quarta-feira, 12 de novembro de 2008

UM EXCELENTE TEXTO

Considerações agrícolas
Estou aborrecido com o surto de esquerdismo bobo de Azenha e Paulo Henrique Amorim. O Azenha inclusive colou uma curta e (como sempre) amarga entrevista de João Pedro Stédile, membro da direção nacional do Movimento dos Sem Terra (MST). Já andei escrevendo sobre agricultura aqui. Fui jornalista especializado em agricultura por muitos anos e aprendi um pouco sobre o segmento. Essas notícias encontram, em geral, um público urbano desinformado que as aceita acriticamente. É preciso entender, contudo, que o MST não representa a agricultura familiar no Brasil, e sim os sem-terra.

Quem representa a agricultura familiar no Brasil são os agricultores familiares e a Contag, a Confederação Nacional de Trabalhadores da Agricultura, e eles, por alguma razão, não gostam do MST. E por quê? Porque o MST tem uma ideologia estranha à mentalidade simples do pequeno agricultor. E não porque ele seja burro ou ignorante. Ele sabe muito bem o que pensam os líderes do MST, mas não concorda. Tem o direito, não tem? Ou o pequeno agricultor é obrigado a aprovar as diretrizes ideológicas do MST?

Stédile fala que a monocultura avança no Brasil. Não é verdade. Confiram, lá embaixo, a tabela atualizada em outubro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O parque agrícola nacional continua diversificado e continua se diversificando. A produção de trigo, café e castanha-do-caju, por exemplo, cresceram 41%, 28% e 101%, respectivamente, em 2008, em relação ao ano anterior.

Também registraram forte crescimento a produção de girassol, amendoim, mamona e guaraná. Todos esses produtos são cultivados, na maioria, por pequenos agricultores familiares.

Ocorre que Stédile e o MST são contra o agronegócio e tentam impor à opinião pública a sua visão radical. O agronegócio não é um mal à sociedade brasileira, e sim um dos principais sustentáculos do nível de emprego nas regiões agrícolas e um dos maiores contribuintes à balança comercial brasileira. Criminalizar o agronegócio é tão estúpido quanto criminalizar o MST. Grandes agricultores nada mais são que agricultores, só que grandes. Um grande agricultor não ganha mais que um advogado ou publicitário de relativo sucesso. Ele é grande porque é a única maneira de ganhar tanto dinheiro quanto um jornalista correspondente em Washington.

O agronegócio não concorre, no Brasil, com a agricultura familiar. São atividades complementares. De forma geral, a agricultura familiar concentra-se em produtos destinados ao consumo doméstico, enquanto o agronegócio comercial tem foco em produtos voltados para a exportação. Se o agronegócio avança pela Amazônia, trata-se de um movimento nocivo que deve ser estancado, mas não usado para atacar, moral ou politicamente, a honra de um triticultor do Rio Grande do Sul.

O Brasil tem potencial de continuar diversificando a sua produção agrícola. Temos, por exemplo, açaí, uma fruta de extraordinário valor nutritivo, produzida exclusivamente no Brasil, na Amazônia, sem que sua exploração afete em nada o ecossistema, já que suas árvores precisam estar rodeadas de floresta para se manterem produtivas e fortes.

Ao mesmo tempo, o agronegócio tem gerado muitas riquezas e oportunidades em todo país, fazendo explodir a nossa produção de maquinários e insumos agrícolas. Criticar irresponsavelmente o agronegócio é esquerdismo ingênuo e tosco. A visão preconceituosa da agricultura é o grande ponto-fraco da esquerda, o que a torna extremamente impopular nas regiões agrícolas, tanto onde impera o agronegócio quanto em áreas tradicionais de agricultura familiar. Em áreas muito pobres, a esquerda pode até fazer sucesso, mas em regiões onde a agricultura familiar é desenvolvida e gera condições econômicas favoráveis, como Sul de Minas, a esquerda encontra dificuldades.

Criticar o agronegócio é tão idiota quanto criticar uma fábrica. Se um homem pode ser dono de uma fábrica de sapatos, e a esquerda não critica isso, porque criticar o mesmo homem em investir numa plantação de soja?

Outro preconceito é subestimar o valor da soja e da cana-de-açúcar. A soja é um produto altamente protéico, usado principalmente como base para alimentar suínos, ovinos e caprinos, em todo mundo. A soja se transforma, portanto, em carne. No caso da cana-de-açúcar, temos a produção de açúcar e de etanol. O etanol representa, atualmente, a única alternativa viável de um combustível não poluente e renovável, que poderá ser produzido principalmente pelas nações mais pobres. Também acho ignorância criticar a importância do etanol.

Quanto à reforma agrária propriamente dita, entendo e me disponho a concordar que o governo não assentou o número de famílias prometido. Mas há fatores que explicam em parte isso. Primeiro: com a geração de emprego nas cidades, muitas famílias desistem da incerta vida agrícola, preferindo a estabilidade de um emprego no comércio ou indústria. É preciso admitir também que os assentamentos existentes vêm recebendo generosos recursos e apoio técnico para se consolidarem, e que a agricultura familiar, através do Pronaf e outras linhas de crédito, nunca foi tão cuidadosamente contemplada como agora. Os recursos para aquisição de máquinas, oferecidos pelo Banco do Brasil, permitiram um avanço fantástico na mecanização do pequeno agricultor. Nâo é por outra razão que o governo Lula tem obtido níveis de popularidade recorde entre as regiões com predomínio de agricultura familiar, ao mesmo tempo em que o MST continua fortemente impopular.

Não me agrada criticar o MST. Sempre defendi a entidade e sei muito bem de sua importância para a recuperação do discurso em prol da reforma agrária no país. Mas observo também, e não é de hoje, o enveredamento da entidade para caminhos ideológicos obscuros e passadistas, que não se coadunam ao destino democrático e republicano que os brasileiros perseguem, que a esquerda moderna e democrática persegue. Aconselho jornalistas e interessados em conhecer melhor a realidade agrária do país, a procurarem sindicatos rurais, cooperativas, associações de produtores, e a Contag. São entidades respeitáveis, com representatividade e capilaridade muito superiores ao do MST, e que reúnem principalmente pequenos produtores, cuja voz nunca é ouvida. A esquerda e os jornalistas esquerdistas apenas ouvem o MST. Por que? Por que Stédile sabe muito bem o discurso que seus interlocutores da esquerda radical urbana gosta de ouvir? Stédile não está se tornando repetitivo?

A agricultura brasileira vive um momento extremamente difícil, por causa da explosão dos preços dos fertilizantes. O Brasil tem um solo pobre, que precisa ser corrigido com muito fertilizante para se tornar produtivo. Os três principais nutrientes usados nas lavouras são o Nitrogênio, o Potássio e o Fósforo. Os três são fundamentais para qualquer cultivo. O maior problema é o Potássio, porque o país não tem reservas deste elemento e precisa importar mais de 90% do que usa. Também o fósforo e o nitrogênio são, na maior parte, importados.

O Brasil gasta, anualmente, quase 1 bilhão de dólares com a importação de potássio. Os agricultores têm sofrido muito com essa dependência. Muitos países subsidiam os fertilizantes para os agricultores. No Brasil, a situação é agravada pelo domínio de grandes empresas, que monopolizam parte do setor e elevam ainda mais os preços dos fertilizantes. Governo federal, Ministério Público e entidades têm trabalhado para quebrar esse monopólio. O governo, recentemente, com ajuda da Petrobrás, criou uma estatal para explorar uma reserva de fósforo na Amazônia, que poderá aumentar a auto-suficiência do país nesse segmento, e iniciou a produção, de forma mais sistemática, de nitrogênio para fertilizantes.

Em breve, o IBGE divulgará a Pesquisa Agrícola, um estudo muito abrangente e detalhado, feito somente de 10 em 10 anos, retratando fielmente a realidade fundiária nacional. Farei algumas observações por aqui.

Abaixo a tabela da qual falei acima, com a produção agrícola brasileira conforme atualização recente do IBGE, com a safra 2008 e 2007, com volume produzido e área plantada.
Veja aqui a tabela a que Miguel do Rosário se refere: www.oleododiabo.blogspot.com

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