Rachel Duarte
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, esteve no Rio Grande do Sul, nesta sexta-feira (21), para renovar o convênio do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) com o governo gaúcho. Antes de retornar a Brasília, ele concedeu entrevista ao Sul 21. Falou sobre as suas principais metas à frente da pasta.
Cardozo reconheceu que é necessário avançar mais no combate ao crime organizado, existente nas fronteiras do país; que o sistema jurisdicional é lento e que é fundamental recuperar o sistema prisional brasileiro. Ele ressaltou os resultados alcançados pelo governo federal nos últimos anos e projetou que as gestões da presidenta Dilma Rousseff e do governador gaúcho e ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, serão exitosas. O ministro não precisou que mudanças vai propor, mas afirmou que os Códigos de Processo Civil e Penal serão reformados. Cardozo disse ainda que, na política, não será mais candidato às eleições proporcionais, deixando subentendido que poderá concorrer às majoritárias.
Sul21 – A renovação do convênio entre o Ministério da Justiça e o governo do Rio Grande do Sul, nesta sexta-feira (21), foi seu primeiro ato oficial como titular da pasta. O senhor falou que escolheu o RS pela proximidade com Tarso. Sua vinda ao estado foi mais política do que oficial?
José Eduardo Cardozo (JEC) - Eu diria que foi mais pessoal e política do que oficial. Tenho um carinho muito grande pelo governador Tarso Genro. Como eu estava em Minas Gerais, onde almocei com o governador Anastasia, resolvei tocar direto e vir ao Rio Grande do Sul, na noite de ontem (quinta, 20), para jantar com o governador. Pude atualizar algumas conversas que temos com frequência.
“O Ministério da Justiça tem uma atuação multidisciplinar”
Sul21 – O senhor “roubou” alguns nomes do governo de Tarso. Na verdade, ambos quiseram os mesmos quadros em algumas áreas. Como isso foi equacionado?
JEC – O que nós tivemos foi porque temos uma grande identidade de visão das coisas. As grandes pessoas que ele queria que trabalhassem com ele, eu também queria que trabalhassem comigo. Daí tivemos que fazer um acordo (risos). Mas, obviamente, foi feito um acordo entre companheiros e amigos, sem nenhum tipo de tencionamento.
Sul21 – O Ministério da Justiça tem uma série de funções, que vão desde preservar os direitos dos cidadãos até a segurança pública, contando com a Força Nacional de Segurança. Quais as mudanças ocorridas com a troca de governo?
JEC – O MJ tem uma atuação multidisciplinar. Por exemplo, na Segurança Pública, atuamos com a Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública), a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal. Também atuamos na recuperação de ativos desviados e na questão dos estrangeiros. Nas políticas de aperfeiçoamento do sistema jurisdicional, havia a Secretaria de Reforma Judiciária, que mudamos para Secretaria de Assuntos Judiciários. Também atuamos na parte de análises de projetos de lei que devem ser examinados sob a ótica da sua legalidade, da sua constitucionalidade e do seu próprio mérito, através da Secretaria de Assuntos Legislativos. Atuamos na área do direito econômico e da lei da concorrência, através da Secretaria do Direito Econômico e do CAD – uma autarquia vinculada ao MJ. Atuamos, também, na questão indígena, com a Funai. Também atuamos na política penitenciária e com a Força Nacional, que tem papel fundamental no plano de apoio a situações de catástrofes.
Tem duas mudanças no Ministério da Justiça: a criação da Secretaria Nacional Antidrogas, que saiu do Gabinete de Segurança Institucional, e o Arquivo Nacional, que tem sede no RJ e veio para o MJ. Cuidamos agora do sistema nacional de arquivos.
Portanto, a nossa gama de ações é variada, mas o foco dado pela presidenta Dilma Rousseff é justamente o do combate ao crime organizado, a redução da violência e a redução do consumo de drogas.
“A Justiça é lenta, mas não é culpa dos juízes”
Sul21 – E a relação do MJ com o poder Judiciário como é? O governo federal tem propostas para a reforma do judiciário?
JEC- Não cabe ao Executivo fazer proposta de reformas ao Judiciário, mas cabe ao Executivo apoiar reformas que o Judiciário, eventualmente, faça, e buscar aperfeiçoamento do sistema jurisdicional. O poder jurisdicional tem como centro o poder Judiciário. Mas ele é composto por vários atores, desde os chamados operadores do direito (advogados, juízes, promotores, delegados de polícia) até legisladores. Na medida em que ele remonta as próprias leis processuais que são votadas pelo Legislativo, cabe ao poder Executivo apoiar toda e qualquer iniciativa de aperfeiçoamento do sistema jurisdicional. Sempre tendo uma clara relação de harmonia com o poder jurisdicional.
Sul21 – O senhor concorda com a afirmação de que a Justiça é lenta no Brasil?
JEC - A Justiça é lenta, mas não é culpa dos juízes. O sistema jurisdicional brasileiro, com todas as suas regras, produz de forma muito lenta decisões judiciais. Por uma série de razões. Uma delas são as leis processuais que precisam ser revistas. Se por um lado precisamos delas para garantir o direito de defesa e o direito ao contraditório, por outro, não podemos ter uma sistemática processual que faça incidir atuações procastionatórias, quer dizer, para a demora do processo, por parte daqueles que tem desejo de retardar a prestação da Justiça. Portanto, temos que buscar um sistema jurisdicional mais equilibrado, em que as técnicas da modernidade ganhem espaço. Cada vez mais se apropriar das comunicações pela rede mundial de computadores, que é uma realidade. Então, não há porque ficarmos avessos a este avanço no nosso sistema processual. Por esta razão, acredito que o ministério da Justiça tem um papel muito importante no aperfeiçoamento do sistema jurisdicional, mas sempre agindo em consonância com os poderes Judiciário e Legislativo.
Sul21 – Já foram assinados dois Pactos Republicanos. Quando se fala em Pacto Republicano, fala-se em que objetivamente para a melhoria de vida do cidadão?
JEC – Às vezes estes pactos não são sentidos com resultados imediatos, mas gradativamente as coisas vão avançando e tendo significado. Estes pactos republicanos ensejaram o encaminhamento de projetos de lei ao Congresso Nacional, feitos em acordo entre o Judiciário e o Executivo. São projetos que acabam aperfeiçoando o sistema e a nossa capacidade normativa. Em que pese que, às vezes, o cidadão não perceba de imediato a influência disto, o envio dos projetos acordados entre os três poderes dá maior garantia de efetivação, e os ganhos vão aparecendo.
“A nossa política de fronteiras tem três dimensões de atuação”
Sul21 – Se fala muito na necessidade de aprofundar o controle das fronteiras no combate ao crime organizado. O que está sendo feito para isso?
JEC - O trabalho feito antes de eu assumir o Ministério foi digno de aplausos. A Operação Sentinela e o Policiamento Especializado de Fronteiras (Pefron) são operações que iniciaram ao longo do governo Lula e tiveram êxito. É necessário avançar mais. A nossa política de fronteiras tem três dimensões de atuação. A primeira é a integração dos órgãos federais nesta questão. Porque, embora a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal tenham uma contribuição importante na atuação nas fronteiras, é necessária uma intervenção com as Forças Armadas. É importante o apoio das Forças Armadas, especialmente na logística e no reforço do efetivo. Já conversei com o Ministro Jobim (Nelson Jobim, ministro da Defesa) para afinarmos esta integração. A segunda dimensão é a integração com os estados, para termos as forças combinadas com os estados por meio de um Pacto Nacional. A terceira dimensão é a que chamamos de internacional: a integração e troca dos serviços de inteligência e operações combinadas entre os policiais brasileiros e os de países de fronteira. Isso, muitas vezes, nos faz sentar à mesa para buscar encaminhamentos comuns.
Sul21 – Qual a previsão orçamentária para investimentos em presídios que possam garantir a ressocialização dos apenados?
JEC – Ainda não temos nem a previsão geral do orçamento do MJ. Mas, esse é um ponto fundamental do nosso planejamento. Obviamente teremos limitações orçamentárias, então não faremos propostas baseadas em sonhos. Mas, evidentemente, vamos investir para recuperar os nossos presídios.
Sul21 – Esta questão da recuperação do sistema prisional é uma das principais metas do governo gaúcho. Conhecendo o secretário Airton Michels, que veio do Departamento Nacional Penitenciário, que resultados o senhor espera do estado que hoje tem um dos maiores déficits prisionais do país?
JEC – Tenho uma identificação de concepção com o ex-ministro Tarso Genro. Com isso, tenho absoluta convicção que ele fará um bom governo, dando uma ênfase histórica para o tema da segurança e cidadania, devido à experiência adquirida por ele ao longo da vida. E o tema será tratado com cuidado e extrema atenção.
“A diminuição da idade penal não resolve em hipótese nenhuma, nenhum problema criminal”
Sul21 – E o senhor aceitará, como pediu o governador Tarso Genro, que o Rio Grande do Sul seja referência nacional dos projetos federais na área da segurança?
JEC – Não tenho a menor dúvida que o RS será uma referência. No que depender do Ministério da Justiça, ele terá o que for preciso para que o Rio Grande do Sul tenha esta realidade.
Sul21 – No Brasil, quem comete algum crime até os 18 anos, é julgado de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que prevê pena máxima de reclusão de três anos. O senhor é a favor da diminuição da idade penal?
JEC – Não. Não acho que isso resolve em hipótese nenhuma, nenhum problema criminal. Ao contrário, você só o agrava. Ao invés de caminharmos numa linha de buscar a reinserção social daquele adolescente infrator, você acaba, com este tipo de postura, nivelando situações com outros casos que não deveriam ser nivelados como iguais. Quando você coloca um jovem infrator atrás das grades, com grandes criminosos, você o inicia na escola do crime. E não é este o caminho. Bem, mas aí alguém pode questionar que esse caminho não é o de hoje. Mas eu prefiro seguir no caminho correto e não consolidar o que está errado, através da redução da idade penal para pessoas que poderiam estar no início da sua vida sendo recuperadas pela sociedade.
Sul21 – Mas, há países em que até crianças de 12 anos são julgadas pelos crimes que cometem. Qual a sua posição?
JEC – Tem países em que a realidade é outra, devido à sua tradição e sistemática. Nós podemos olhar para outros países como padrão de referência, mas nunca podemos pretender fazer adaptações automáticas à nossa realidade. Por exemplo, se você olhar países como Inglaterra ou EUA, entre outros, pensando no seu sistema jurídico e pretender implantar as mesmas regras, você tem que pensar que por trás dos sistemas deles as realidades são outras. As leis têm características históricas, culturais e sociais que nem sempre podem ser tidas como corretas para nós. Até podemos adaptar algumas leis às nossas características sociais e econômicas, decorrentes de uma série de fatores históricos do Brasil. Então, embora outros países tenham tratamento diferentes para esta questão da idade penal, nós temos que pegar como base o nosso país. E, para o Brasil, qualquer postura nesta perspectiva parece rigorosamente inconveniente.
“O ECA foi uma grande conquista para sociedade brasileira”
Sul21 – O ECA é importante para garantia dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, mas não há brechas que deixam margem para a impunidade? Não se considera uma revisão?
JEC – Qualquer lei é passível de revisão. Mas, o ECA foi uma grande conquista para sociedade brasileira. Não creio que é com um apenamento mais rigoroso que você resolva o problema dos menores infratores e sim com um tratamento mais sério sobre esta questão. Agora, claro que não podemos ser avessos ao aperfeiçoamento de alguma lei. Mas, ressalto dentro deste tema que o jovem tem que ser tratado como infrator numa perspectiva de ressocialização e adaptação à sociedade, o que é perfeitamente possível nesta faixa de idade. E isso não seria permitido com um sistema penal rígido, por exemplo.
“Dilma é uma mulher excepcional e que tem muito conhecimento da administração pública”
Sul21 – Há necessidade ainda de mexer nos Códigos de Processo Civil e Penal? O MJ fará propostas?
JEC – Os dois grandes diplomas legislativos que hoje estão em debate são dois projetos de lei aprovados pelo Senado, um Código de Processo Civil e o outro Código de Processo Penal. Eu acho necessário mudar sim. É necessário que nós tenhamos uma atualização da legislação com as inovações tecnológicas que a própria sociedade impõem. O nosso Código de Processo Civil é de 1973. São várias décadas que nos separa deste código. Embora ele tenha sido ajustado sucessivamente por leis que fizeram adaptações, com inovação na parte recurssal, com inovação na parte do processo de execução. A verdade é que a espinha dorsal de concepção deste código é a mesma. Passado algumas décadas é necessário que nós reflitamos sobre novas realidades estruturantes da nossa sistemática processual, já que a velocidade do tempo se acelera e que a vida é vivida com mais rapidez e as mudanças são efetivadas na mesma velocidade. Por esta razão, acho que devemos rever o Código de Processo Civil e o MJ mergulhará de cabeça nestes dois projetos que foram aprovados pelo Senado. Nossa participação será ativa nos debates junto ao Legislativo, mas abrindo a consulta à sociedade para que ela participe e opine.
Sul21 – O senhor tem bastante proximidade com a presidenta Dilma Rousseff, inclusive é um dos seus “três porquinhos”. O que o senhor acredita que a levou à presidência?
JEC – Eu sou suspeito para falar da Dilma. Tenho um apreço e um carinho por ela. Mas ela é uma mulher excepcional e que tem muito conhecimento da administração pública. É uma excelente gestora. E construiu uma vivência política que lhe deu maturidade para chegar à condição de presidenta. Ela será uma grande presidenta, mas não pelo fato de ser a primeira mulher presidente, mas, por ser sensível à realidade do país.
Sul21 – A presidenta Dilma se comprometeu com grandes reformas, como a tributária, a política e a dos meios de comunicação. O senhor acredita que este governo fará estas reformas?
JEC - Creio que ela fará tudo que for possível e estiver ao seu alcance. Nós, ministros, vamos contribuir com a mesma intensidade para que ela cumpra todo o seu programa de governo.
Sul21 – Até estar ministro da Justiça, sua trajetória política sempre foi no Legislativo. Porém, o senhor declarou no ano passado que o sistema das eleições proporcionais é “como um vírus da procriação da corrupção e das práticas não republicanas”. O senhor mantém esta posição ou podemos ter surpresas com alguma candidatura sua em São Paulo?
JEC- Eu fiz uma carta muito firme em que abordei porque não faria mais disputa em eleições proporcionais. E expliquei que, neste sistema de eleição, não participaria de mais nenhuma eleição. Mas não disse que abicaria totalmente da vida pública ou política.
Sul21 – Então o senhor ainda será candidato? Podemos ter surpresa daqui a dois anos nas eleições para prefeitura de São Paulo?
JEC – Com absoluta certeza, enquanto o sistema proporcional for este, não serei mais candidato a deputado federal, estadual ou vereador. E o próximo passo será apenas fazer com que o Ministério da Justiça cumpra seu papel.
Fonte:Sul21
2 comentários:
Ah é, é?
Infantil!
É preferível ser "infantil" do que INCOMPETENTE!!!
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