segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Paulo Paim:Não foi a primeira vez"


Ana Cláudia Barros


Único negro a ocupar atualmente cadeira no Senado, Paulo Paim (PT-RS) conta a Terra Magazine que recebeu com indignação a notícia, dada pela Polícia Civil do Rio Grande do Sul, de que fora ameaçado em vídeo produzido por grupo neonazista. A gravação, apreendida na semana passada em meio a outros materiais, como suásticas e planos para detonar sinagogas, fez com que o delegado responsável pela investigação alertasse o parlamentar, que diz já ter sido alvo de outras tentativas de intimidação, também promovidas por neonazistas.

- Já recebi (ameaça) por e-mail, por correspondência, mas nunca dei muita bola. Nessa mesma linha. Ofensas pela cor da pele. "Negro isso, negro aquilo". "Temos que exterminar com essa raça".

Sobre esse último caso, Paim relata que, segundo informação da polícia gaúcha, o motivo principal foi sua ascensão junto ao eleitorado no último pleito.

- É pela ascensão que eu acabei tendo, saindo de 2 milhões de votos para, praticamente, 4 milhões e me apresentando como defensor daqueles que são discriminados por esses grupos neonazistas. A visão deles sobre essa ascensão não é positiva.

O senador, que vai convocar uma audiência pública para debater o tema, reconhece que é preciso investir numa política de combate ao preconceito "desde a sala de aula a cada família, cada casa".

- Isso é inadmissível em pleno século XXI, quando o mundo todo avança no combate ao racismo, ao preconceito, no momento em que se elege um negro para a presidência dos Estados Unidos... No caso do Brasil, elegeu e reelegeu um nordestino, operário, como presidente e, agora, uma mulher e nós temos que viver com esse tipo de conduta ainda. É um retrocesso.

Confira a entrevista.

Terra Magazine - O que exatamente a Polícia Civil apreendeu?


Paulo Paim - O delegado falou que foi apreendido material considerado neonazista, como cruz suástica, jornais, boletins e que até estariam fabricando bombas para detonar sinagogas. Em meio ao material, havia um vídeo em que eles me colocavam como adversário, por defender negros, idosos, deficientes, liberdade religiosa.

Havia ameaça explícita no vídeo?


Não vi o vídeo, mas o delegado diz que sim.

É verdade que o delegado ligou para o senhor para alertá-lo, pedindo que tomasse cuidado?


Ele achou que tinha que ter um pouco de cuidado, porque são grupos ideológicos, que têm uma visão muito dura, forte em relação aos grupos que pensam diferente deles. Por isso, foi recomendado que eu tivesse algum tipo de cuidado. Eu disse que ia fazer o que sempre fiz: continuar com o meu trabalho com convicção e levar a questão à debate no Senado. Convidei o delegado, porque ele acompanha essa situação em todo Brasil, na Argentina e no Uruguai.

Foi a primeira vez que o senhor recebeu esse tipo de ameaça?


Já recebi por e-mail, por correspondência, mas nunca dei muita bola.

Mas com viés neonazista?


Com certeza. Nessa mesma linha. Ofensas pela cor da pele. "Negro isso, negro aquilo". "Temos que exterminar com essa raça".

Como o senhor vê esse tipo de ameaça?


Primeiro, claro, nós lamentamos. Isso é inadmissível em pleno século XXI, quando o mundo todo avança no combate ao racismo, ao preconceito, no momento em que se elege um negro para a presidência dos Estados Unidos... No caso do Brasil, elegeu e reelegeu um nordestino, operário, como presidente e, agora, uma mulher e nós temos que viver com esse tipo de conduta ainda. É um retrocesso.

senhor deve ter acompanhado a onda de discriminação a nordestinos na internet, após o anúncio da vitória de Dilma Rousseff, agora, esse caso de neonazismo. Como o senhor avalia esses tipos de manifestação no Brasil, que sempre foi conhecido por ser uma nação pacífica?


São grupos isolados - a minoria da minoria - que levantam esse tipo de questionamento, de acusação, de ofensa, que na minha avaliação, são repudiados pelo povo gaúcho e pelo povo brasileiro. Acho que não tem que haver tantas preocupações, mas tem que ter um olhar para isso que está acontecendo. Por isso, no próximo dia 19, vou fazer uma audiência pública, em que o delegado vai vir expor essa questão, como ele está vendo esse quadro nacional.


Agora, por outro lado, o próprio resultado eleitoral demonstra que o Rio Grande do Sul não tem nada a ver com isso e o brasileiro também não.

O senhor falou de resultado eleitoral. O senhor é o único negro entre os 81 senadores. O senhor considera que isso sinaliza há ainda muito preconceito em relação ao negro?


Claro que isso faz parte da cultura que foi sendo apregoada de geração para geração. Mas, pelo menos, estamos rompendo as barreiras. Fui eleito há oito anos e reeleito com o dobro de votos em um Estado onde a comunidade negra não chega a 15%.


Apesar dessa realidade, que ninguém pode negar, estamos avançando. Mesmo na Câmara dos Deputados, negros, negras, você não acha mais de uma dúzia que tem identidade com a população negra e que defende, efetivamente, políticas de igualdade e de inclusão. São fatos reais. Por isso, no governo Lula, criamos o Ministério da Igualdade Racial. São fatos.

Além do fato de o senhor ser negro, a que o senhor atribui essas ameaças?


Segundo o delegado me passou, a atribuição é pela ascensão que eu acabei tendo, saindo de 2 milhões de votos para, praticamente, 4 milhões e me apresentando como defensor daqueles que são discriminados por esses grupos neonazistas. A visão deles sobre essa ascensão não é positiva, não é interessante...


Eu recebo esse tipo de ameaça com indignação, mas com muita consciência de que isso nos obriga, cada vez mais, a trabalhar numa política de educação no combate ao preconceito, desde a sala de aula a cada família, cada casa e a imprensa tem um papel fundamental nesse sentido.


Terra Magazine

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