quarta-feira, 30 de julho de 2014

Íntegra da sabatina de Dilma na TV Uol



A presidenta Dilma Rousseff (PT), candidata à reeleição em outubro, participou no dia 28 de uma sabatina parceria entre Folha, UOL,SBT e rádio Jovem Pan. Abaixo a íntegra da sabatina.
Ricardo Balthazar (Folha) – Boa tarde presidente. Muito obrigadopor aceitar o nosso convite e por nos receber aqui no Palácio da Alvorada. Eu gostaria de começar com uma pergunta sobre economia. Se a senhora for reeleita, pretende manter o ministro da Economia, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, ou vai buscar pessoas com perfis diferentes para conduzir a política econômica?
Dilma Rousseff – Sabe o que acontece? Estamos em plena campanha eleitoral. Não é bem a hora de discutir ministério. Na última vez que botaram os carros na frente dos bois, sentaram na cadeira do prefeito antes da eleição e perderam a eleição. Eu definitivamente não discuto meu ministério.
Ricardo Balthazar – Mas a senhora, pelo menos…
Dilma Rousseff – Até porque sou supersticiosa.
Ricardo Balthazar – Mas qual a avaliação que a senhora faz deles até aqui? O perfil para o próximo governo é diferente?
Dilma Rousseff – Eu não vou discutir o perfil de nenhum ministro, mas eu posso te dizer o que eu acho da economia no meu período de governo. Nós, a partir de 2010 e 2011, principalmente ao longo do meu mandato, tivemos uma piora da crise no que se refere aos emergentes. A crise começou em 2008, em 2009 ela é muito forte, está em seu momento mais fundo. Em 2010, você tem uma pequena recuperação de alguns países e, em alguns países, uma grande recuperação –é o nosso caso. Na sequência, a crise continua, atinge a Europa e, de fato, há uma mudança na situação econômica internacional inequívoca de 2011 a 2014. Nós estamos numa fase do ciclo econômico de recuperação.
Ricardo Balthazar – Mas vários países já se recuperaram, não é?
Dilma Rousseff – Nenhum país se recuperou. Inclusive, no início do ano eu estive em Davos e diziam que a recuperação agora era liderada pelos países desenvolvidos. O que está acontecendo com os países desenvolvidos? Uma modesta – modestíssima –recuperação. Uma situação muito difícil porque a economia americana cai – 2,9% anualizado, no primeiro trimestre. As taxas de crescimento estão desacelerando. O FMI inclusive pretende revisar todas as taxas de crescimento para baixo. Nós, ao contrário. Se você comparar no período 2011-2014, vai ver que o Brasil sempre esteve em uma taxa de crescimento acima da média internacional. A Europa, numa situação bastante difícil, crescendo pouco acima de zero, alguns países ainda com taxas negativas de crescimento. Não é uma situação como se esperava no início desse ano, de forte recuperação das economias desenvolvidas. O mesmo acontece com o Japão. Com os emergentes ocorreu o que? Tanto a Índia como a China tiveram reduções bastante grandes da sua taxa de crescimento. A própria China, que crescia a uma média de 10%, está hoje próxima do que eles consideram que seja a taxa que zera a economia. A mesma coisa com a Índia.
Nós crescemos ano passado 2,5%. Dos países do G20, nós devemos ser o sexto ou sétimo país que mais cresceu.
O Brasil, neste período, enfrentou a crise, sem cair naquela que foi a pior situação em todos os países: enfrentando altas taxas de desemprego. De 2008 a 2014, são 60 milhões de desempregados. Nós, de 2008 a 2014, criamos 11,5 milhões de postos de trabalho, no meu período de governo, 5,7 milhões.

Josias de Souza (UOL) – Vou me permitir reproduzir uma frase que a senhora disse no seu discurso de posse: “já faz parte da nossa cultura recente a convicção de que a inflação desorganiza a economia e degrada a renda do trabalhador. Não permitiremos, sob nenhuma hipótese, que esta praga volte a corroer o nosso tecido econômico e a castigar as nossas famílias mais pobres”. A senhora chega ao final de mandato com a inflação acumulada dos 12 meses acima um pouco do teto meta e a perspectiva de crescimento em torno de 1%. Na época do presidente Lula, ele recebeu a crise falando que era uma “marolinha”. A senhora atribui parte dos nossos problemas à crise internacional. Não há uma parte dessa responsabilidade por esse quadro de degradação econômica? O que deu errado em relação ao discurso de posse?
Dilma Rousseff – Eu não concordo que deu algo errado em relação ao combate à inflação. O sistema de metas da inflação é de 1999. Tem quantos anos? 15. Em 12 desses 15 anos a inflação esteve acima do centro da meta e, em cinco, esteve acima do limite superior da banda –se você considerar esse limite superior 6,5%, porque já foi maior que isso. Nós estamos naquele momento, se você considerar a inflação anualizada, eu te asseguro que ela ficará abaixo do limite superior da meta. Sempre se mediu no Brasil a inflação anualizada…
Josias de Souza – Hoje não está, não é, presidente?
Dilma Rousseff – Hoje ela está 0,02% acima do centro da meta e numa trajetória decrescente. Este mês, o IPCS-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15) deu 0,17. Nós sabemos que o comportamento da inflação no Brasil é assim: sobe no primeiro semestre e desce no segundo. Sempre foi assim. Tem 15 anos que se acompanha, por conta das metas da inflação, e é assim. Se você comparar os primeiros anos do presidente Lula, do presidente Fernando Henrique e os meus, vocês vão ver que os meus e os do presidente Lula se calibram. O meu um pouco menor, porque o presidente Lula pegou aquela taxa de inflação extremamente alta de 12,5% do Fernando Henrique Cardoso. Eu acho que usam dois pesos e duas medidas para julgar o meu governo. A inflação não está descontrolada, ela está no centro, ela está…
Ricardo Balthazar – No centro não está…
Dilma Rousseff -…absolutamente prevista para ficar no centro da banda, dada a banda.
Josias de Souza – Ela está no teto da banda.
Dilma Rousseff – Pois é, ela está no teto da banda. Nós vamos ficar nesse teto da banda. No Brasil, em apenas quatro anos ela esteve no centro da meta.
Josias de Souza – Sinceramente, a senhora acha que a economia vai bem?
Dilma Rousseff – Não, eu acho que nós estamos enfrentando da forma mais corajosa a mais grave crise econômica que o mundo passou desde…
Josias de Souza – O presidente Lula errou a avaliação que fez de que era uma marolinha?
Dilma Rousseff – Todos nós erramos porque não tínhamos ideia do grau de descontrole que o sistema financeiro internacional tinha atingido. Não fomos só nós que erramos. O mundo errou, porque saiu completamente do controle o sistema financeiro internacional. Tanto é que nós todos temos tido um trabalho danado para poder sair da crise.
O que eu acho que nós fizemos certo? Impedir que o tradicional efeito da crise, que era desempregar, arrochar salário e fazer com que a população pagasse o pato da crise, nós impedimos que isso acontecesse. Nós minimizamos os efeitos da crise sobre a economia brasileira. Além disso, nós vínhamos num processo de razoável crescimento.
Eu quero lembrar que apesar da “tempestade perfeita” que todo mundo anunciou que ia ocorrer em outubro…

Josias de Souza – A expressão é do deputado Delfim Netto, que é vosso consultor, não é?
Dilma Rousseff – Olha, meu querido, eu gosto muito do Delfim e continuarei consultando. Agora, divirjo integralmente, não acredito que foi só o Delfim, não. Toda a mídia encampou a tempestade perfeita e ela não ocorreu. Como ocorre a tempestade perfeita – que é uma crise cambial? O Brasil entraria em uma crise cambial e, com isso, a economia ia entrar em um processo caótico. Não aconteceu, porque um país que tem US$ 380 bilhões de reserva, que tem uma política monetária ativa, como a praticada pelo Banco Central, que vendeu swaps, que teve um processo bastante positivo em relação ao mercado, como esse país ia entrar em uma crise cambial dessa proporção?
Não tem fundamentos sólidos. Dos países do G20, me diz quem faz superávit primário?
Eu respondo: seis.
Um é o Brasil, o outro é a Arábia Saudita, o outro é a Itália, o outro é a Alemanha, Turquia e Coréia do Sul.
E o FMI diz o seguinte: são cinco que farão o superávit novamente em 2014.
Nós temos robustez fiscal, nós não temos descontrole fiscal, a dívida líquida do país caiu de 60% para 34%.
Isso não é desequilíbrio fiscal.

Kennedy Alencar (SBT) – O mercado financeiro tem uma torcida grande contra a senhora. Em mensagem aos clientes, o banco Santander disse que a vitória da senhora faria uma piora na economia. O mercado financeiro tem essa visão. Eles argumentam que, em três anos e meio de governo, os juros estão mais altos do que quando a senhora assumiu, o crescimento está menor que o do governo Lula e a inflação está um pouco maior. A mensagem do Santander reflete uma análise de que houve um fracasso da política econômica, porque ela combinou frouxidão fiscal com
uma tolerância alta com a inflação. Como a senhora avalia essa crítica?

Dilma Rousseff – Olha, eu não sei quem é que está fazendo a crítica. Não vou incorporar como do sujeito A, B e C, porque fica muito desagradável. Vou responder em geral.
Kennedy Alencar – Tem o Santander…
Dilma Rousseff – Depois eu falo do Santander.
Economia é expectativa. A característica de vários segmentos é especular em período eleitoral. Sempre que especularam, não se deram bem. Ou seja, a conjuntura política passa e eles sofrem mpenalidades. Eu acho muito perigoso especular em períodos eleitorais. O Brasil tem uma experiência disso, que aconteceu com o presidente Lula na eleição de 2002 e não foi bem sucedida. É inadmissível para qualquer país, principalmente um país que é a sétima economia do mundo, aceitar qualquer nível de interferência de qualquer integrante do sistema financeiro, de forma institucional, na atividade eleitoral e política. Isso é inadmissível.

Kennedy Alencar – O Santander fez isso?
Dilma Rousseff – Eu falo sempre de pessoas. A pessoa que escreveu a mensagem fez isso sim, e isso é lamentável e inadmissível para qualquer candidato, seja eu ou qualquer outro.
Ricardo Balthazar – A senhora conversou com alguém do banco a esse respeito?
Dilma Rousseff – Ainda não.
Kennedy Alencar – A senhora vai processar o banco?
Dilma Rousseff – Eu vou conversar primeiro. Eu converso primeiro, sabe, Kennedy, em todas as atividades. Agora eu vou ter uma atitude bastante clara em relação ao banco.
Kennedy Alencar – Processar é uma alternativa.
Dilma Rousseff – Querido, eu não sei. Eu não vou antecipar o que farei. Porque eu não especulo sobre ações. Eu sou presidenta da República e eu tenho que ter uma atitude mais prudente.
Josias de Souza – O presidente do PT, Rui Falcão, disse que o banco tinha pedido desculpas. Esse pedido não chegou à senhora, então?
Dilma Rousseff – Esse pedido de desculpas foi bastante protocolar.
Josias de Souza – O que é um pedido protocolar, presidente?
Dilma Rousseff – “Lamento o que aconteceu”. Acho bastante protocolar.
Josias de Souza – Mas para a senhora ou para o partido?
Dilma Rousseff – Eu conheço bastante bem o CEO do banco. Eu vou ver se é possível, se eu vou ter agenda, mas pretendo conversar a respeito.
Josias de Souza – Esse pedido de desculpas protocolar chegou ao partido ou à senhora?
Dilma Rousseff – Ele chegou a mim, mas foi encaminhado de várias formas.
Josias de Souza – E a senhora não considera adequada a forma.
Dilma Rousseff – Não. Achei muito protocolar.
Kennedy Alencar – A senhora acha que o mercado tem especulado contra a senhora?
Dilma Rousseff – Não, eu acho que há no Brasil um jogo de pessimismo inadmissível e vou dizer o porquê.
Vamos discutir a Copa. Eu lembro que, no dia em que começou a Copa vocês botaram assim no jornal: “A Copa está resolvida nos gramados, e não está resolvida de forma alguma fora dos gramados”. Houve gente que disse: “não tem aeroportos, a Copa vai ser um caos, nós não temos organização, o Brasil está aquém de tudo, devemos ter vergonha do país, vai fazer uma Copa absolutamente aquém do nosso potencial, não vai ter estádio decente, não vai ter aeroporto decente, a segurança vai ser um desastre, não tem estrutura de comunicação, vai haver um racionamento e, para não ter dúvida que vai ser o caos, também uma epidemia de dengue”. Isso é muito grave. É uma especulação contra o país.

Ricardo Balthazar – A comparação não é das melhores, presidente…
Dilma Rousseff – Vou dizer como ela se dá ao nível da… ao nível, não, está errado. Detesto falar isso (risos).
Ricardo Balthazar – Mas a comparação com a economia não é das melhores, presidente. Os números da economia são bastante ruins.
Dilma Rousseff – No ano passado foi 2,5% o crescimento da economia. E no ano passado disseram que ia haver mais do que um apagão: ia ter um racionamento. Ou seja, a economia não ia ter como oferecer energia elétrica para nenhum consumidor empresarial. Nenhum.
Josias de Souza – A senhora acha que há uma má vontade generalizada contra o seu governo?
Dilma Rousseff – Não, eu acho mesmo pessimismo que ocorreu com a Copa está havendo com a economia brasileira. E você sabe que com a economia é mais grave, porque economia é feita de expectativa. Se alguém bota na cabeça que a situação está descontrolada…… “vai ter racionamento”, é isso que disseram do ano passado até recentemente no Brasil. Quando houve o racionamento na época do governo Fernando Henrique Cardoso entre 2000 e 2001, quanto é que caiu o PIB, alguém sabe? Eu era do setor elétrico, eu sei. Tinha gente que dizia que caiu de 1,5% a 2%. Se você considerar efeitos indiretos, foi bastante significativa a queda. Estava em processo, inclusive, de crescimento e teve uma queda de 2%.
É isto que está previsto para o governo brasileiro. O governo brasileiro ia deixar a energia elétrica ser racionada. Receitaram o racionamento para mim todos os meses do ano. Todos, sem exceção. E a consequência é essa: queda de 2 pontos percentuais no PIB. Tempestade perfeita? Queda de 2% no PIB. Inflação descontrolada é queda no PIB. Nada disso ocorreu, pelo contrário. Sabe por que podemos passar pelo pior periodo de seca, pior do que o de 2000, 2001, e nós não vamos ter racionamento? Compara meus números com os números daquela época.
No meu governo, no meu período, nós vamos fechar com os seguintes dados: nós fizemos 20 mil megawatts de geração nova. Nos oito anos do Fernando Henrique ele fez 21.

Kennedy Alencar – Mas o setor elétrico se queixa que está em crise e o Tesouro já fez aportes de recursos, as distribuidoras estão endividadas…
Dilma Rousseff – O setor elétrico reage para uma situação muito clara: o sistema elétrico brasileiro é hidrotérmico, porque eu não posso fazer reservatório em rios da Amazônia. Se eu não posso fazer reservatório, eu tenho que fazer térmica, e você não faz térmica para enfeitar a paisagem, você faz térmica para usar na necessidade. O custo de usar térmica é muito pequeno frente ao imenso e fantástico custo de um racionamento. O que o setor elétrico sabe? Como a água é gratuita, uma hidrelétrica é muito barata, mais barata que uma térmica que usa ou gás – que você paga – ou carvão – que você paga – ou óleo diesel – que você paga.
Kennedy Alencar – A gente tem que rever o uso da Amazônia, presidente? Fazer reservatórios mais amplos?
Dilma Rousseff – Eu acho que em alguns lugares é possível, sim, fazer reservatórios. Em outros lugares da Amazônia não é, principalmente nas regiões de planície.
Manoel Lopes Ferreira (Leitor) – Nós estamos vendo que a indústria brasileira está indo para uma condição de descrédito
total e passa por sérias dificuldades. A presidente pretende manter a política ou tem planos para motivar a indústria brasileira, que passa por sérias dificuldades?

José Maria Trindade (Jovem Pan) – Quero complementar: uma das âncoras do governo do Partido dos Trabalhadores é o emprego e o desemprego está crescendo.
Dilma Rousseff – Gente, primeiro, não tem desemprego, não é? Nós temos a menor taxa histórica de desemprego de todos os tempos. Até abril 4,9%, mas vamos supor que fosse 5,2%. A mais baixa.
Ricardo Balthazar – A senhora tem razão. Eu acho que ele estava se referindo às demissões que estavam começando a aparecer em alguns setores da indústria e, mesmo no caso do mercado de trabalho de maneira geral, muita gente deixou de entrar no mercado de trabalho por não ver oportunidade…
Dilma Rousseff – Aqui no Brasil não há indicação disso. Você está falando daquele fenômeno que existe nos Estados Unidos que as pessoas não buscam emprego por desalento. Isso é desemprego por desalento. Não se verifica isso no Brasil. Um setor que nós fizemos o maior empenho foi para a indústria. Eu acredito de uma forma bastante forte que o crescimento industrial no Brasil é condição para o país se desenvolver. Nós não podemos ser um país nem só agrícola, nem só produtor de commodities. Nós temos que agregar valor. Eu acredito que nós mantivemos as conquistas sociais do período Lula e aprofundamos.
Tiramos 22 milhões de pessoas da pobreza extrema. No caso dos empregos, nós mantivemos a economia empregando.
O que está havendo no Brasil? O Brasil, para dar o próximo salto e se preparar para o momento de retomada, precisa apostar em um novo ciclo, que vai ampliar a distribuição de renda e as conquistas sociais, mas é um ciclo que aposta na produtividade. Por exemplo: é sabido que é muito mais fácil você resolver o problema das rendas e é mais difícil o dos serviços públicos. Nós sabemos que temos que investir profundamente em infraestrutura. Infraestrutura social, rodovia, ferrovia, aeroporto e porto. Fizemos um imenso esforço. Acho que seremos, sem sombra de dúvida, ao fechar esse ano, o momento que mais se investiu em infraestrutura considerando proporcionalmente quatro anos. Nós temos dado uma imensa força na formação profissional. O Pronatec vai formar esse ano oito milhões de pessoas. É inovação. Temos de apostar nesses três fatores, porque isso aumentará a produtividade sistêmica. Ao aumentar a produtividade sistêmica, contribui para a estabilidade econômica e distribuição de renda.

José Maria Trindade – Por que a indústria não entende isso? Eu posso falar para você o que nós fizemos para a indústria? Olha aqui no [plano] Brasil Maior. Do PSI [Programa de Sustentação do Investimento], nós colocamos R$ 200 bilhões.
Ricardo Balthazar – A maior parte das metas definidas no Brasil não foi cumprida.
Dilma Rousseff – Todas elas. Não sei se vocês lembram que teve candidato que dizia que nós tínhamos que parar de subsidiar a indústria.
Josias de Souza – A senhora está falando do Aécio Neves?
Dilma Rousseff – É, estou falando. Os juros do PSI eram de 3,5%, agora foram para 4,5%, abaixo da inflação. Nós fizemos um programa que é muito importante para a indústria: Margem de Preferência.
Ricardo Balthazar – Por que mesmo assim os investimentos da indústria não aumentaram mesmo assim? Incompreensão do empresário?
Dilma Rousseff – Não, nós estamos tentando impedir que ocorra no Brasil o que ocorre na indústria em todo o mundo. Vamos olhar um país muito industrializado. A Alemanha não é um país muito industrializado? É um país muito industrializado, com um padrão industrial de alta qualidade, com grande agregação de valor. Há sete meses o índice de confiança da indústria da Alemanha cai. Há sete meses.
Ricardo Balthazar – O pessimismo não é brasileiro, então?
Dilma Rousseff – Não, querido, você tem uma crise. A crise cria hoje um clima, mas nós tínhamos todas as condições para estar com um desempenho melhor. Tanto é que, no ano passado, quando todo mundo dizia que o Brasil estava indo para o pior caminho possível, nós crescemos 2,5%.
Kennedy Alencar – A senhora faz uma análise otimista da economia…
Dilma Rousseff – Não faço uma análise otimista, não, Kennedy, meu querido. Faço uma análise bem realista.
Kennedy Alencar – O slogan da campanha da senhora é “mais mudanças, mais futuro”. Em conversas reservadas, muitos
ministros disseram que, em avaliações internas, a senhora admite erros na política econômica e diz que fará correções e mudanças em um eventual segundo mandato. Objetivamente, a senhora admite ter cometido erros na economia? Quais seriam esses erros? Quais mudanças fará caso seja reeleita?

Dilma Rousseff – Kennedy, eu vou insistir contigo: você não faz mudança porque você errou. Você faz mudança porque você tem sempre de querer alterar e melhorar o que você fez. Vou dar um exemplo: eu acho o Bolsa Família um dos programas mais bem sucedidos do governo Lula. Tenho muito orgulho de ter participado do governo e ter levado esse programa à frente. Quando nós entramos, como já tínhamos uma experiência acumulada no Bolsa Família, resolvemos ampliar o Bolsa Família. Primeiro, focando em famílias com crianças até seis anos. E aí fomos. Foi assim que nós conseguimos tirar mais 22 milhões da pobreza extrema. Isso é uma mudança, mas não é uma autocrítica do passado.
Dou outro exemplo da área econômica: concessões de rodovias. Também nós aprendemos. Não era possível que se levasse 20 anos para construir uma rodovia, nem tampouco que se ficasse durante muito tempo cobrando pedágio sem fazer nenhum benefício. Então, o novo modelo de rodovia – que levou tempo para fazer as concessões – não é discutir a taxa interna de retorno de ninguém. Tinha de discutir o seguinte: a partir de agora, para cobrar o pedágio, você precisa ter 10% realizado.

Josias de Souza – Eu entendo sua preocupação em não admitir erro, mas a autocrítica às vezes é salutar. Nesse caso específico, não houve uma demora do governo? Porque se tivéssemos começado a fazer as concessões no início do seu governo, estaríamos em um processo mais adiantados do que estamos hoje, não é? Essa marcha só foi engatada no finalzinho.
Dilma Rousseff – Josias, aproveitando que estamos em ano de Copa: você lembra aquela conversa do Garrincha com Feola, que ele falou “temos de combinar com os russos”? Os russos, no caso das concessões, são os empresários. Você não pode sair dando a medida sem abrir um processo de discussão. Nós pedimos que fosse 10% de obra realizada para cobrar pedágio e, a segunda coisa, que toda ampliação da estrada fosse feita em cinco anos. Senão, você ficaria um tempão esperando o resultado da estrada para a economia brasileira.
José Maria Trindade – A oposição diz que é privatização, presidente.
Dilma Rousseff – Posso te explicar uma coisa que é um jogo político? O que é privatização? Você tem um baita patrimônio, você pega e vende. E aí o outro vai lá e administra o seu patrimônio. Por exemplo, a privatização da YPFB argentina. Eles venderam a YPFB por US$ 16 bilhões. Hoje ela vale mais de US$ 100 bilhões. Privatização é se você vende patrimônio feito. O que nós fizemos é concessão, ele tem prazo de devolver. É por isso que muitas vezes as pessoas se equivocam. Por exemplo, no setor elétrico sempre foi feito concessão. Vamos supor que o Josias tenha uma concessão. 35 anos é a concessão do Josias. Por que eu reduzi tarifa? No final… está no contrato, viu, Josias. O que queriam? Nos 35 anos eu pago o Josias, porque ele investiu. Ele tem direito a receber. Então, durante 35 anos, eu cobro tarifa do povo brasileiro e pago para o Josias. Aí acabou o contrato. É óbvio que o acionista quer continuar cobrando a tarifa e não devolvendo para o consumidor que já pagou e está no contrato que ele ia pagar nesse período. Concessão você devolve depois, ninguém pode achar que a concessão é da pessoa eternamente. Fim do prazo do contrato, ele me devolve a concessão. Quando eu vendo ou privatizo, eu não vou ter devolução.
Ricardo Balthazar – Presidente, gostaria agora de mudar um pouquinho de assunto e fazer uma pergunta de política para a senhora. As pesquisas têm mostrado que em nenhum lugar na desaprovação ao seu governo é tão alta como em São Paulo, que é o maior colégio eleitoral do país e um Estado chave nessa eleição. Metade dos eleitores, segundo as pesquisas mais recentes, dizem que jamais votariam na senhora em São Paulo. A que a senhora atribui uma rejeição tão alta?
Dilma Rousseff – Olha, nos estamos no início de um processo eleitoral. Nesse início do processo eleitoral, normalmente –principalmente numa situação como a que eu estou – não há um grau de conhecimento razoável sobre tudo que o governo federal realizou em São Paulo. Por exemplo: nós criamos 1,2 milhão de vagas do Pronatec em São Paulo. Se você somar Prouni e Fies, dá 800 mil vagas só no meu período de governo. Minha Casa, Minha Vida: nós fizemos 600 mil casas em São Paulo. Nós estamos, obviamente, sempre em parceria no caso que vou dizer, fazendo o monotrilho. Porque todo mundo desconhece que o governo federal faz o monotrilho. Faz o Rodoanel, a hidrovia Paraná-Tietê. Além disso, nós temos, em relação a São Paulo, eu pelo menos tenho uma relação que eu conheço São Paulo. Eu sei as características de São Paulo. É um povo trabalhador, dedicado, empreendedor, que puxa muitas vezes a economia brasileira. Então, eu tenho certeza que quando eu tiver oportunidade, agora com o início dos programas de televisão, eu pretend explicar bastante para São Paulo que tudo que nós fizemos…
Josias de Souza – Não é só São Paulo, né, presidente? Em São Paulo a taxa é um pouco maior, mas a rejeição é grande no país inteiro. Isso se deve à desinformação, é a sua impressão?
Dilma Rousseff – Não, eu acho que é essa fase. Você veja que, se comparar –vou pegar os outros presidentes recentes. Eles tinham taxas de rejeição bem parecidas nessa época da campanha eleitoral. Agora, eu acredito além disso que a gente tem mudanças e reversões muito rápidas no Brasil, porque tem um clima emocional certas coisas. Então, vou te dizer o seguinte: como é que a gente explica que 45 dias antes da Copa, mais de 70% dos brasileiros eram contrários à Copa? Achavam que ela seria um desastre. E, logo depois, um mês e meio depois, 80% achavam que não tinha sido uma boa Copa? Eu acredito na capacidade de você explicar, de você colocar as coisas às claras.
Josias de Souza – A senhora está colocando as fichas no horário eleitoral gratuito?
Dilma Rousseff – Não. No horário eleitoral gratuito e em tudo que durante uma campanha nós temos condições de expor e debater. Inclusive aqui. Aqui é uma oportunidade. Esse esforço que a imprensa brasileira faz para cobrir a eleição, dando oportunidade para os candidatos falarem, permite também que as pessoas façam a avaliação de quem é melhor.
José Maria Trindade – A senhora está falando diretamente para São Paulo aqui na Jovem Pan.
Dilma Rousseff – Pois é, por isso que eu fico muito feliz de estar aqui.
José Maria Trindade – Entre os pontos que provocam essa desconfiança está aquela história de Pasadena. A senhora
divulgou uma nota dizendo que assinou porque não conhecia os detalhes do contrato, aqueles dois tópicos. A senhora mantém isso e admite que houve um desgaste muito grande com relação a esta compra?

Dilma Rousseff – Olha, do ponto de vista da minha situação, eu queria lembrar que o conselho de administração é um colegiado. Estavam presentes no conselho de administração naquele momento alguns empresários e pessoas de grande experiência na área de negócios. O doutor Gerdau, Jorge Gerdau Johannpeter, o Fábio Barbosa, que hoje dirige o Grupo Abril, o Cláudio Haddad, que é reitor do Ibmec se não me engano, e várias outras pessoas. O que aconteceu conosco foi que não tivemos todos os dados. Tanto o TCU quanto o Ministério Público percebem as condições e eu fui afastada desse processo. Não tem como me condenar por Pasadena. Agora, acho que Pasadena tem de ter um certo cuidado no tratar dessa questão, porque ela foi objeto de um conflito judicial. O resultado de Pasadena decorre de um conflito judicial. Então, as condenações ocorrendo, as pessoas têm todo o direito de se defender, e o Tribunal de Contas é uma instância para elas. Eu não acho que estou sendo desgastada por Pasadena, pelo contrário. Eu acho que Pasadena mostra que eu sempre tive uma conduta muito decente no exercício dos meus cargos públicos.
Ricardo Balthazar – A senhora ainda estava no conselho de administração da Petrobras quando a empresa teve uma noção mais clara das cláusulas que eram prejudiciais a ela nessa negociação. Uma coisa que é difícil de entender até hoje é por que levou tantos anos para que o diretor responsável por esse parecer falho que orientou a aquisição da refinaria ser afastado. Ele poderia ter sido afastado no momento em que o conselho tomou conhecimento das falhas do parecer dele. Por que levou vários anos para ele ser afastado?
Dilma Rousseff - Sabe o que acontece? O conselho jamais aprovou a segunda fase. Não há. É só olhar as atas. O conselho aprovou a primeira fase da compra.
Ricardo Balthazar – Mas por que não afastou o diretor responsável naquela época?
Dilma Rousseff – No fim da primeira fase, eles levaram para o âmbito da disputa judicial. Ninguém condena ninguém antes do resultado judicial.
Kennedy Alencar – A senhora sabia que o Tribunal de Contas da União tiraria o conselho dessa responsabilidade?
Dilma Rousseff – Não tinha a menor ideia. Aliás, o relator do Tribunal de Contas em questão não é ligado ao meu partido, nem faz parte da minha base aliada no passado. Porque, como você sabe, os ministros do TCU são indicados ou pelo Senado, ou pela Câmara, ou muitas vezes também são membros técnicos do próprio TCU. Não há como dizer que o ministro relator tenha qualquer relação comigo.
Josias de Souza – Permita mudar um pouco de assunto, presidente, a senhora falou do horário eleitoral e me ocorreu de
perguntar. No início do seu governo, no primeiro ano, sete ministros deixaram a Esplanada por vinculação com uma palavra
que a senhora tem muito apreço por ela, que são os malfeitos. Vinculados com os malfeitos, eles foram afastados ou se
afastaram, enfim. Teve-se a impressão, naquele instante, que a senhora estabeleceria novos padrões éticos para a administração pública. Ao longo do tempo, esta impressão foi-se flexibilizando, porque os mesmos partidos se mantiveram nas mesmas pastas, alguns com problemas reiterados. E agora na fase das coligações, houve um episódio que marcou muito nesse aspecto, que foi oepisódio do Partido da República. Às vésperas da decisão deles de coligar-se a A ou a B, coligar-se à senhora ou ao candidato Aécio Neves, eles fizeram alguma coisa muito parecida com uma chantagem: ou a presidente afasta o ministro dos Transportes ou nós não nos coligaremos com o PT. E a senhora cedeu, a senhora afastou o ministro César Borges que, pelo o que consta, a senhora tinha boa avaliação. Por que a senhora cedeu a esta aparente
chantagem?

Dilma Rousseff – Ao que consta, eu tinha uma ótima avaliação do Paulo Sérgio, que é o atual ministro dos Transportes e que tinha sido tirado do Ministério dos Transportes – aí era bom que vocês olhassem o que escreveram quando ele saiu–, e entrou o César Borges. Eu tenho os dois em alta conta. Eu só aceito ministros que eu tenho em alta conta. Eu posso equivocar. Agora, neste caso específico ao qual você se refere, só vou lembrar como é que aconteceu: o PR falou que se sentia melhor sendo representado pelo César Borges. E eu considerava o César Borges um nome muito bom. Um homem que tinha experiência como governador [da Bahia], que não tem nada que o desabone, que tem grande capacidade técnica, engenheiro civil, bastante adequado para a área de infraestrutura. Ele estava no Banco do Brasil, e eu trouxe-o para
substituir o Paulo Sérgio. Como o Paulo Sérgio é da minha alta confiança, eu coloquei o Paulo Sérgio na EPL (Empresa de Planejamento e Logística) – antes eu ia colocar na agência, mas aí preferi botar na EPL porque a EPL cuidava da questão também das concessões. Então, foi assim. Mais tarde, voltaram a preferir o Paulo Sérgio, e não o César Borges. Mas como eu continuava preferindo o César Borges na área de infraestrutura, eu o coloquei numa área em que ele pode dar uma grande contribuição que é [a Secretaria de] Portos. O Paulo Sérgio conhece o Ministério dos Transportes como poucas pessoas.

Josias de Souza – Mas a senhora fez a mudança para atender ao PR.
Dilma Rousseff – Sim, mas o que eu não fiz foi interromper a governabilidade da área de transporte, colocar uma pessoa que não é inteiramente abonada, decente.
Josias de Souza – A senhora sabe que em matéria de política estética conta muito. Neste caso específico, o PR é hoje um partido ainda controlado pelo Valdemar Costa Neto que é um mensaleiro preso. E esta recomendação, de troca do ministro, foi discutida na cadeia. E a presidente da República ceder a isto não tem um déficit estético aí?
Dilma Rousseff – Você está dizendo que foi discutida na cadeia. Comigo, foi discutida claramente no Palácio do Planalto. E eu aceitei porque não tenho nenhum fato que desabone o Paulo Sérgio, pelo contrário. Ele foi um grande, mas um grande ajudante.
Josias de Souza – A senhora não se sente chantageada, então?
Dilma Rousseff – Nem um pouco. Eu sentiria chantageada se eu botasse no Ministério dos Transportes uma pessoa na qual eu não confio e não conheço. Pelo contrário, eu confio e conheço o Paulo Sérgio. É interessante, porque na época, quando eu aceitei colocar o César Borges, disseram a mesma coisa. Só que agora, com o passar do tempo, estão dizendo do Paulo Sérgio. Nem um, nem outro. Eu tenho muito orgulho de ter os dois no meu governo. Inclusive, o César Borges, eu coloquei em Portos porque Portos vai entrar agora na fase da concessão de arrendamentos. Porque uma coisa é a autorização para os terminais de uso privativo, que são portos privados, outras coisas é arrendamento, que é concessão. Então coloquei o César Borges lá porque tenho certeza que ele vai fazer com rapidez. E o Paulo Sérgio já estava acompanhando todo o processo dos Transportes, sempre acompanhou.
Kennedy Alencar – Presidente, eu gostaria de ouvir da senhora qual que é a sua avaliação a respeito do impacto da corrupção nas taxas de avaliação do governo. O ministro Gilberto Carvalho disse que o PT deixou a sua imagem ser confundida com a corrupção. Inclusive ele disse que esses baixos índices de avaliação não são apenas da elite, mas também atingiram as classes de menor renda e de menor escolaridade. O PT fez uma campanha forte contra o
ministro Joaquim Barbosa na época do julgamento do Mensalão. A Operação Lava-Jato da Polícia Federal desvendou uma série de suspeitas de corrupção na Petrobras, que resultou em CPIs que estão aí no Congresso Nacional. Em São Paulo, houve o caso do deputado estadual Luiz Moura, que era do PT e foi acusado de se reunir com traficantes do PCC. A senhora acha que o seu governo paga um preço, nas pesquisas, que se deve à confusão que o PT fez com a corrupção?

Dilma Rousseff – Olha, Kennedy, vou te falar uma coisa. Eu tenho uma vida política e pessoal. Eu não tolero, não compactuo, não aceito corrupção de nenhuma espécie. Agora, tenho algo a dizer sobre os governos do PT. Acredito que nesses governos do PT – e aí eu estou falando do presidente Lula e o meu– foram
tomadas todas as medidas, porque os homens e as mulheres não são virtuosos. Quem tem que ser virtuosas são as instituições para impeder qualquer tentativa ou qualquer tentação. Então, melhorar instituições para combater a corrupção é essencial. Exemplo. Primeiro, nós transformamos a Controladoria-Geral da União em ministério. Demos autoridade para a CGU, demos todos os instrumentos para ela atuar. Depois, transformamos a prática da Polícia Federal, a prática investigativa, numa prática respeitada. E tratamos esta investigação como uma política de Estado. Terceiro, criamos o Portal da Transparência. Aprovamos a Lei de Acesso à Informação, aquela que se você ler lá o livro do [ex-primeiro ministro da Inglaterra] Tony Blair vai ver que ele se arrependia de ter criado no governo inglês. Ele falava que criava mais problema do que resolvia. Eu acho que resolve muito mais problema do que cria.

Josias de Souza – Tudo o que a senhora está dizendo é fato, agora…
Dilma Rousseff – Não, “pera” lá. Nomeamos Ministério Público de forma independente. E fomos o único governo que na sua gestão teve pessoas condenadas. Então, dizer pra mim que nós enterramos por debaixo do tapete ou engavetamos processo, não concordo. Acho que nós tivemos situações muito difíceis nesse processo, mas enfrentamos com muita força.
Josias de Souza – Esse efeito a que o Kennedy está se referindo porque a senhora está dizendo e é fato: a Polícia Federal se aparelhou, a CGU se aparelhou, tudo isso muito bem. Mas a senhora pega um episódio como o Mensalão, por exemplo, em que a Polícia Federal investigou, os procuradores indicados pelo presidente Lula e depois indicados pela senhora denunciaram, o Supremo condenou – ministros indicados pelo presidente Lula majoritariamente, e pela senhora – e depois do resultado consumado, o partido desmereceu o resultado, questionou o resultado, o ex-presidente, vosso antecessor, disse que 80% do resultado era político. Então ele está pondo em dúvida a investigação que foi feita pela Polícia Federal dele, a denúncia que foi feita pelos procuradores que a senhora e ele indicaram… E a CGU também, o trabalho da CGU, para dar um exemplo, no Ministério do Trabalho foram feitos vários questionamentos em relação à gestão do ministro Lupi. Neste final de semana a senhora encontrou o ministro Lupi e o chamou de homem de bem, homem de bom coração. Essas coisas não confundem o eleitorado?
Dilma Rousseff – Deixa eu falar uma coisa. Veja bem. A Controladoria-Geral da União não investiga um ministério, não,
investiga todos. Sugere e aponta inconformidades em vários ministérios. Não necessariamente todas as inconformidades são fruto de má gestão no sentido criminoso da palavra. Não necessariamente. Agora, algumas são, outras não. Eu quero te dizer que não há, em relação ao ministro Lupi, um quadro em que haja uma inconformidade fruto…

Kennedy Alencar – Foram encontradas irregularidades em convênios com pessoas do partido.
Dilma Rousseff – Querido, isso é uma inconformidade. Ou seja, ele pediu o afastamento porque ele pediu para se defender. E segundo porque enquanto ele estivesse no governo vocês sabem como é que funciona. A carga em relação a ele é muito grande. Me desculpa, mas não é minha prerrogativa responder por ele. Sugiro que vocês perguntem. Mas eu não vou concordar em chamar o ex-ministro Lupi de um cara que fez malfeitos. O ministério pode ter cometido falhas administrativas que vários ministérios –nem um, nem dois, nem três. E que são corrigidas. A Controladoria, inclusive, é para prevenir.
Kennedy Alencar – Havia um acúmulo de cargos públicos que a Comissão de Ética considerou irregular.
Dilma Rousseff – Sim, mas isso foi extra governo. Não é interno ao governo.
Josias de Souza – Presidente, eu próprio conversando com o ministro [da CGU Jorge] Hage, e mais recentemente quando houve mais problemas com o novo ministro do Trabalho, ele me disse – isso gravado, entrevista, foi veiculado – que há um problema reiterado no Ministério do Trabalho, porque a CGU aponta o problema, e o ministério renova os convênios com as ONGs que tiveram irregularidades apontadas nos convênios. Isso no tempo do Lupi, no tempo do novo ministro
Dilma Rousseff – Não, querido, você me desculpe, mas não foi assim, não. Nós fizemos uma regulamentação sobre convênios com ONGs. Como estava havendo problemas nessa área, nós fizemos toda uma nova tipificação administrativa. Porque as pessoas diziam: “Ah, mas não era assim antes. Ah, mas eu não sabia que ia ser assim”. Então, o que nós fizemos? Para não ter dúvida, e não abrir espaço para isso, nós refizemos esse processo todinho. Tinha problemas que a CGU considerava não-conformidade. Porque o que é não conformidade? É uma prática que está ocorrendo, mas não foi ainda regulada. Então, se enquadra ela: vai funcionar assim daqui pra frente e quem não funcionar assim está cometendo irregularidade grave. É isso. Não conformidade é um momento. Eu só quero te falar mais uma coisa que você perguntou.
Josias de Souza – Isso é só se aquela avaliação que o PT e o presidente Lula fizeram do Mensalão não passam uma confusão.
Dilma Rousseff – Posso te falar uma coisa? Eu acho que nessa história, da relação com o PT, tem dois pesos e umas 19 medidas. Por quê? Porque o Mensalão foi investigado. Agora, o Mensalão Mineiro, não.
Josias de Souza – Foi investigado também, só não foi julgado, né? Passaram o julgamento para a primeira instância, é a isso que a senhora se refere, né?
Dilma Rousseff – E o que é que vai acontecer, hein, Josias?
Josias de Souza – Não, eu também não estou questionando, mas investigado foi.
Dilma Rousseff – O que vai acontecer Josias? O que eu quero dizer é o seguinte. O nosso caso, quando foi o nosso caso, nós tomamos todas as providências. Nós não tivemos nenhum processo de interromper a Justiça. Nós não pressionamos juiz, não falamos com procurador, não engavetamos processo.
Kennedy Alencar – O governo Fernando Henrique fez isso, na sua opinião, presidente?
Dilma Rousseff – Meu querido, você está dizendo.
Kennedy Alencar – Eu estou perguntando para a senhora, se a senhora acha que fez.
Dilma Rousseff – Pois é. Eu não vou julgar governo nenhum porque não é meu papel. Inclusive quero dizer o seguinte: todas as minhas avaliações a respeito – já me perguntaram muito, até me antecipo – sobre penalidades, punições, eu, como presidente da República, não me manifesto a respeito de decisão do Supremo Tribunal Federal. Nós temos três instâncias no país: judiciário, legislativo e executivo.
Ricardo Balthazar – A senhora testemunhou no processo a favor do ex-ministro José Dirceu. A senhora chegou a dizer, inclusive, que achava que ele era injustiçado, na época, como testemunha.
Dilma Rousseff – Meu querido, fiz isso quando era ministra. Como presidenta, eu não me manifesto sobre processo julgado pelo Supremo.
José Maria Trindade – Presidente, nós estamos trazendo aqui para a senhora algumas inquietações que é o debate da rua. A senhora tem ideia do grau de radicalização da campanha, como será? Como está o grau de debate aí fora? E talvez, na minha opinião, seja exatamente fomentado por esse tipo de sentimento, isso que nós estamos falando aqui. Uma luta de classes parecida de pobres contra ricos.
Dilma Rousseff – Acho que não é, não, sabe por quê? Não acho que é uma luta de classes de pobre contra rico, não. No Brasil de 2002, de cada quatro brasileiros, no mínimo dois eram pobres ou miseráveis. No Brasil de 2014, de cada quarto brasileiros, três estão na classe C, B ou A. Ou seja, se você for olhar, 175 milhões, ou 54%, estavam na classe D e E. Hoje você vai olhar e ver que 75% dos brasileiros, de 200 milhões, estão na classe C, A e B. Então, não acho que há uma guerra de pobres contra ricos. Mas eu posso dizer para você o seguinte: quem ganhou mais nesse período? Todo mundo ganhou, se você for olhar em termos de aumento da renda real. Mas é fato que os mais pobres ganharam mais. Agora, isso é muito importante. Um país que faz isso melhora muito, porque eleva gente que antes estava excluída do mercado para ter direitos que eles não tinham. Para ter acesso a bens de consumo que não tinham antes. Para ter acesso a serviço. Então, eu acho que tem gente que não gosta muito que ao lado no avião sente uma empregada doméstica ou uma secretária. Mas isso ocorreu no Brasil. Na chamada escada da ascensão social, muita gente entrou na escada. É muito mais fácil melhorar a renda com rapidez por um trabalho, por uma Bolsa Família, por mais oportunidades, do que melhorar toda uma estrutura de serviços que tinha vindo do passado sendo deteriorada. Educação, saúde, tudo isso, a partir deste momento, passa a ser objeto de disputa. O que nós estamos fazendo? Trabalhando para ampliar isso. Para que todos tenham acesso a uma saúde, a uma educação de qualidade.
Kennedy Alencar – Vamos falar um pouquinho de política externa,  presidente. O Brasil criticou duramente os ataques de Israel na faixa de Gaza. Israel reagiu, dizendo que o Brasil é um “anão diplomático” e que aplica nas relações internacionais um relativismo moral. Que não teria, por exemplo, em relação ao Bashar al-Assad, da Síria, nem ao Vladimir Putin, da Rússia, o mesmo rigor para condenar eventuais interferências. Como o Putin fez na Ucrânia e o massacre que o Bashar al-Assad faz na Síria. O Aécio Neves, candidato do PSDB, diz que a sua política externa age dessa forma por alinhamento ideológico. Então, gostaria de perguntar para a senhora como a senhora responde a essa crítica e se a senhora concorda com a avaliação do chefe da sua Assessoria Especial, o Marco Aurélio Garcia, que disse em entrevista ao SBT que é há um “genocídio em curso” na faixa de Gaza.
Dilma Rousseff – Eu queria te dizer primeiro que, em relação a Israel, o Brasil tem uma posição bastante antiga de amizade. Fomos o primeiro país no mundo a reconhecer o Estado de Israel. Além disso, nós defendemos ali na região os dois Estados, o israelense e o palestino, como condição de direito dos palestinos e de segurança de Israel. Terceira questão: eu compareço todos os anos – acho que compareci em todos exceto em um – nas cerimônias a respeito do Holocausto. Então eu quero te dizer o seguinte: em relação a Israel e aos israelenses eu tenho grande consideração. Até porque eu acho que uma parte de nós brasileiros somos cristãos novos. Uma parte do que nós somos, na nossa herança portuguesa, é de cristãos novos. Acho que o que está ocorrendo na faixa de Gaza é uma coisa muito perigosa.
Kennedy Alencar – É genocídio?
Dilma Rousseff – Não, não acho que é genocídio. Agora, acho que é um massacre. Porque genocídio implica em você… Acho que não está sendo feito um genocídio. Acho que está havendo uma ação desproporcional. De fato, tem de acabar com aquela história de matar os três jovens israelenses. Mas não é possível matar crianças e mulheres de jeito nenhum. O embaixador foi chamado para prestart esclarecimento, porque nós tínhamos dúvidas a respeito de algumas coisas, e oportunamente vai voltar. Não tem aí nenhum momento de ruptura, nem nada. Lamento as palavras. Lamento as palavras. As palavras às vezes, inclusive do porta-voz, produzem um clima muito ruim. Acredito que nesse caso a gente tem que ser bastante prudente.
Josias de Souza - Vai haver consequências, a seu juízo?
Dilma Rousseff – Não. Acho que a ONU está completamente certa.
José Maria Trindade - Ele falou em nome do governo?
Dilma Rousseff – Quem?
José Maria Trindade - O porta-voz.
Dilma Rousseff – Não tenho a menor ideia. Eu não posso especular sobre se falou em nome do governo ou não. Não me cabe isso. Agora, eu acho que a decisão da ONU de exigir um cessar-fogo imediato é altamente bem-vinda. Porque é uma questão humanitária. Você não pode – é uma faixa muito pequena. E as pessoas estão em uma situação de muita insegurança, muito ameaçada, com muita criança morrendo e muita mulher. E a gente sabe que numa guerra desse tipo, que não é nem um estado de guerra, quem paga são os civis.
Ricardo Balthazar - Presidente, nós temos um pouquinho de tempo ainda para mais duas perguntas, uma do Kennedy e uma do Josias.
Kennedy Alencar – O candidato do PSDB, Aécio Neves, disse numa sabatina que ele não pretende aceitar as regras do governo cubano a respeito da remuneração dos profissionais que atuam no Mais Médicos, aquele convênio via Opas. Ao concordar com uma remuneração menor para esses médicos cubanos o Brasil não comete uma injustiça? Não aceita uma violação trabalhista no seu território? E não ajuda uma ditadura, como diz a oposição? São argumentos da oposição e eu queria que a senhora os comentasse, por gentileza.
Dilma Rousseff – Olha, primeiro eu quero te falar uma coisa. Acho que em pleno século 21, depois de tudo que passou, essa posição fundamentalista sobre Cuba é um despropósito. Eu acredito, inclusive em toda a América Latina, numa reunião da Celac, todos os países aprovaram o fim das restrições a Cuba –do bloqueio, de tudo. É uma pequena ilha. O que acontece no caso do Mais Médicos? O caso do Mais Médicos é o caso da atenção básica. Nós tínhamos dados de que havia 1,8 médico por 1.000 habitantes no Brasil, em média. Tinha lugar que era um pouco mais e tinha lugar que era muito menos. Então resolvemos fazer o Mais Médicos. O Mais Médicos, entre outras coisas, trata de levar de forma rápida médicos para essas populações. Onde elas estão? Se você for olhar no mapa, vê que tem, primeiro: o litoral tem mais médico que o interior. O Nordeste e o Norte têm menos médico que o resto do Brasil. As periferias das cidades, principalmente São Paulo – as grandes cidades, onde concentra muita gente–, quase não têm médico. Mas tem médico nos grandes centros.
Ricardo Balthazar - A pergunta é sobre Cuba.
Dilma Rousseff – É, mas eu tenho que explicar isso porque senão você não entende a importância do Mais Médicos e dos médicos cubanos.
Kennedy Alencar - A diferença na padronização, né, do salário.
Dilma Rousseff – Não é salário, pelo amor de Deus. Isso não é salário, é bolsa. Bom, então nós fizemos o Mais Médicos. Precisava de 14.400 e poucos médicos para cobrir 50 milhões de pessoas, porque segundo a OMS [Organização Mundial da Saúde], com um médico você cobre 3.500 pessoas, na média por ano. Fizemos primeiro o Revalida. O que é o Revalida? É o diploma de uma pessoa que não se formou no Brasil, revalidando aqui no Brasil. Entraram 1.800. Quantos formaram? Cento e nove. Quantos foram aprovados? Cento e nove, de 1.800. Bom, eu preciso de 14.400 médicos. Então, abrimos para os brasileiros que tivessem diploma e que quisessem. Veio mil e poucos. Abrimos para qualquer um que tivesse diploma fora do país, inclusive brasileiro, que quisesse participar. Aí vieram mais um tanto. Onze mil eram cubanos, porque nós fomos na Opas e negociamos isso. Como é que é a negociação? Nós pagamos aqui uma parte do salário, R$ 3.000, e eles ganham auxílio-alimentação, auxílio-moradia e auxílio-transporte. Ou seja, paga a moradia, alimentação e quando ele vai para um lugar mais distante, o transporte. O que acontece em Cuba? Em Cuba, eles depositam o salário que ele recebe. Então ele ganha aqui, e ganha lá. O que não vai dar certo? Esse programa é por um período no qual nós temos de formar médicos aqui. Nós temos de aumentar a oferta de médicos. Então, dentro do Mais Médicos, tem mais uma etapa, que é formar 11.500 médicos na graduação e dar especialidades para 12 mil, tá? Eu acho que nós vamos ter de aumentar o número. Porque está visível que se você não tiver uma quantidade a mais de médico, quando o médico aprova o diploma, não irá em hipótese alguma para um departamento de saúde indígena, não vai atender lá no interior do Nordeste, não vai atender na periferia de São Paulo. Aliás, tem uma coisa que eu vou te falar, sabe o que acontece, Kennedy? Sabe qual é o Estado que tem o maior pedido de médicos no Brasil? São Paulo. E não é por nada, é porque lá tem uma parte importantíssima da população. E o Mais Médicos é por isso: ninguém senta com a pessoa. Todas as descrições das pessoas são sobre a humanidade do atendimento. A pessoa pega no pulso, examina, olha com carinho. Então eu acho que vai ter outra coisa que os medicos cubanos trouxeram para o Brasil, uma prática de medicina de alto grau de humanidade.
Josias de Souza - Gente, eu vou fazer uma pergunta que comporta uma resposta rápida da senhora. Na sua declaração patrimonial, encaminhada à Justiça Eleitoral, a senhora informou que mantém em seu poder R$ 152 mil em espécie. O sistema bancário brasileira está relativamente sólido, não se espera que o seu governo faça nenhum confisco da poupança. O que leva a presidente da República a manter R$ 152 mil em dinheiro vivo em casa?
Dilma Rousseff – Olha, uma parte disso a gente deposita ao longo do ano.
 Ricardo Balthazar - Deposita?
Dilma Rousseff – Eu deposito, eu boto na poupança.
Josias de Souza - Mas está em espécie?
 Dilma Rousseff – Está em espécie depois eu boto na poupança.
Josias de Souza - A senhora guarda aqui, no Alvorada?
Dilma Rousseff – Não vou te contar, nem ver [risos]. Agora, vou te falar uma coisa. Sabe o que é isso, também? Sete anos da minha vida eu vivi fugida. As coisas que você incorpora. Por muito tempo, Josias, eu dormia de sapato. Ninguém vai acreditar, né, mas eu já dormi muito tempo de sapato. Porque é muito forte a experiência que você passa em determinados momentos. Eu tenho essa prática.
Ricardo Balthazar - Mas o que isso tem a ver com guardar o dinheiro?
 Dilma Rousseff – Ah, porque eu dou dinheiro pra minha filha, porque depois eu dou dinheiro pra ela viajar.
Josias de Souza - Mas hoje tem o TED, tem a transferência Bancária.
Dilma Rousseff – É, mas eu gosto assim. Eu sou um pouco…
Kennedy Alencar - Uma coisa para se prevenir, presidente, essa coisa de dormir com o sapato, na época da ditadura militar?
Dilma Rousseff – Você sabe, eu fiquei presa três anos, na ditadura militar. Eu fiquei presa, no presídio Tiradentes, durante três anos. Então, naquela época eu vivia fugindo.
Josias de Souza - Presidente, mas a senhora não vai fugir agora, né, presidente?
Dilma Rousseff – Não, querido, não vou, não.
Ricardo Balthazar - Estamos de volta à democracia há quantas décadas, presidente?
Dilma Rousseff – Já me perguntaram isso, aí eu fiquei pensando: por que será que eu gosto de fazer isso? Eu acho que tem uma parte que é por isso. E porque eu sou uma pessoa, nessa área… Eu sou de outra geração, né? Pra mim, o sucesso não era isso. Nós vivemos uma época… Quantos anos você tem, Josias?
Josias de Souza - Eu tenho 52.
Dilma Rousseff – Ah, não, você é novo, então. Eu tenho 66. Na minha época, o valor fundamental era que a gente ia transformar o Brasil. Então, já vivi muito sem dinheiro, já vivi com dinheiro. Tenho essa mania com os meus R$ 150 mil que vocês não vão mudar.
Josias de Souza - Pode pôr na poupança que a senhora vai ganhar uns R$ 10 mil por ano.
Dilma Rousseff – O que que é R$ 10 mil?
 Ricardo Balthazar - Obrigado, presidente. Infelizmente o nosso tempo acabou.
Dilma Rousseff – Eu acho que R$ 10 mil é muito. É muito. Eu não jogo fora, nem ver. Porque também eu sou mineira.
Ricardo Balthazar - Muito obrigado, presidente. Queria agradecer novamente a sua participação. Está encerrada a sabatina.
 fonte:Folha/UOL

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