quinta-feira, 6 de novembro de 2008

ELEIÇÃO DE OBAMA APROXIMA EUA DO BRASIL


"Ascenção de Obama à presidência dos Estados Unidos abrirá espaço para o Brasil ingressar no Conselho de Segurança da ONU, analisa a professora Maria do Socorro Braga

Daniel Milazzo e Diego Salmen


A vitória do candidato democrata Barack Obama na disputa pela Casa Branca abrirá espaço para que o Brasil ingresse no Conselho de Segurança da ONU. Essa é a avaliação da cientista política Maria do Socorro Braga, da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).

- Provavelmente haverá maior integração entre Brasil e Estados Unidos, não só econômica. Também vai haver maior abertura para o Brasil entrar no Conselho de Segurança da ONU e todos esses órgãos multilaterais.

Antigo desejo da diplomacia brasileira, a conquista de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança daria ao país poder de decisão na geopolítica mundial. Para a professora, essa brecha, no entanto, não significa que Obama fará os Estados Unidos abrirem mão de sua hegemonia.

- Obama e os democratas, em específico, tem uma capacidade de diálogo. É muito mais multilateral, e quando se é assim, a tendência é haver diálogo para se chegar ao consenso. Mas é um consenso no dissenso, porque trata-se de uma potência que vai brigar para continuar sendo uma potência.

Em entrevista a Terra Magazine, Maria do Socorro diz que a figura de Obama tem características "utópicas", que ajudaram a mobilizar o eleitorado norte-americano nestas eleições.

- Ser negro, jovem, de uma outra geração que não é aquela que passou por uma série de problemas históricos... Não é à toa a presença tão grande do eleitor, já que lá o voto não é obrigatório, não há feriado (para votar)... As pessoas se mobilizaram, querem mudança.

Confira a seguir a íntegra da entrevista:

Terra Magazine - A eleição de Obama é a melhor saída para os Estados Unidos nesse momento?


Maria do Socorro - Entre as opções oferecidas ao eleitor, essa (a vitória de Obama) era a melhor. Primeiro porque tinha de ser um quadro democrata, levando em conta as complicações causadas por oito anos de governo Bush e dos republicanos, seja na política externa ou na interna, com os problemas econômicos. Não é à toa a presença tão grande do eleitor, já que lá o voto não é obrigatório, não há feriado (para votar)... As pessoas se mobilizaram, querem mudança. E é claro que tem características utópicas do lado democrata. Ser negro, jovem, de uma outra geração que não é àquela que passou por uma série de problemas históricos...

Quais as perspectivas geradas pela eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos?


O fato de ser um presidente negro é muito importante, ainda mais pelo histórico da questão racial nos Estados Unidos. A segregação lá sempre foi muito forte, e ainda é um elemento muito forte na cultura americana. Com certeza a eleição de Obama traz novos elementos à política americana. Ou então (a questão) da mudança, o que se aproxima do caso daqui. Vai trazer muitos reflexos. Mas obviamente a cobrança vai ser muito grande. O discurso da vitória dele traz a idéia da mudança, mas mostra que ele também está pegando o país num momento muito complicado e com várias dificuldades econômicas.

A senhora acha que Obama irá priorizar a solução da crise?


É isso mesmo. Eles vão ter que fazer medidas internas para conseguir de alguma forma administrar a crise. Penso que eles tentarão, de alguma forma, reduzir as conseqüências internas dessa crise, e para isso vão ter que direcionar vários fundamentos econômicos para reduzir esse déficit. E vão ter de dar conta também de problemas relacionados à idéia de que, por exemplo, o Estado vai ter que interferir mais no mercado. Essa crise na verdade é uma rejeição muito grande a essa ideologia neoliberal. Então eu imagino que ele vá fazer algo no sentido de controlar o mercado, obviamente com os fundamentos necessários para que ele mantenha essa relação comum (com os agentes privados). E tem a preocupação com as políticas sociais.

Uma das críticas feitas pelo candidato John McCain dizia que Obama era favorável ao aumento de impostos para a população. A senhora acha que isso é uma forma de o Estado intervir mais na economia e recuperar o espaço perdido?


Eu acho que é por aí mesmo. Qual a idéia dos republicanos? A idéia do Estado mínimo, e é para isso que eles reduzem os impostos. Em relação aos democratas, é justamente isso: aumento de impostos para que o Estado invista mais e aumente sua participação em diversos setores, para que a sociedade tenha pelo menos um bem-estar, o wellfare state mesmo. Uma coisa meio social-democrata, que é algo que deixa muitos setores da economia norte-americana amedrontados. Por isso McCain insistiu em associar Obama ao socialismo no final da campanha. (...) Tem proximidades. No sentido de querer um Estado com maior distribuição de renda, direitos, serviços sociais.

A eleição de Obama pode facilitar uma aproximação dos Estados Unidos com a América Latina?


Vai aproximar, mas eu penso que Obama e os democratas, em específico, tem uma capacidade de diálogo. Eles não têm uma visão belicista. Nesse sentido, é muito mais multilateral, e quando se é assim, a tendência é haver diálogo para se chegar ao consenso. Mas é um consenso no dissenso, porque trata-se de uma potência que vai brigar para continuar sendo uma potência. Essa idéia do dissenso é a de que as relações entre esses países são assimétricas: um vai querer prevalecer sobre o outro, e os Estados Unidos não vão querer receber menos. Eles vão sempre querer receber alguma coisa aqui na América Latina, só que eles sempre receberam uma fatia maior nesse discurso. A gente não pode perder de vista que eles são uma potência, e que, mesmo em meio à crise, eles não vão se submeter a um país, ainda mais latino-americano. Quando se pensa nas relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos, por exemplo, o democrata é muito mais protecionista.

Economicamente é pior para o Brasil?


Nesse sentido sim, porque eles defendem que as alíquotas, principalmente em relação aos biocombustíveis... Eles são muito mais protecionistas, de forma a priorizar os recursos e a idéia de você proteger os setores internos, ainda mais numa crise como essa.

Fora o aspecto econômico, o que a eleição de Obama muda para o Brasil?


Além disso, é essa questão do diálogo, não só com o Brasil, mas com todos os países periféricos. Provavelmente vai haver maior integração entre Brasil e Estados Unidos, não só econômica. Em relação às questões culturais... e por ele ser quem ele é... o próprio presidente Lula "votou" no Obama. Também vai haver maior abertura para o Brasil entrar no Conselho de Segurança da ONU e todos esses órgãos multilaterais".



Terra Magazine

Nenhum comentário: