domingo, 30 de agosto de 2009

Portalões pensam em cobrar acesso


Por necessidade, jornais voltam a cogitar sites pagos

Gustavo Casadio

Direto de São Paulo

Grandes empresas de comunicação têm dado sinais de que vão começar a cobrar pela oferta de seu conteúdo digital. Em meados de julho, Lionel Barber, editor do britânico Financial Times, afirmou que "quase todas" as organizações de mídia estarão cobrando por seu conteúdo online dentro de um ano. A prática, que já foi mais comum no começo das operações destas empresas na internet, deve voltar por uma questão de necessidade, apontam especialistas.

Em maio, o dono da News Corporation, Rupert Murdoch, já havia dado o prazo de um ano para começar a cobrar pelo acesso ao conteúdo digital de suas publicações. O executivo disse ao jornal britânico The Guardian que estava encorajado pelo sucesso deste modelo de negócio adotado em um de seus periódicos, o The Wall Street Journal. O jornal de finanças cobra pela leitura a quase todos seus artigos, deixando acesso livre a apenas algumas matérias ou só às primeiras frases.

Para o professor de comunicação da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo Eugenio Trivinho, as empresas sabem que a decisão de cobrar pelo conteúdo é antipática frente ao internauta. Contudo, tornou-se uma necessidade diante da situação financeira destas companhias.

"Não é algo definitivo, como o acesso livre ao material parece que também não foi. Tudo é uma questão de necessidade imediata", diz Trivinho.

O consultor em comunicação Alexandre Secco concorda com a tese de que a cobrança só é motivada por uma posição crítica na qual se encontram as empresas de comunicação. "O fluxo de dinheiro nos jornais caiu dramaticamente. Muitos jornais quebraram. Neste momento eles pensam 'é melhor eu ter menos leitores pagando do que quebrar'".

Pesquisa feita este ano pela consultoria PricewaterhouseCoopers aponta que os leitores veem as notícias do dia a dia, conhecidas como hard news, como commodities, algo que podem achar com qualidade similar tanto em veículos gratuitos quanto naqueles que cobram pela informação. Contudo, estes mesmos leitores estariam dispostos a pagar por um material premium, com matérias analíticas.

"Somente um conteúdo muito específico pode ser pago. As grandes audiências não vão migrar para o conteúdo pago", diz o diretor geral do Terra no Brasil, Paulo Castro. Procurados, UOL e Abril não se manifestaram sobre o assunto.

Tentativa e erro

Para Edson Crescitelli, professor de marketing da Universidade de São Paulo (USP), a estratégia é apenas mais uma tentativa de as publicações se adaptarem ao mundo digital. Ele diz que a dificuldade dos veículos de comunicação impressos em elaborar um modelo de negócios de sucesso na internet vem do fato de a rede de computadores ter acabado com o "monopólio da informação".

"Na internet você pode pagar pela informação, mas também ter acesso a ela de graça. É como se eu tivesse, numa banca, acesso a um jornal pago e a um grátis, com a mesma informação. A internet foi construída numa cultura de que a informação é de graça. Por que o Google faz tanto sucesso? Porque ele é baseado num processo de gratuidade. Quando os jornais começaram a cobrar, eles viram que ficou difícil. A solução então foi abrir a informação - mas aí veio o problema da receita", diz Crescitelli.

A pesquisa da Pricewaterhouse mostra que 62% dos leitores se disseram dispostos a pagar por informação online, enquanto 100% pagariam pelo conteúdo impresso. No entanto, a consultoria espera que a disposição dos consumidores em pagar por conteúdo online aumente nos próximos anos, em paralelo ao crescimento do e-commerce.

Em julho, o The New York Times afirmou que pode anunciar neste mês o sistema de cobrança por seu conteúdo digital, atualmente gratuito. Contudo, o próprio diário nova-iorquino já adotou o modelo pago, mas, em 2007, aboliu o sistema alegando que os ganhos com esta receita tinham sido menores do que o crescimento com venda de anúncios online. Na época, a empresa disse esperar a geração de US$ 10 milhões com conteúdo pago, mas a projeção não foi alcançada.


Na época em que anunciou a liberação total de seu site, o NYT citou a experiência frustrada de cobrança feita pelo The Los Angeles Times, que viu seu tráfego despencar após início da tarifação.

Para Crescitelli, a volta da cobrança não acontece pelo fato de as empresas de comunicação terem achado a fórmula ideal para atuar na internet. "É uma questão de sobrevivência. O Google ganha com patrocínio. Mas as outras empresas não conseguiram equacionar isso direito. Não se trata de deficiência, é porque é um processo novo. Algumas empresas se adaptam e outras não e vão sumir".

Experiência de sucesso

O consultor em comunicação Alexandre Secco alerta que são poucos os casos de sucesso de cobrança por conteúdo de veículos de comunicação online. Contudo, para ele, é possível dizer que a tendência, pelo menos nos Estados Unidos, é a volta deste modelo.

"A The Economist sempre cobrou e nunca ninguém reclamou. É um modelo que inspira muita gente. É uma das poucas publicações neste momento de crise que não foi abalada", diz o consultor.

"É uma questão de segmentação. A Reuters, a Bloomberg oferecem conteúdo pago, tabelas, índices em tempo real. Mas é um público muito restrito que se interessa por este tipo de informação. Acho que um modelo de negócio aberto, para uma audiência de milhões, ou um modelo pago para alguns milhares podem sobreviver", diz Castro, do Terra.

O estudo da Price conclui que embora haja uma disposição maior a pagar por conteúdos analíticos, as notícias encaradas pelo leitor como commodities também precisam fazer parte da oferta. Para a consultoria, um mix entre notícias de graça e conteúdo especializado pago seria uma boa estratégia.

Para Crestelli, o desafio de encontrar um modelo de negócio rentável é muito maior para as empresas de comunicação tradicional do que para os veículos nascidos na internet. "O Google nasceu assim, ele nasceu com esse DNA . Mas para um jornal com 100 anos é mais difícil".

» 'Sunday Times' planeja site com conteúdo pago.
Terra.

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