Sai ano entra ano e as tragédias se repetem no período das chuvas de verão. Em 2010 foi Angra dos Reis e Niterói, agora é a região serrana com centenas de vítimas fatais. Amanhã poderá ser outra área do Estado do Rio ou do País. Mas o pior disso tudo é que se providencias preventivas fossem tomadas poderia se reduzir o número de vítimas. Para isso será necessário mudar o conceito de Defesa Civil.
No Rio de Janeiro e nas cidades serranas a especulação imobiliária tomou conta. Prédios e residências foram erguidos sem obedecer ao mínimo critério de segurança e ocasionaram desequilíbrios ecológicos.
São anos na base de sinal verde à especulação imobiliária. Prefeitos, governadores e parlamentares financiados em suas campanhas por empresas do setor, posteriormente cobravam a fatura, e cobram ainda. Resultado: quebrou-se o gabarito dos prédios em vários bairros das cidades e foram permitidas construções, não poucas luxuosas, em áreas de risco. O Rio e a Região Serrana que o digam.
A mídia de mercado, que durante muito tempo vem sendo contemplada com rica publicidade imobiliária silenciou sobre esses fatos. Os jornalões e telejornalões, no entanto, não pouparam as construções em áreas de risco nas favelas. Como se somente os pobres fossem culpados pelas tragédias de verão. Até editoriais nesse sentido foram escritos, como se os pobres fossem culpados por morarem em condições precárias nas encostas de alguns morros.
Como se tudo isso não bastasse, o Poder Público pouco ou nada tem feito em matéria de prevenção. As fortes chuvas de agora, mais fortes ainda do que as habituais, estavam previstas há pelo menos três meses, segundo especialistas do setor. E o que foi feito de concreto para minorar as consequências a não ser promessas e mais promessas não cumpridas?
Em países sujeitos a fenômenos naturais de graves consequências os efeitos são minorados porque o Poder Público prepara a população com antecedência. Um dos exemplos é Cuba, uma ilha caribenha, pobre, sujeita anualmente a ciclones e furacões com efeitos perversos. Lá, o Estado oferece alternativas à população e quase não há vítimas fatais. Para se ter uma ideia, 16 furacões, entre 1998 e 2008 provocaram prejuízos materiais de 20,5 bilhões de dólares, o que corresponde a metade do PIB da ilha.
Enquanto isso, nestas bandas, o governador Sergio Cabral estava de férias na Europa, repetindo o ano passado quando demorou a aparecer em Angra dos Reis, pois se encontrava recolhido em sua mansão em local próximo da tragédia. Teve de antecipar a volta porque a Presidenta Dilma decidiu ir pessoalmente à região serrana. Ele agora culpou “governos populistas” instalados nos anos 80 por permitirem construções em áreas de risco em locais pobres da cidade, mas calou a boca em relação à especulação imobiliária. Será por quê?
Cabral como governador deveria saber que muitas residências construídas em áreas de risco bem antes dos anos 80 também foram atingidas pelas chuvas na região serrana. E os pobres que constroem seus barracos em áreas de risco não o fazem porque querem, mas porque precisam. Culpá-los por isso é coisa da elite, da qual faz parte Sergio Cabral.
Outra coisa, se a população brasileira hoje é 85% urbana e 50 anos atrás a proporção era 85% rural, de que forma aconteceu esse deslocamento? Os governos promoveram reformas agrária e urbana? Cuidaram da ocupação do solo e ordenaram as cidades?
Há exatamente um ano acontecia o terremoto do Haiti, tragédia que mobilizou o mundo com promessas de ajuda humanitária e verbas para reerguer Porto Príncipe. E o que está acontecendo neste momento? As imagens mostram que praticamente nada foi feito, dando a impressão que o terremoto foi ontem. Há até corpos ainda debaixo dos escombros, segundo informações da capital do Haiti.
Menos de 20%, dos US$5,6 bilhões prometidos pela comunidade internacional, foram entregues. Da quantia que chegou, a maior parte foi usada para pagar dívidas. Cerca de um milhão de haitianos vivem em acampamentos improvisados, em condições de higiene precárias e ainda pior: em Porto Príncipe, centenas de milhares de seres humanos estão sendo obrigados pelos proprietários dos terrenos onde construíram suas tendas a sair dos locais. Como não têm para onde ir, apelam às autoridades no sentido de evitar as expulsões. O governo não os atende.
O mundo, com raras e honrosas exceções, prefere mandar efetivos para as “forças de paz” das Nações Unidas controlarem a situação no Haiti do que médicos para atender aos necessitados. Uma das honrosas exceções ficou por conta dos médicos cubanos, presentes no Haiti, aliás, bem antes do terremoto, com uma equipe que atendeu em duas semanas 9.857 pessoas vítimas de cólera e sem a ocorrência de nenhuma morte.
Por aqui, quando ocorrem as tragédias, também promessas e mais promessas são feitas. E quais os resultados? Perguntem às comunidades atingidas. No Rio, a Prefeitura pretende apenas aproveitar a ocasião e remover favelas que não estão em áreas de risco, tendo em vista os mega eventos de 2014 (Copa do Mundo) e 2016 (Olimpíadas). E tudo isso com o beneplácito dos jornalões e telejornalões com pautas preconceituosas e manipuladoras contra os segmentos pobres da população.
Por estas e várias outras, como disse o insuspeito Caetano Veloso, o Haiti é aqui.
Em tempo: O governador do Estado do Rio, segundo o jornalista Luis Nassif, doou para a Fundação Roberto Marinho 24 milhões de reais do FECAM (Fundo Estadual de Conservação do Meio Ambiente), para a contenção de encostas e obras de drenagem. Isso aconteceu em outubro do ano passado. Podem imaginar como isso se reflete na cobertura das Organizações Globo sobre as realizações de Cabral. Mas como ele foi eleito, agora é aguentar as consequências.
Mário Augusto Jakobskind, Direto da Redação
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