domingo, 7 de dezembro de 2008

DOIS PESOS, DUAS MEDIDAS

Carlos Toffoli

Tramita na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo o Projeto de Lei 643/2008 que trata da proposta orçamentária de 2009 para o estado paulista. No documento, o governo de José Serra fixa o valor de R$ 1,8 bilhão para atendimento a sentenças judiciais (pagamento de precatórios). Este valor é suficiente apenas para pagar precatórios não alimentares – decorrentes de desapropriações. Sem alterações na proposta formulada pelo governo paulista ficariam de fora, mais uma vez, os credores alimentares (servidores públicos da ativa ou aposentados).

A prioridade no pagamento dos créditos não-alimentares é uma medida que o Governo do Estado de São Paulo vem adotando há anos. A disparidade ganhou contornos mais graves nos últimos 17 meses, período em que o governo paulista não efetuou um único depósito em favor dos credores alimentares – o último ocorreu em junho de 2007.

Um balanço das ações do governo nos anos de 2007 e 2008 e uma análise da previsão orçamentária para 2009 apontariam a clara posição do Executivo paulista, que destina quantias exorbitantes para o pagamento dos créditos não-alimentares, contemplando assim um pequeno grupo de credores com indenizações milionárias, enquanto milhares de credores alimentares - em sua grande maioria idosos – aguardam na famigerada fila dos precatórios.

Em 2007, o Estado de São Paulo deveria ter providenciado a inclusão de um bilhão de reais em favor dos credores alimentares. Mas só destinou, na verdade, cem milhões de reais – ou seja, um décimo do que fora determinado pela Justiça. Já para os credores não-alimentares, o governo paulista disponibilizou no ano passado praticamente um bilhão e trezentos milhões de reais. Resumo: do valor total pago em precatórios em 2007, aproximadamente 93,5% foram para os não-alimentares e apenas 6,5% para os alimentares.

São dois pesos, duas medidas. Aos olhos do governo de São Paulo, um credor não alimentar vale 9 vezes mais do que um credor alimentar. Por que essa disparidade? Como explicar este tratamento desigual? Por que os credores não-alimentares merecem mais atenção e mais recursos? Qual é a explicação? Cabe ao Chefe do Poder Executivo vir a público para esclarecer a sociedade, de forma clara e insofismável, sobre as causas dessa inaceitável disparidade.

A situação é ainda mais crítica em 2008. Diante de uma requisição judicial que bate na casa de 1 bilhão de reais, não foi ainda depositado um único vintém – um único vintém! – em favor dos credores titulares de precatórios alimentares.

E para o orçamento do próximo ano, o Executivo deveria reservar R$ 981 milhões exclusivamente para o pagamento de precatórios alimentares. Mas o valor de R$ 1,8 bilhão fixado na peça orçamentária de 2009 para pagamento de sentenças judiciais contempla apenas o pagamento dos créditos não-alimentares.

Contra esse verdadeiro CALOTE aplicado pelo Estado, o MADECA (Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público) lançou mão de duas medidas. Na primeira delas, os advogados dos credores entraram com uma representação junto ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo sugerindo a rejeição das contas estaduais, caso o quadro atual se mantenha inalterado. O Movimento dos Advogados aguarda ainda uma manifestação do órgão.

Mais recentemente, o MADECA encaminhou aos parlamentares paulistas um ofício com informações sobre a atual situação dos precatórios. No documento, os advogados sugerem aos deputados a apresentação de uma emenda ao Projeto de Lei 643/2008 - que trata da proposta orçamentária de 2009. A idéia é que a alteração no orçamento contemple também os credores alimentares.

O deputado estadual Fernando Capez (PSDB) recebeu o ofício e apresentou emenda à Proposta Orçamentária do Estado de 2009 que, se aprovada, beneficiará esses credores. A emenda de número 660, publicada no dia 30/10 no Diário Oficial, pede o remanejamento dos recursos para garantir o pagamento de precatórios alimentares. O texto ainda será analisado pela Comissão de Finanças e Orçamento antes de ser submetido à análise do Plenário da Assembléia.

As medidas – ainda sem respostas definitivas - servem para ampliar o debate sobre o tema e chamar a atenção do Governo de São Paulo e de toda a sociedade para o problema de milhares de pequenos credores que aguardam há anos na fila dos precatórios o pagamento de seus créditos alimentares. Sessenta mil credores já morreram sem receber o que a Justiça lhes havia assegurado em sentenças judiciais definitivas. Quantos mais precisarão dar as suas vidas? Qual é o número de mortos que vai sensibilizar o governo do Estado a resolver definitivamente o problema?

*Carlos Toffoli é advogado de credores alimentares na Advocacia Sandoval Filho. É também vice-pesidente do MADECA (Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público).


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