Publicada em:31/05/2009
Berna (Suiça) - Estou com Mino Carta quando, se tornando exceção na imprensa brasileira, elogia o nosso “sapão barbudo”, mas lamento que, depois de observar um retiro infelizmente não inspirador, tenha voltado a bater na mesma tecla e a malhar o italiano Cesare Battisti, ainda preso apesar de uma decisão do ministro da Justiça.
Não vou ser tão contundente quanto o ex-preso político Celso Lungaretti, mas comparar Battisti com Bin Ladin é um tanto excessivo e não sei se fazer dupla com Walter Maierovitch é coisa recomendável para alguém com o passado de Mino.
Até hoje não entendi porque a Carta Capital se lançou numa cruzada, ombro a ombro com a imprensa golpista dos anos de chumbo, contra Battisti e, pior de tudo, tornando-se cúmplice da Itália de hoje, onde um primeiro-ministro fanfarrão anda de braço dado com fascistas e neofascistas.
Por que tanto empenho de Mino em querer oferecer à Itália de Berlusconi a cabeça de Battisti ? Simples afinidade italiana ? Não acredito, porque felizmente a Itália não são só as milícias ressurgidas que caçam hoje imigrantes nas ruas, revivendo pouco a pouco o pesadelo dos anos 30 e a era mussoliniana, mas na Itália existem ainda pessoas como o cineasta Nanni Moretti e o escritor Antonio Tabucchi.
Nanni Moretti faz frente, há muito tempo, ao dono da mídia italiana e seu filme O Caimão é a história do antigo tocador de cabaré que virou crooner italiano, cujo machismo, gafes e desrespeitos dão Ibope numa Itália num acesso de nostalgia ao tempo das camisas negras, mas do qual logo acordará suando com a atual crise. A hora da verdade parece ter vindo com a ex-menor Noemi, razão do pedido de divórcio da ex-miss, esposa do fanfarrão, que pensava tudo lhe ser permitido, esquecendo-se de que o Vaticano próximo é o guardião da moral de fachada italiana.
Mas não vamos pegar o caminho do sensacionalismo people, do quem comeu quem e se podia comer por ser menor. Vamos ficar no político. No apoio de Berlusconi ao fascista do norte, Humberto Bosi, e ao outro fascista da capital romana, Gianni Alemanno, seu novo prefeito que derrotou o candidato da esquerda Walter Veltroni.
Na euforia da vitória de Veltroni, enquanto o povo gritava vivas ao novo Duce (em homenagem a Mussolini) e reproduzia a saudação fascista, ligeiramente diferente da dos nazistas, o novo Cesar da televisão italiana que controla o país, dizia – Nós somos a nova Falange!
Para quem não sabe, a Falange era o partido fascista espanhol de Franco, que mergulhou a Espanha numa longa ditadura quase em parceria com a ditadura de Salazar. Que bela companhia para os que hoje tanto se empenham numa condenação de Cesare Battisti.
E é essa gente que tem feito pressão sobre o Brasil, que tem atacado e tentado desmoralizar nosso ministro da Justiça Tarso Genro, e que espera uma decisão do presidente do STF, Gilmar Mendes, autorizando a extradição de Battisti, no intuito de provocar uma crise institucional dentro do Brasil.
O escritor Antonio Tabucchi, um especialista em Fernando Pessoa que fala o português, está sendo processado pelo presidente da Camara italiana dos Deputados por ter denunciado “a inquietante corrupção das regras democráticas” e por ter defendido um jornalista do L´Unita, Marco Travaglio, também processado por ter ousado ser contra o regime Berlusconi. Tabucchi não é um novato na defesa do Estado de direito e da liberdade democrática. É dele um excelente livro, transformado em filme com Marcelo Mastroiani, no papel principal – Pereira Pretende, cuja ação se desenvolve no clima do salazarismo português.
Que Mino Carta e sua revista abandonem os textos tendenciosos e indignos de Walter Maierovitch contra Battisti, que poderão levá-los à uma aparente cumplicidade com a Itália de Berlusconi. Com que direito o governo de Berlusconi se nega a receber o credenciamento do novo embaixador brasileiro em Roma, querendo fazer afronta ao ministro Genro, a pretexto de aguardar o julgamento do STF ?
É hora de deputados, senadores e juízes do Supremo dizerem Basta a essas pressões à nossa soberania, por um governo fanfarrão e saudosista dos tempos do fascismo. Vamos escolher a Itália de Dante, de Nanni Moretti e de Antonio Tabucchi.
Rui Martins, Direto da Redação.
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