na agenda do Palácio do Planalto. A presidente Dilma Rousseff determinou aos ministérios da Saúde e da Educação que preparem um plano para aumentar o número de médicos no país. O governo está convencido de que faltam profissionais e estuda criar ou ampliar faculdades, assim como facilitar a validação de diplomas de quem se formou no exterior, em países como Cuba, Bolívia e Argentina. Outro projeto é abrir mais 4 mil vagas de residência.
A movimentação do governo desperta reações negativas nas corporações médicas. O Conselho Federal de Medicina divulgou, em novembro, o estudo “Demografia Médica no Brasil”, que apontou 371.788 profissionais em exercício naquele ano, o correspondente a uma taxa de 1,95 médico por mil habitantes. O governo quer elevar essa taxa para 2,5 até 2020 — ou até mesmo 2,7. O CFM, porém, considera o atual número suficiente, e diz que o problema está na má distribuição.
— É uma polêmica enorme dizer que falta ou sobra médico. Ninguém tem estudo consistente. O que temos incontestavelmente é que os médicos são distribuídos de forma trágica e injusta com a sociedade. Enquanto temos um a cada 200 habitantes em certos lugares, em outros temos um para cada 10 mil — diz o presidente da Federação Nacional dos Médicos, Cid Célio Jayme Carvalhaes.
O Ministério da Saúde identificou 2.130 municípios com dificuldade de manter ou expandir o Programa Saúde da Família. As cidades têm direito a um número de equipes proporcional à população. Cada equipe é chefiada por um médico. Segundo o ministério, boa parte das cidades tem direito a mais equipes, mas não consegue criá-las por falta de profissionais.
Outro problema é a alta rotatividade. Em 1.190 cidades, mais de 75% das equipes trocam de médico pelo menos uma vez por ano, o que o governo considera excessivo. Em março, o ministério listou 26 municípios que não tinham médico da Família e outros quatro que não tinham nenhum profissional, conforme o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). O cadastro revela que apenas 2% dos municípios possuíam taxa superior a 2,5 médicos por mil habitantes, no ano passado.
Sempre que um profissional deixa o emprego, é comum que cidades fiquem semanas ou meses sem médico. Com pouca procura, é preciso elevar salários. Em geral, quanto mais longínquo e precário o município, maior o valor pago ao médico.
No Amapá, o governo do estado cede seus profissionais aos municípios. Sem isso, pequenas cidades ficariam desassistidas. Só que, além do salário estadual, os médicos recebem pagamento das prefeituras, com dinheiro repassado pelo ministério ao Saúde da Família. O Portal da Transparência estadual revela que há médicos ganhando R$ 39 mil brutos por mês. Um deles recebe mais R$ 5 mil da prefeitura de Marzagão (AP) por só um dia de trabalho na semana.
Em Pracuúba (AP), com 3 mil habitantes, a secretária de Saúde, Marly Gomes Vilhena, conta que a cidade passou 8 meses sem médico ano passado. Nesse período, dois enfermeiros cuidavam da população. Hoje, há só uma médica, com salário bruto de R$ 28 mil do estado e R$.5.500 da prefeitura.
— Por causa de nossa carência, o médico está supervalorizado — resume o secretário de Saúde de Macapá, Otacílio Barbosa.
No Pará, a situação não é diferente. Em Santa Maria das Barreiras (PA), o único médico em atividade no mês passado era cubano.
— Os médicos vêm com interesse de ganhar dinheiro. Depois de juntar uma boa quantia, vão em busca de conforto. Não querem ficar a vida inteira aqui — reclamou o assessor da Secretaria de Saúde Charles Lopes Peres.

Fonte: O Globo:

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