Ao ensejo da posse da primeira mulher eleita para a Presidência do país, ocorrem-me algumas considerações a respeito desse marco na história brasileira.
Sabemos que Dilma não foi eleita por ser mulher, mas por representar a continuidade de um projeto político que privilegia as camadas populares, sua ascensão, sua redenção. Confundindo deliberadamente as coisas, os setores da oposição, amplificados pela força auxiliar da grande mídia, procuraram, desde o início, desqualificar a figura da candidata do Governo, atribuindo-lhe,de forma leviana, ausência de personalidade e de atributos para o cargo. Ela seria, no dizer de tais boquirrotos, uma “invenção” do Lula.
Os debates eleitorais e todo o processo político que cercou as eleições mostraram os desacertos dessa teses. O que se viu foi, ao contrário, uma presença forte, ativa, incisiva, da candidata, nada ficando a dever, em termos de expressividade, à opção tucana, representada por um político experimentado e ardiloso. As agressões e baixarias foram respondidas com dignidade e inteligência e, hoje, podem todos perceber que a Presidência da República será ocupada por uma mulher que era, no Governo que se encerra, o melhor dos seus quadros. Dilma, a mulher, está aí , e não por isso, mas por ser a natural e adequada expressão política capaz de encarnar um projeto que o povo decidiu que deve prosseguir.
Embora a eleição de Dilma Rousseff não tenha sido motivada por uma questão de gênero, o fato de haver uma mulher no comando do país permite-nos alimentar fundadas esperanças de que muitos dos problemas que as mulheres vêm enfrentando na sociedade possam ser claramente combatidos , eliminados talvez.
O próprio Ministério já antecipa uma mudança positiva. Teremos, nele, a maior participação feminina da história republicana. E embora, em termos eleitorais nacionais, os quocientes obtidos pelas mulheres brasileiras ainda sejam inexpressivos e incompatíveis com a sua contribuição social em outros níveis (são 45 mulheres em uma Câmara de 513 , 12 em um Senado de 81 , 2 governadoras no total de 27), é de se esperar que frutifiquem os exemplos de mulheres comandando com eficiência pastas ministeriais, contribuindo o governo Dilma como divisor de águas para dizimar de vez o viés machista da sociedade na política (e às vezes até o “machismo às avessas” das próprias mulheres), impondo-se, a partir daqui, a presença marcante do gênero feminino no centro decisõrio político do país.
A mulher brasileira – ainda buscando a igualdade em muitos segmentos – até bem pouco tempo amargava discriminações e preconceitos inconcebíveis, herança antiga da qualificação como “res nullius” (coisa nenhuma) do direito romano. Subjugada ao “pátrio poder” , foi moeda de troca em casamentos por interesse, durante muito tempo concebida apenas como reprodutora e mantenedora do “equilíbrio do lar”. Somente obteve o direto de votar sem qualquer restrição há cerca de 65 anos e até os meados do séculos XX apenas podia viajar sozinha ou trabalhar com autorização expressa do marido. Não por acaso, eram raras as presenças femininas no campo intelectual ou artístico e no âmbito do trabalho qualificado. Mas, agora, a sociedade impõe e espera uma mulher livre da tutela e da dominação secular, em todos os níveis.
Um governo constituído por uma mulher e integrado por várias delas pode e deve influenciar nos avanços que se espera para o gênero feminino e sua participação social. Desafios não faltam. Sabe-se que 51% dos lares brasileiros são sustentados por mulheres, mas, contraditoriamente, ainda é preciso assegurar-lhes uma política de saúde que encare de frente problemas que lhes são inerentes (o aborto é um deles), sendo imperioso, para mencionar alguns exemplos , garantir-lhes creches para os filhos, participação efetiva no mercado no trabalho e salários equivalentes aos dos homens.
Capítulo especial merece a necessidade de que se faça valer com vigor cada vez maior a lei Maria da Penha, que não surgiu de uma ficção, mas de uma nefasta realidade marcada por violência e iniquidade. É preciso combater as discriminações odiosas como as do Juiz que foi notícia recente na mídia quando, em despacho vergonhoso, conseguiu consolidar todas as bobagens que o machismo empedernido vem reproduzindo ao longo do tempo.
É a hora e a vez da mulher Dilma, que não chegou nem está aí por acaso. Representa um processo político que está dando certo e do qual vem sendo um artífice. E, quem sabe, representará um marco inesquecível na garantia do acesso definitivo das mulheres a um estatus de igualdade social com os companheiros masculinos, inclusive com u movimento de atração para a ambiência política, onde, seguramente, há um lugar que a história lhes reservou.
Rodolpho Motta Lima.Advogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasil.
Fonte:Direto da Redação
Um comentário:
Gilvan, você sabia que no twiter só se fala do assassinato da Dilma. Teve até um sujeito que falou que se ganhar na mega-sena da virada ele vai contratar o melhor atirador do mundo para matar a Dilma. Leia no Eduardo Guimarães.;
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