Por Breno Altman
Com a criação de uma nova sigla, Mobilização Democrática (MD), encerra-se a história do Partido Popular Socialista, capitaneado pelo deputado Roberto Freire. A fusão com o Partido da Mobilização Nacional, que deu cabo à agremiação, foi engendrada para viabilizar atração de parlamentares sem quebrar formalmente regras de fidelidade partidária, arrastando tempo de televisão e nacos do fundo público para financiamento dos partidos.
A legenda recém-batizada tem objetivo encomendado, segundo declarações do próprio Freire: servir de trampolim para a candidatura presidencial de Eduardo Campos, governador de Pernambuco, entre correntes tradicionalmente vinculadas à coalizão PSDB-DEM. O plano é conquistar deputados e senadores deste setor, além de pescar nas turvas águas do PSD de Kassab. De quebra, o grande sonho de seus dirigentes é filiar o tucano José Serra, a mão que balança o berço do projeto.
Esta manobra eleitoral, tão ao gosto atual da mídia tradicional, diz muito a respeito de seus inventores. O PPS, nascido de um naco do Partido Comunista Brasileiro (PCB), na pia batismal já abandonou qualquer compromisso com o socialismo, apesar de carregar essa intenção no nome. Apoiou Lula em 2002, mas rapidamente se converteu em sócio do bloco de direita. Quando começou a namorar o PMN, houve quem sugerisse que a criatura parida chamasse Esquerda Democrática, ideia logo abandonada para não soar ridícula.
A turma de Roberto Freire, afinal, com poucas e honrosas exceções, fez história de capitulação em capitulação. Os mais antigos, em sua maioria, eram comunistas meio róseos durante a ditadura, entocados depois da derrota de 1964. Quando os trabalhadores voltaram a ser protagonistas da vida política, a partir dos anos 70, não vacilavam em afirmar que aquilo era aventura.
Essa mesma patota ficou contra a greve geral do dia 21 de julho de 1983, a primeira depois do golpe militar. Um de seus comandantes, o falecido Hércules Correa, ex-líder sindical, chegou a declarar que trabalharia “full-time” para impedir a empreitada, no que fracassou de forma retumbante, pois São Paulo parou.
Também ficaram contra a campanha das diretas-já. Quando milhões começaram a se concentrar em gigantescos comícios, aderiram andando de lado. Na primeira oportunidade, se juntaram à transição conservadora, carimbada pela eleição da chapa Tancredo-Sarney no colégio eleitoral forjado pelos militares.
Deram seu voto para Lula, no segundo turno de 1989. Mas aí veio o colapso do socialismo europeu e a desintegração da União Soviética, e foi o Deus-nos-acuda. Açodados por sobreviverem, mudaram de lado a galope. Abandonaram o socialismo, a esquerda e a compostura. Passaram os últimos dez anos de braços dados com os brucutus do neoliberalismo, em selvagem oposição aos governos de Lula e Dilma.
Sequiosos por serem considerados membros dignos do clube conservador, entregaram os dedos até em política internacional. O PPS não pestanejou, por exemplo, em dar seu apoio, nas duas últimas eleições presidenciais venezuelanas, ao fascistóide Henrique Capriles, além de apoiar golpes em Honduras e no Paraguai.
Reencarnado como MD, o partido de Roberto Freire presta-se a ser, mais uma vez, linha auxiliar da oligarquia. A autópsia do cadáver revela, assim, um dos capítulos mais vergonhosos da recente história brasileira.
Breno Altman é jornalista e diretor editorial do site Opera Mundi e da revista Samuel
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