sexta-feira, 10 de abril de 2009

Economia ainda está um "luxo"

7 DE ABRIL DE 2009

A professora rasga o verbo. Com sua voz rouca de cigarro, a economista Maria da Conceição Tavares esbraveja contra notícias e interpretações que considera “terroristas”. Pelos jornais, sua referência é sobre a hipervalorização da queda do superávit primário - o nome técnico para a economia que União, estados e municípios fazem para pagar os juros da dívida.

A queda do superávit primário foi de 54% em fevereiro de 2009 na comparação com o mesmo mês do ano passado. O resultado é o pior resultado desde 2005. Conceição Tavares não espera nem o final da pergunta:

- Rapaz, pare com isso! Houve queda no superávit primário, sim. Mas não houve déficit. Continuamos com superávit primário, só que menor.

Da mesma maneira, não se importa com o percentual baixo de crescimento projetado pelo Banco Central no último relatório de inflação. Houve uma redução da previsão do Produto Interno Bruto (PIB) de 3,2% para 1,2%. A pesquisa também inclui uma desaceleração do ritmo de consumo do Brasil.

Para Conceição Tavares, a situação não é crítica:

- Não vejo nenhuma apreensão ao superávit, assim como não vejo em relação à projeção do PIB. O Banco Central diz que é de 1,2%. Vamos ver. Sobretudo levando em conta que dezembro absorveu, pela metodologia das pesquisas do IBGE, toda a queda do PIB. (…) Não me parece nada do outro mundo.

Em entrevista a Terra Magazine, a economista, que já foi deputada federal pelo PT do Rio de Janeiro, fala que os dados da economia brasileira ainda são um “luxo” na comparação com qualquer país em desenvolvimento. “O único país que está melhor que a gente é a China. Estamos melhor que a Rússia e outros”, sentencia.

Leia a íntegra da entrevista a seguir:

Terra Magazine - Professora, qual a opinião da senhora sobre os últimos dados das contas públicas? Tivemos uma grande redução do superávit primário, o que gerou o pior resultado das contas do governo desde 2005…

Maria da Conceição Tavares - Rapaz, pare com isso. Houve queda no superávit primário, sim. Mas não houve déficit. É preciso ter muito cuidado com o que se fala. Continuamos com superávit primário, só que menor. O ano passado estava gigantesco por causa da receita que cresceu para burro com a atividade econômica. Não houve nenhuma queda dramática, houve só uma queda. A queda maior foi em janeiro por razões óbvias porque a crise maior foi em dezembro. Uma segunda coisa é que o déficit nominal caiu e não subiu, por causa das despesas financeiras. A conta financeira do governo melhorou por causa da queda dos juros, por causa da queda da dívida pública.

Então essa gordura que acumulamos nas contas e que agora estamos perdendo não vai prejudicar a economia?

Claro que não. É o que diz o próprio Banco Central e todo mundo, exceto os analistas que ficam projetando o futuro. E ficar simulando o futuro nessa crise não está com nada. Em fevereiro, tivemos um superávit de 3,4%, que é superior ao projetado pelo governo. E, ademais, caiu o déficit nominal para burro. Na semana passada mesmo participei de um debate no Conselho do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), tinha gente que fazia confusão entre superávit primário e nominal. Ou seja, nós temos um superávit primário e acima da meta. E esperamos que caia mais ainda.

A alteração das contas públicas não pode ter problemas no longo prazo?

Não é nada, rapaz. Nós continuamos um luxo. O nosso superávit primário é um dos maiores do mundo. O que tem é muita gente fazendo aquela besteira de comparar às contas em relação ao PIB e fazer pela média anual. Pegam a queda do PIB de dezembro e “anualizam”, aí não dá. Se você pega a queda do superávit e “anualiza”, a situação fica complicada. Mas não é o caso. Eu pessoalmente espero que o superávit primário caia. Se tem que cair o superávit primário, tem que cair o déficit nominal por conta das contas financeiras.

Qual a opinião da senhora sobre as medidas do governo para estimular o consumo e o emprego?

Até aqui o consumo não caiu radicalmente, nem o emprego. Nós, em matéria de consumo e emprego, contas fiscais e contas monetárias, estamos ainda nadando de braçada em relação ao resto do mundo. Imagine que você não ache que sejamos uma ilha de prosperidade à margem de todas as crises. Mas estamos reagindo à crise de uma maneira moderada. Não entendo muitas notícias. O superávit primário é o menor em quatro anos em valor. Claro, ué. Durante quatro anos subiu para burro o superávit primário. Por quê? Porque a receita estava bombando, e como as regras fiscais continuavam as mesmas, obviamente isso aconteceria. Por outro lado, o déficit nominal, que estava pior por causa do juro alto, caiu. E espera-se que continue caindo, não é verdade?

A senhora acredita que há uma hipervalorização da crise então aqui no Brasil?

A imprensa tem que escrever notícia com esse viés pessimista. Faz manchete. Isso é minha opinião. Isso não contribui em nada. Manchetes desse estilo é uma manchete terrorista, não tem sentido. Por que não compara com os diversos países do mundo? E porque não diz que o superávit ainda está acima da meta? O único país que está melhor que a gente é a China. Estamos melhor que a Rússia e outros. Não vejo nenhuma apreensão, assim como não vejo em relação à projeção do PIB. O Banco Central diz que é de 1,2%. Vamos ver. Sobretudo levando em conta que em dezembro absorveu, pela metodologia das pesquisas do IBGE, toda a queda do PIB. Agora, a queda da taxa de crescimento do ano passado foi toda absorvida em dezembro. Então não tem efeito de repasse esse ano.

Mas vamos ter uma retração da economia esse ano…

Crescer 1,2% partindo da queda que tivemos em dezembro não me parece nada de outro mundo. Acho que a gente aguenta este ano firme. E até pensando que até 2010 a política econômica continuará muito conservadora para o meu gosto. Agora, o engraçado é que todo mundo se tornou keynesiano no mundo inteiro. E nós vamos continuar como o quê? Neoclássicos? Então, que papo é esse de pior resultado do superávit primário, se ainda estamos acima da meta. Estamos sendo exagerados. Só ver o resto do mundo e, sobretudo, aqui na América Latina com Chile e Argentina. E em nosso caso, quando você tem medo da recessão - corretamente -, tem medo do desemprego, e da queda da renda familiar, você tem que fazer políticas para estimular a economia, senão quem vai fazer? As empresas? Elas não estão fazendo nada. Estão esperando.

E muitas ainda com dinheiro em caixa…

As empresas já estão fazendo caixa. Os bancos então, nem se fala. Só fazem caixa. O dinheiro que foi dado para eles pelo Banco Central eles meteram na caixa e aplicaram na dívida. Então realmente um rolo. Alguém tem que falar essas coisas.
Terra Magazine.

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