segunda-feira, 3 de novembro de 2008

ISTO EM PLENO SÉCULO XXI.UMA VERGONHA!



Violência contra a mulher: 10 casos por dia em Brasília


“Se você denunciar para a polícia, eu te mato”. Essa é a realidade cotidiana de muitas mulheres. Xingamentos, ameaças e agressões físicas fazem parte da rotina. Dois milhões de casos de violência são registrados anualmente contra a mulher no Brasil, segundo uma pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo. Em Brasília, a média é de 10 ocorrências por dia. Somente neste ano, até o momento, 2.975 ocorrências foram registradas e 2.598 inquéritos instaurados. Cláudia Pereira Lima, 32 anos, cabeleleira, três filhos, é uma destas vítimas. No último dia 11, por um ato de ciúmes e pela bebedeira, o marido Paulo Ribeiro Lima tentou estrangulá-la. A história de Wesleyde Soares Rodrigues da Silva, 28 anos, foi ainda mais longe. Já no domingo, dia das Crianças, por volta das 20h, Alexandre Francisco da Silva atingiu a ex-mulher com um tiro no peito. Em seguida, tentou se matar com um tiro no ombro. Wesleyde não resistiu ao ferimento. Os dois eram casados há 10 anos e estavam separados há três meses. Eles têm um casal de filhos. O crime aconteceu na casa deles, em Ceilândia.



Em 2001, Wesleyde tinha registrado uma queixa por um puxão de cabelo que recebeu do marido. Mas, logo depois, retirou a ocorrência. Embora representem mais da metade da população brasileira, as mulheres sofrem com desigualdade de condições impostas por uma sociedade que ainda não conseguiu superar a cultura historicamente machista. As relações sociais e o sistema político, econômico e cultural imprimiram uma distinção entre os gêneros. Além disso, a violência doméstica e familiar contra a mulher é responsável por índices expressivos de falta ao trabalho, pelo crescimento da Aids entre a população feminina e pelo baixo aproveitamento escolar de crianças que a presenciam. Para 28% das mulheres agredidas, a violência doméstica é uma prática de repetição. Mais de 30% apontam o abuso físico dentro e fora de casa como o problema que mais preocupa a brasileira na atualidade e 75% consideram que as penas aplicadas em casos de agressão contra a mulher são irrelevantes. Outro fato grave é o abuso sexual de jovens. Estima-se que uma em cada três ou quatro meninas jovens é abusada sexualmente antes de completar 18 anos.


O Ministério da Justiça registra, anualmente, cerca de 50 mil casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. A delegada-chefe da Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM), na Asa Sul, em Brasília, Sandra Gomes Melo (40), é policial há 14 anos, trabalhou no Presídio Feminino de Brasília e está na DEAM desde fevereiro de 2007. Recebeu o título de cidadã honorária da capital pelo trabalho como delegada. Entre pilhas e mais pilhas de papéis, Sandra tenta despachar todas as ocorrências do dia. Os maiores registros acontecem aos fins de semana, no período da noite e pela manhã.


De acordo com a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), apenas em São Paulo, foram registradas no ano passado 257,3 mil ocorrências de violência. Estes números referem-se apenas aos casos concebidos nas delegacias de atendimento a mulher de São Paulo, sem contar com outros departamentos policiais estaduais. De 2002 a 2007, só em Pernambuco, cerca de 1,4 mil mulheres foram assassinadas, segundo pesquisa realizada pelo Fórum de Mulheres do estado. Em 2007, cerca de 50% dos agressores eram os companheiros das vítimas. Somente este ano, 60 mulheres foram assassinadas no estado, vítimas de violência doméstica.De acordo com Sandra, os registros na delegacia da mulher são bem mais demorados e a atenção é redobrada. Levam cerca de 2 horas, pois todos os detalhes da história precisam ser contados, como as ameaças, os xingamentos e os locais das lesões. Cerca de 90% dos casos são de violência doméstica. Na delegacia, trabalham quatro equipes que se revezam. Sempre há um delegado de plantão, quatro agentes e um escrivão. Os policiais são treinados e capacitados para orientar as mulheres, pois muitas chegam machucadas, desestruturadas, com baixa auto-estima. A delegacia existe desde 1987. É a única especializada em Brasília.


No momento em que a mulher registra a queixa, são oferecidas medidas preventivas, como o afastamento do agressor do lar, possibilidade de ficar na Casa Abrigo, entre outras. Primeiro, ela presta depoimento na delegacia, faz o registro de ocorrência, o inquérito é instaurado no dia seguinte, se não imediatamente, e encaminhado para o Judiciário, que analisa as declarações e intima o autor a depor. Em casos de lesões, a vítima é encaminhada ao Instituto Médico Legal (IML) e se precisar de atendimento médico, os hospitais públicos e privados, parceiros da delegacia, atendem. Quando há ameaças de morte e repetidas agressões pode-se determinar a prisão preventiva do agressor.


No entanto, segundo Sandra, nem sempre as vítimas querem os autores presos. “Em outras ocorrências, a vítima tem certeza que quer a prisão do autor. Já as mulheres agredidas, nem sempre desejam ver seu pai, marido ou filho na cadeia. Criam afeição e têm medo”, ressalta. Para a delegada, a violência é um fenômeno universal. “É ilusão achar que isso só acontece com as classes menos favorecidos. Há muitos casos de pessoas bem estruturadas. Este problema vem da cultura machista da sociedade brasileira. O preconceito contra a mulher é o ponto chave de todas as agressões. Existem casos de mulheres que passam mais de 20 anos em situação de violência e nunca registraram nada”, critica.


O fator essencial para o enfrentamento da violência contra a mulher, segundo Sandra, é mudar o pensamento das vítimas para incentivá-las a denunciar. Além disso, mais policiais capacitados, mais delegacias especializadas, maior eficiência do Judiciário e informação para as mulheres são outras medidas que devem ser tomadas pelo governo. Recursos escassos e gastos abaixo do ideal Não é somente com esses problemas que as mulheres convivem. Os recursos destinados em orçamento federal a políticas voltadas a esse público, no intuito de corrigir as desigualdades, também são insatisfatórios e a aplicação pior ainda. O principal programa de proteção às mulheres deixou a desejar no quesito gastos.


Segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), até o dia 8 de outubro, dos R$ 28,8 milhões autorizados no orçamento deste ano para o programa de “combate à violência contra as mulheres”, apenas R$ 12,4 milhões foram desembolsados, ou seja, 43% do total aprovado. Este valor inclui os “restos a pagar”, dívidas acumuladas em exercícios anteriores (veja tabela). Em relação a todos os 57 programas federais relacionados diretamente à mulher no Orçamento Geral da União de 2007, a execução, com o ano encerrado, foi um pouco melhor. Dos R$ 42,8 bilhões autorizados, R$ 32,9 bilhões foram efetivamente aplicados, ou seja, 77% do total aprovado, incluindo os restos a pagar (veja tabela). Para a diretora do Cfemea, entre os programas voltados para as mulheres, o de combate à violência deveria ter hoje prioridade absoluta. “A lei prevê medidas mais rigorosas àqueles que cometem o crime de violência doméstica, mas sua aplicação precisa ser acompanhada por uma política de enfrentamento efetiva”, explica.


Com as novas regras, as mulheres que são vítimas desse tipo de crime passaram a ter mais coragem de denunciar. Com o aumento das denúncias, muitas delegacias passaram a operar em situação limite pela falta de estrutura. “Precisamos de mais juizados e centros de referência especializados no tratamento de casos de violência doméstica, além de ações educativas e capacitação de servidores. Tudo isso está previsto nesse programa, o que falta é execução”, reclama. Como justificativa da baixa execução do orçamento, o sub-secretário de planejamento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), Rufino Correia, aponta várias dificuldades para a aplicação dos recursos, como o contingenciamento de verba e a falta de regularidade fiscal dos estados e municípios para cumprir os convênios firmados.



O antes e o depois da Lei A Lei Maria da Penha, que determina punições mais rígidas aos agressores e muda o trâmite das denúncias de violência doméstica, foi sancionada no dia 7 de agosto de 2006 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, as autoridades policiais são obrigadas a encaminhar as queixas para os juízes, no prazo de 48 horas, a fim de que sejam tomadas medidas para garantir a proteção da mulher agredida. Até a promulgação da lei, a violência doméstica não era considerada crime. Somente a lesão corporal recebia uma pena mais severa quando praticada em decorrência de relações domésticas. Agora, configuram no texto da lei as violências de caráter físico, psicológico, sexual, patrimonial e moral.O nome da lei é uma homenagem a uma vítima que se transformou em símbolo da luta contra violência doméstica. Em 1983, o marido de Maria da Penha Maia, o professor universitário Marco Antônio Herredia, tentou matá-la duas vezes.


Na primeira ocasião, deu um tiro e ela ficou paraplégica. Na segunda, tentou eletrocutá-la. Na época, ela tinha 38 anos e três filhas, entre seis e dois anos de idade.A investigação começou em junho do mesmo ano, mas a denúncia só foi apresentada ao Ministério Público Estadual em setembro de 1984. Oito anos depois, Herredia foi condenado a oito anos de prisão, mas usou de recursos jurídicos para protelar o cumprimento da pena. O caso chegou à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que acatou, pela primeira vez, a denúncia de um crime de violência doméstica. Herredia foi preso em 28 de outubro de 2002 e cumpriu dois anos de prisão. Após as tentativas de homicídio, Maria da Penha Maia começou a atuar em movimentos sociais contra violência e impunidade e hoje é coordenadora de Estudos, Pesquisas e Publicações da Associação de Parentes e Amigos de Vítimas de Violência (APAVV) no Ceará.


A aprovação da Lei Maria da Penha foi uma resposta às expectativas da sociedade. Segundo dados da Central de Atendimento à Mulher de Brasília, oito mil mulheres buscaram informações sobre a Lei e denunciaram maus tratos no período de janeiro a junho deste ano, um aumento de 107,9% em relação ao mesmo período de 2007.No Brasil, existem 407 Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs). No primeiro ano da lei, foram criados 47 Juizados ou Varas Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher pelos Tribunais de Justiça estaduais. Desses, 47% localizam-se no Sudeste.


O Nordeste criou apenas um juizado, em Pernambuco. As regiões Sul e Centro-Oeste foram as recordistas em números de solicitações de medidas de proteção para mulheres em situação de risco. Enquanto a média nacional ficou em 88, o Sul do país registrou 174 medidas e o Centro-Oeste, 194. Segundo a diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Guacira César de Oliveira, a aprovação da lei foi uma grande vitória. “Os impactos sociais e políticos na sociedade brasileira são evidentes. No Poder Público também. Mas os desafios ainda são enormes: a criação dos juizados, o acesso das mulheres aos serviços, o investimento de recursos dos Orçamentos Públicos dos Municípios, Estados e da União são alguns deles”, ressalta.Para a delegada Sandra, antes da lei, o maior problema era o arquivamento do processo. “Muitas registravam e depois cancelavam. È muito desgastante, pois você faz toda a instauração do inquérito, o atendimento a mulher, encaminha ao Judiciário, começa a investigação e tudo isso é arquivado. Com a lei, isso mudou muito, mas ainda existem casos de mulheres que não acompanham o trâmite dos processos. Antes da lei, os casos de ameaça eram os campeões, as lesões corporais em segundo lugar e os xingamentos em terceiro. Depois da lei, os casos de lesões corporais passaram para terceiro lugar”, explica.


Cecília Melo Especial para o Contas Abertas .

Um comentário:

necolima disse...

Mais uma porta aberta para a apropriação dos recursos publicos pelos grupos de pressão mais organizados e afoitos.
Se todos os programas antiviolencia existentes no Brasil dessem 10% do resultado que prometem, seriamos um paraiso na terra.
Na verdade, Sr. Terror, esses "Programas de combate à violencia contra a mulher" existem não para combater a violencia, mas existem para exi$tir, se é que me entende...
São mais uma chance de por algum no bolso, e ainda com a chancela de estar lutando por causa nobre.
Tal como as ONGs que defendem as crianças mas não querem que as crianças sejam retiradas das ruas....
A distorção que é feita nos dados estatisticos diz bem do carater dessas entidades.
A apropriação das funções publicas por quem não está legitimado para tal é mais uma consequencia desta "cooperação".
A existencia da Delegacia da mulher é outra manifestação dessa visão caolha ( mas que enxerga muito bem.....). Deveriam existir delegacias especializadas em violencia familiar ( pais/filhos; marido/mulher; mulher/marido; irmãos, etc...).

Sabias que o Ministro do Racismo ( não sei o nome do ministerio...) quer abrir delegacias especializadas em crimes contra negros?
Onde vamos parar???

Sugiro:
Delegacia de crimes contra alvi rubros;
Delegacia de crimes contra Barreirenses;
Delegacias de crimes contra advogados;
Delegacias de crimes contra aloprados...