quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Na contramão do PIG

02/09/2009

Imprensa estrangeira, ao contrário da brasileira, destaca papel estratégico do pré-sal

Ao contrário da maior parte da mídia brasileira, que atribuiu um viés estatizante nas regras do pré-sal enviadas ao Congresso pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a imprensa estrangeira enfatizou a importância das mudanças para garantir a independência do País e a implementação de ações de combate à pobreza.

O jornal britânico The Guardian relata em sua reportagem desta terça-feira (1º) que Lula “prometeu injetar bilhões de petrodólares na guerra contra a pobreza após as maiores descobertas de petróleo da década”. E acrescenta que a nova legislação permitirá que os lucros sejam usados para “cuidar” da educação e da pobreza de uma vez por todas”.

O The Guardian comenta que a descoberta dos novos campos de petróleo a partir de novembro de 2007 levaram o Brasil a suspender os leilões de concessão de novos blocos para a exploração de petróleo “para dar ao governo uma parcela maior dos lucros”. Ao mesmo tempo, afirma que as companhias petrolíferas do mundo reagiram de forma “nervosa” ao anúncio do marco regulatório.

O Wall Street Journal realçou as promessas de riqueza e desenvolvimento feitas por Lula, mas afirma que o País terá que superar as dificuldades encontradas por gerações de governantes sul-americanos: “transformar a riqueza de vastos recursos naturais em uma máquina de desenvolvimento”. “O Brasil, com alguns dos maiores estoques do mundo de minério de ferro e prata, tem uma das maiores diferenças entre os ricos e os pobres”, diz a reportagem.

Já o The New York Times enfatizou a “mudança nacionalista” do País, que fortalece a atuação estatal da Petrobras na exploração da camada. “O governo brasileiro propôs mudanças às leis existentes na segunda-feira para dar o papel principal no desenvolvimento das reservas-chave de petróleo em águas profundas para a gigante estatal da energia, a Petrobras, em detrimento das rivais estrangeiras”, observa o diário.

“O novo marco regulatório do País representa uma virada nacionalista para o Brasil”, diz a reportagem, que comenta que os campos descobertos nos últimos dois anos podem transformar o Brasil em uma grande potência mundial de energia.

Para o deputado Fernando Ferro (PT-PE), a imprensa estrangeira tem tratado o pré-sal com muito mais serenidade que a brasileira. “Os estrangeiros têm destacado a importância do pré-sal para o Brasil e a indústria petrolífera mundial, comemorando a conquista, ao contrário de setores da mídia nacional, que tratam o assunto de forma equivocada e distorcida”.

Ferro questiona a midia brasileira por qualificar a proposta do novo marco regulatório como estatista e nacionalista, numa cobertura com viés superado. “Essa mesma imprensa esquece que o governo dos EUA, a meca do capitalismo, comprou a General Motors e metade do Citybank”. Ele frisou que o novo marco garante a soberania e os interesses nacionais e assegura recursos para combater a pobreza, melhorar a educação e aprimorar a ciência, tecnologia. “Tudo sem romper com os contratos vigentes até agora”.

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Um comentário:

Anônimo disse...

Tática inescrupulosa

O Estado de S. Paulo - 03/09/2009

Os ataques à oposição que deram um tom eleitoreiro ao anúncio das propostas do governo para o pré-sal devem tornar-se tema permanente das manifestações do presidente Lula. Apenas um dia depois do evento, ele deixou claro que pretende, além disso, martelar a versão de que os críticos da nova política de petróleo são inimigos do progresso nacional - agem contra "o povo brasileiro". O golpe é típico dos autoritários de todos os matizes e representa a forma mais vil de desqualificação do dissenso em relação às decisões dos detentores do poder. É uma incitação ao linchamento político dos que destoam da linha oficial. Destina-se, no caso, a impedir qualquer debate substantivo sobre as regras para o pré-sal e a semear no eleitorado uma atitude de hostilidade, quando não de repulsa, aos adversários do esquema de perpetuação do lulismo no Planalto.

Com essa tática inescrupulosa, o presidente quer fazer das eleições de 2010 uma disputa não entre concepções distintas do que seja o interesse público e as alternativas para atendê-lo, mas entre patriotas e antipatriotas - ou, como se dizia em outros tempos, nacionalistas e entreguistas. "Lula inventa espantalhos e os espanca", diz o senador Sérgio Guerra, do PSDB. O primeiro pretexto para isso é a recusa oposicionista de aceitar mansamente o verdadeiro rito sumário com que Lula quer ver aprovados os quatro projetos do marco regulatório do pré-sal. A tramitação da matéria no chamado regime de urgência constitucional deixa ao Congresso não mais de 90 dias (45 em cada uma de suas Casas) para votar o pacote, sob pena de bloqueio das respectivas pautas de deliberações. O procedimento também estreita a margem para apresentação de emendas às propostas.

A conduta do presidente a respeito é simplesmente cínica. Na véspera da divulgação dos projetos, pareceu aceder ao pedido do governador paulista José Serra para que desistisse da urgência. O argumento incontestável é que o governo teve o tempo que quis - a rigor, quase dois anos, a contar da descoberta das jazidas - para tomar as suas decisões, em debates a portas fechadas, e um assunto dessa envergadura não pode ser liquidado, em seguida, a toque de caixa. No dia seguinte, Lula manteve a urgência, mas fez de conta que a responsabilidade não era dele: atribuiu a insistência aos líderes dos partidos da base governista e ministros que integram o seu conselho político. Depois, a uma pergunta sobre o assunto, reincidiu no cinismo, beirando o escárnio, ao indagar, retoricamente: "Quem sou eu, um humilde presidente, para ter qualquer interferência (na tramitação das proposições)?"

A farsa durou um átimo. O mesmo humilde presidente que disse que "agora a bola é do Congresso, a vez é deles", logo aproveitou para jogar a sociedade contra a oposição. Com a esperta ressalva de que ele próprio tinha sido oposicionista por muito tempo - portanto, falava com conhecimento de causa -, teorizou: "Quem é oposição está sempre achando que as coisas não devem dar certo, que as coisas devem demorar, porque acham que, se não acontecer, quem perde é o governo." E deu a canelada: "Eu acho que, se não acontecer, quem perde é o povo brasileiro." Na realidade, o conteúdo dos projetos - que representam uma guinada radical rumo ao estatismo e conferem superpoderes à Petrobrás -, a pressa de tê-los aprovados e o calendário eleitoral são indissociáveis. O "bilhete premiado" do pré-sal não começará a ser resgatado antes de meados da próxima década, mas a sucessão de que Lula se ocupa obsessivamente é no ano que vem.