Aloha, 2009
Cynara Menezes
Cynara Menezes
Quando me dizem que não existe mais esquerda e direita, contesto com uma frase de Quino, o criador da Mafalda, quando perguntei numa entrevista qual era sua posição ideológica: “De que lado bate o coração?”. Pois meu lado esquerdo do peito deu pulos com a eleição do mulato chamado Barack Hussein Obama para a presidência dos Estados Unidos.
Para mim, a “América” sempre foi o país de Ernest Hemingway, Raymond Chandler e Jack Kerouac. De Easy Rider e dos hippies. De Bob Dylan e Johnny Cash. Do blues. Dos canyons e grandes desertos. De Rip Van Winkle. Dos cookies e tortas de maçã esfriando na janela. Das imensidões geladas que o jovem Tio Patinhas cruzou para garimpar suas primeiras pepitas de ouro. Em suma, um país maravilhoso que, em determinado ponto da história, tomou o caminho equivocado.
Não faz muito tempo, foi nos anos 60, com os assassinatos de Martin Luther King, John e Bob Kennedy. A partir dali a América que eu admiro deixou de existir. Degringolou. Foi piorando, piorando, até chegar ao fundo do poço e virar a terra de George W. Bush. A eleição de Obama me parece uma tentativa de resgatar a “boa” América perdida. Como se os americanos tivessem gritado ao mundo: “Ei, não somos tão imbecis quanto vocês pensam”.
Fiquei impressionada, devo admitir. Eu achava que suas mentes haviam ficado embotadas por tanta comida gordurosa. Adiposidade cerebral, só isso explica terem votado em Bush não uma, mas duas vezes. É quase inacreditável que essa mesma gente tenha elegido um cara cujo único defeito apontado pelos adversários seja ser elitista, intelectualizado, culto demais.
Barack e Michelle Obama, com suas lindas filhas, não só possuem “Kennedy material”, como dizem os gringos, como são negros cosmopolitas que chegam à Casa Branca depois de quatro mandatos de americanos redneck: Bush e o próprio Bill Clinton. Caipiras no pior sentido da palavra.
Surpreendentemente, os americanos resolveram experimentar um conterrâneo fora do comum, para dizer o mínimo: filho de queniano com americana branca, graduado com louvor em Harvard, e, para culminar, com Hussein no sobrenome. Trocaram o “gente como a gente” que Bush representava pela figura do sujeito acima da média, em termos culturais. Obama, não importa a cor de sua pele, é “gente melhor do que a gente”. É o anti-Homer Simpson. Além de tudo, está na cara que sua família come direito.
Mas o que há de mais legal no novo presidente dos Estados Unidos, na minha opinião, o que me enche de esperança de que ele vai ser, sim, essa cocada toda, é um só fato, a quem ninguém deu a devida importância: o cara é havaiano! Pega jacaré na maior categoria!
Acho que todo mundo sabe o que é pegar jacaré. Posicionar-se na onda quando ela está se formando, de tal maneira que você vem deslizando até chegar à praia, usando o corpo como prancha. Delícia. Pois então: não consigo acreditar que alguém que pega jacaré daquele jeito pudesse optar por entrar numa guerra, por exemplo. Quem pega jacaré é gente fina, não faz essas coisas. Alguns lembrarão que já tivemos um presidente desportista, e deu no que deu. Sem querer ofender quem curte aquele troço, mas não se pode comparar jacaré com jet-ski, pelo amor de Deus.
Taí, posso até estar sendo trouxa, mas confio em pessoas que sabem pegar jacaré. Vou pagar para ver. Aloha, 2009.
CartaCapital.
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