domingo, 29 de janeiro de 2012

A política de higienização de Alckmin/Kassab vai continuar

Kassab e Alckmin preparam próxima desocupação, no centro da capital


 
Prédio ocupado por sem-teto entre as esquinas Ipiranga e São João será o primeiro a sofrer reintegração de posse na região central em 2012



Por: João Peres, Rede Brasil Atual

 
São Paulo – Será no dia 2 de fevereiro. Após abrir a temporada 2012 de desocupações com a operação na comunidade do Pinheirinho, em São José dos Campos, a 100 quilômetros da capital paulista, a Polícia Militar de São Paulo faz o debut no centro da cidade com a remoção de ao menos 200 famílias que ocupam um imóvel que abrigava um bingo até a proibição de funcionamento desse tipo de estabelecimento.

 
A esquadra chega à nova operação confiante após elogios do governador Geraldo Alckmin, satisfeito com a expulsão de seis mil pessoas que habitavam um terreno da massa falida de uma das empresas do especulador Naji Nahas no interior paulista. O incentivo deve garantir a manutenção do perfil agressivo da equipe encarregada da missão.

 
A atuação recebe o reforço dos integrantes da Guarda Civil Metropolitana, parceira estratégica ao longo de 2011 e na repressão a dependentes químicos no bairro da Luz, taxado de "cracolândia". O êxito é dado como certo porque o time atua em casa e conta com o auxílio da arbitragem.

 
Quis o destino que o endereço da estreia fosse o famoso encontro das avenidas Ipiranga e São João. Longe de alegrar o coração de quem passa por ali, a esquina escolhida para a imortalidade por Caetano Veloso é hoje um amontoado de imóveis velhos, desocupados e muita vezes apodrecidos, à exceção de um bar que há décadas soube capitalizar o atrativo.

 
Aos 46 anos, Jussamara Leonor Manuel prepara-se para encarar as ruas pela quarta vez. Ela e os companheiros foram expulsos de um espigão na São João em novembro de 2011 e agora, três meses depois, preparam-se para serem novamente desalojados. Mãe de seis filhos, passou a lutar pelo direito à moradia em 2004, ano em que José Serra (PSDB) foi eleito prefeito de São Paulo. A partir dali, a situação complicou-se um pouco mais. Rua do Bosque, avenida 9 de Julho (duas vezes), avenida Prestes Maia e avenida São João: foram oito anos complexos. “Não tenho para onde ir”, diz.

 
A Afim Brasil Eventos e Promoções Ltda., que se apresenta como dona do imóvel, ingressou com ação em novembro passado pedindo a reintegração de posse. Alegou ter contrato de aluguel assinado no local, argumento aceito pela 20ª Vara Cível da Justiça de São Paulo seis dias após o registro do processo. “É cediço que a turbação, o esbulho ou a simples ameaça de perturbação à posse de alguém, pela violência que caracteriza e a consequente intranquilidade que provoca, deve ser reprimida”, argumenta a decisão judicial, que permitia já em 12 de dezembro promover a reintegração contra a Frente de Luta por Moradia, réu no caso. “Ressalte-se que para a posse ser justa não pode ser violenta, nem clandestina e nem precária, como a posse dos réus”, defende o Judiciário paulista.



"Vou para rua"



À medida que se abre a porta de ferro colocada na avenida Ipiranga, revela-se uma série de barracões de madeira que servem como moradia. Escoras de metal seguram o que seria o segundo piso, e as vigas que deveriam sustentar o concreto estão à mostra e corroídas. O chão, especialmente no andar de cima, está cheio de buracos, o que leva os integrantes do movimento a questionarem a versão de que o prédio estava alugado.

 
“Está condenado”, diz Osmar Borges, coordenador da Frente de Luta, enquanto ouve as queixas dos moradores, que temem que a estrutura desabe de uma vez. “Nossa ideia não é morar aqui. Queremos que o proprietário receba aquilo que é de direito dele, mas se o prédio está abandonado, a prefeitura pode requisitar a propriedade para função social. Aí se constroem unidades habitacionais pelas quais a gente possa pagar.”

 
As famílias rejeitam a sugestão da administração Kassab de serem removidas para um abrigo enquanto não conseguem ser atendidas por algum programa de moradia. Nestas unidades existe a exigência de que homens e mulheres fiquem separados, o que, na prática, significa que essas pessoas ficam privadas do convívio familiar.


Jussamara não acredita também na promessa de que os moradores serão cadastrados nestes programas de habitação: ela já o foi uma vez, e nada ocorreu. A militante puxa do fundo do peito a respiração quando questionada sobre o que vai fazer no dia 2, quando estiver novamente sem teto. Deixa as lágrimas verterem, e vaticina, meio sem coragem, aquilo que lhe cabe nesta vida: “Já sei que a prefeitura não vai fazer nada. Vou para a rua”. Jussamara fala com a experiência de quem sabe que joga no time mais fraco.

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