Ricos e pobres, do Sul e do Norte, querem negociar com o Brasil
Autor(es): Marta Watanabe
Valor Econômico - 15/09/2009
Trem-bala, construções para a Copa do Mundo, petróleo do pré-sal, oportunidades no Nordeste ou Ano da França no Brasil. Mudam as razões mais imediatas, mas o discurso é muito parecido. "Nunca houve tanto interesse pelo Brasil" é uma frase que hoje é muitas vezes ouvida de integrantes de câmaras de comércio e de representantes de órgãos governamentais que buscam fomentar as relações bilaterais entre o Brasil e um terceiro país. A crise e seu impacto na corrente de comércio do Brasil com os demais países não afetou a intensa agenda com eventos e rodadas de negócios das câmaras de comércio. Ao contrário, fez ela se intensificar.
Há duas semanas o Estado do Espírito Santo sediou o Encontro Econômico Brasil-Alemanha. Estavam agendadas previamente para o evento 67 reuniões de negócios, que saltaram para 180 em função da demanda. Neste ano devem desembarcar no Brasil representantes de 500 empresas francesas para cerca de 40 eventos agendados para 2009. A ideia, segundo divulgação do governo francês, é, paralelamente às comemorações culturais do ano da França no Brasil, promover também as relações comerciais entre os dois países. A Câmara de Comércio França-Brasil contabilizou de janeiro a julho deste ano 256 consultas de empresas interessadas em investir ou vender para o Brasil. A estimativa da câmara é que serão ultrapassadas as 340 empresas que fizeram consultas no ano passado.
Nesta semana o país receberá 16 empresários árabes interessados em participar em feiras à procura de produtos e serviços de áreas diversas como alimentos, cerâmicas, produtos de toucador e materiais de construção. Os empresários chegam com apoio da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, que inaugurou este ano um programa pelo qual traz missões com empresas interessadas em importar produtos brasileiros.
No fim deste mês, o Ceará vai assistir ao Encontro Empresarial de Negócios em Língua Portuguesa que trará empresas de oito países lusófonos interessadas em investir no país ou em relações comerciais com o Brasil. Entre os setores priorizados no encontro estão turismo, infraestrutura e recursos naturais. Também no Nordeste, o governo canadense inaugurou em agosto, em Recife, seu quinto escritório comercial no Brasil. O Canadá deve abrir outro escritório em setembro, em Porto Alegre.
Tantos eventos têm tornado mais frequente a vinda ao Brasil de autoridades estrangeiras com o objetivo de facilitar relações bilaterais com o Brasil. De janeiro a agosto de 2009 o ministro e os secretários do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) tiveram 38 reuniões com representantes de empresas interessadas em investir no Brasil ou com autoridades estrangeiras para tratar de relações comerciais. O número total é pouco maior do que as 34 reuniões com mesmo perfil registradas no mesmo período de 2008. As autoridades representantes de outros países, porém, ganharam representatividade dentro dessa agenda. No ano passado, foram dez representantes estrangeiros no período. Em 2009, foram 22 países. Os dados, levantados pelo MDIC, não incluem as autoridades que foram recebidas no Brasil por outros ministérios, como o de Relações Exteriores, por exemplo. Para o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, o Brasil continuou a ser procurado, mesmo com a crise. Para ele, isso deve-se não só à conjuntura econômica favorável do país como também em razão da divulgação do Brasil no exterior.
A elevação do interesse estrangeiro pelo Brasil também aparece nas estatísticas de entidades empresariais. O Centro Internacional de Negócios da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) registrou no ano passado 16 eventos para promoção de relações bilaterais, principalmente missões de empresários estrangeiros interessados em investir ou vender ao Brasil. Em 2009, somente de janeiro a julho, já foram 38 eventos do tipo. O salto no volume de encontros não deve parar por aí, segundo a coordenadora do centro, Janet Castanha Pacheco. "A previsão é que até o fim do ano serão cerca de 50 eventos."
Os eventos do centro, que no ano passado reuniram pouco menos de mil pessoas, ficaram mais concorridos. Devem atrair este ano cerca de 3 mil participantes. Segundo Janet, neste ano, além das missões, destacam-se também a recepção de autoridades que representam outros países. "Está todo mundo se movimentando para girar a economia", define.
A coordenadora chama a atenção para novos países que passaram a mostrar interesse no Brasil. "Este ano tivemos a vinda de países novos, como Vietnã, Índia e Dinamarca." Para Janet, o assédio estrangeiro está mais intenso do que o movimento dos brasileiros para fora do país. "O número de missões de empresários brasileiros ao exterior com apoio da Fiep manteve-se estável", explica. No ano passado foram 17 missões. Em 2009, um total de 19.
Alessandro Teixeira, presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), diz que o órgão recebeu neste ano até agora um volume de consultas 40% maior do que do ano passado por empresas querendo investir no país ou comprar produtos ou serviços brasileiros. A diversificação dos países interessados teve grande influência no aumento. "Rússia e México, por exemplo, sempre tiveram interesse no Brasil, mas agora estão vindo de forma mais concreta, com uma pauta mais forte", lembra. Para ele, além do bom desempenho da economia brasileira em meio à crise mundial, contribuiu para o assédio internacional uma exposição maior do país no exterior. "Até 2006 fazíamos uma média de 500 exposições fora do país, entre missões comerciais e participação em feiras. Em 2009, serão cerca de 745", contabiliza.
Ele esclarece que o nível de investimentos diretos no Brasil deve cair em 2009 em relação ao ano passado. "Mas no Brasil a queda deverá ser um pouco menor dos que a média de 40% esperada para o resto do mundo", diz.
De qualquer forma, ressalta Teixeira, o desempenho deve manter o ganho que o Brasil teve como destino dos investimentos diretos. Em 2000, diz ele, a Europa recebia metade dos investimentos diretos mundiais. Em 2009, o volume deve cair para 40%. Os Estados Unidos devem ficar com uma participação em torno de 15%. "A América Latina, em 2000, tinha menos de 4%. Em 2009, isso deve ficar em 6% ou 7%", acredita. E o Brasil, lembra, tem 30% de todo investimento da América Latina.
Para Ingo Plöger, coordenador do Encontro Econômico Brasil-Alemanha, do qual participa há mais de 25 anos, o atual interesse dos alemães pelo país é inédito. Isso, diz, ficou evidente no último encontro para promover relações bilaterais entre os dois países, há duas semanas. "Os números surpreenderam", diz ele. "Tivemos a vinda de 170 alemães, com uma delegação de qualidade." Segundo ele, 19 empresários estavam interessados nos negócios para a Copa do Mundo de futebol em 2014, no Brasil.
"Também havia interessados em máquinas e equipamentos para a cadeia petrolífera, trem de alta velocidade, turismo, saúde e produtos de energia solar", diz Plõger, dando uma ideia da variedade de segmentos que têm despertado o interesse das empresas alemãs. Segundo ele, as rodadas de negócios foram em volume três vezes maior do que o inicialmente agendado "Houve uma contaminação dos alemães pelo otimismo brasileiro", acredita. "Creio que este ano os investimentos alemães no Brasil vão superar os US$ 2 bilhões."
Para Louis Bazire, presidente da Câmara de Comércio França-Brasil, é o otimismo em relação às perspectivas da economia brasileira o que tem prevalecido no interesse das empresas francesas. Para ele, o ano da França no Brasil criou oportunidades de eventos para gerar novos negócios, mas o interesse independe dessa comemoração cultural. "Dentro do mundo, o Brasil está sendo considerado como um dos melhores lugares para vender e investir", diz.
Ao lado de parceiros e investidores tradicionais, surgem novos países querendo ganhar espaço nas relações bilaterais com o Brasil. Bouchaib Safir, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Marrocos, diz que a crise não comprometeu o interesse dos empresários marroquinos no país. Em 2009 a câmara deve participar de um total de cinco missões de empresários marroquinos interessados no Brasil, tanto em investimentos como em importação e exportação. A quantidade de missões deve ser a mesma do ano passado, mas cresceu o número de participantes. No ano passado visitaram o Brasil cerca de 30 empresários marroquinos. Em 2009, esse número deve dobrar. "A crise afetou muito pouco. As empresas estão interessadas em várias áreas, como alimentos, agropecuária, energia elétrica, maquinário e eletroeletrônicos", diz Safir.
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