sábado, 18 de abril de 2009

Ausente, Cuba rouba cena no primeiro dia de Cúpula das Américas




18/04/2009

O tema do livre comércio regional, que deu origem há 15 anos às Cúpulas da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), ficou de fora das discussões da reunião de Trinidad e Tobago. As discussões do encontro concentraram-se em torno das relações políticas entre Estados Unidos e seus países latino-americanos, abaladas durante a Era Bush, e a inclusão de Cuba no debate político.

As referências à conformação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) ficaram de fora do projeto de declaração que deve ser assinado neste domingo ao término da cúpula entre chefes de Estado e de Governo de 34 países. Os líderes latino-americanos criticaram a falta de referências à Cuba na declaração e se mostraram indignados pelo fato de o país não participar da cúpula.

O presidente dos EUA, Barack Obama, que assiste pela primeira vez uma reunião com seus vizinhos, também não enfatizou os temas comerciais em sua intervenção. Obama parece ter posto de lado a iniciativa de recuperar o discurso em favor da integração comercial e foca agora suas baterias para a cooperação, para a segurança energética.

O líder norte-americano reiterou hoje a com a América Latina. "Tenho muito a aprender e muita vontade de escutar".

No encontro Obama e o presidente venezuelano Hugo Chávez trocaram palmadas nas costas e apertaram as mãos quando, após o discurso do presidente americano, o venezuelano se levantou do extremo da mesa onde estava sentado e deu ao governante dos EUA um exemplar do livro "As Veias Abertas da América Latina", do uruguaio Eduardo Galeano, expoente da esquerda latino-americana.

"Pensei que era um livro do próprio Chávez. Estava a ponto de dar a ele um dos meus", afirmou Obama aos jornalistas depois da reunião, demonstrando sua surpresa com o presente. Obama é autor de dois livros, escritos antes de sua chegada à Casa Branca: "Dreams From my Father", uma autobiografia escrita aos 34 anos, e o volume de ensaios "The Audacity of Hope".

Um alto funcionário do Governo norte-americano não quis confirmar se Obama deve ler o livro que, de forma cronológica e por meio de relatos curtos, fala dos abusos cometidos pelos colonizadores europeus e dos saques que a América Latina e o Caribe sofreram ao longo dos séculos. "O presidente é um homem que lê muito, mas não sei quais serão suas prioridades em sua lista de leituras pendentes", disse o funcionário.

"Estou certo de que o presidente Obama, como eu, não tem problemas para apertar as mãos, e agradeço seu gesto de se aproximar para me cumprimentar...", destacou Chávez ao estimar que ao contrário do ex-presidente George W. Bush, Obama "é um homem inteligente, jovem e negro", e um "político de experiência, apesar de sua juventude".


Relação Cuba x EUA


Apesar do clima ameno, Chávez insistiu em falar de uma tema delicado para os EUA: Cuba. "Para a próxima cúpula, vou propor uma travessura: por que não a fazemos em Havana", brincou, entre aplausos dos participantes na primeira reunião plenária da Unasul.

A era Bush foi nefasta para as relações entre a América Latina e os EUA. A 5ª Cúpula das Américas que começou nesta sexta-feira (17) em Trinidad e Tobago é a mais importante desde 1994, quando o ex-presidente Bill Clinton lançou a ideia do Acordo de Livre Comércio das Américas (Alca) com o objetivo de reduzir drasticamente a pobreza

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Em breves declarações à imprensa, o venezuelano disse ainda que Obama é um "homem inteligente" e que quer virar "amigo" dele. Consultado se considera que as desgastadas relações diplomáticas ente as nações melhoraram, Chávez disse: "não tenho a menor dúvida".

Chávez também se reuniu com secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, para discutir uma possível normalização das relações diplomáticas entre os dois países. Segundo ele, foi discutida com Hillary a possibilidade de nomear novos embaixadores em ambas as nações. Em setembro de 2008, o venezuelano expulsou do país o representante de Washington, Patrick Duddy. Além disso, retirou da capital norte-americana o seu diplomata, Bernardo Alvarez.

Já o presidente da Bolívia, Evo Morales, disse hoje que Obama, "tem a obrigação de reparar um dano econômico e político a Cuba", e pediu que a 5ª Cúpula das Américas seja a última realizada sem Havana. "Talvez seja difícil para Obama, mas ele tem a obrigação de reparar um dano econômico e um dano político a Cuba", explicou. "Como se pode debater se falta um país como Cuba?", questionou, antes de acrescentar: "Se queremos discutir os temas econômicos do continente, temos que estar todos unidos".

"Queria, no tema Cuba, ser Obama, porque Cuba tem o apoio de todo o mundo menos de dois países, Israel e Estados Unidos, e como Cuba tem o apoio de todo o mundo, se eu fosse Obama levantaria o bloqueio e teria o apoio de todo o mundo", considerou Morales.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, e o governante do Uruguai, Tabaré Vázquez, endossaram o pedido do líder boliviano."O presidente Obama ficou de estudar o assunto", disse o líder uruguaio aos jornalistas.

Para o chanceler brasileiro, "o grande teste era um avanço em relação a Cuba". "Acho que foi dado um passo pequeno na direção certa. Eu acho que, agora, em vez de estar discutindo os próximos passos, o que tem que haver é um diálogo direto", afirmou Amorim em entrevista coletiva.

Robert Gibbs, porta-voz da Casa Branca, disse hoje que possibilidade de melhoria das relações entre EUA e Cuba depende de Havana. "As ações são sempre mais significativas que as palavras, sem importar a extensão dos discursos. Continuaremos avaliando e observando o que acontece. Estamos ansiosos para ver o que o governo cubano tem vontade de fazer", afirmou Gibbs, que acompanha o presidente Barack Obama na Cúpula da Unasul.

Futuro de EUA e América Latina


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recomendou neste sábado que Obama promova uma visita da secretária de Estado Hillary Clinton à Bolívia e à Venezuela para buscar uma melhora mais rápida nas deterioradas relações de Washington com os dois países.


Kirchner, por sua vez, disse que os governantes aproveitaram o encontro desta manhã com o presidente dos EUA para reclamar da ingerência exercida por representantes de Washington nas políticas da região. "Falamos [com Obama] sobre a ingerência de alguns funcionários norte-americanos nas políticas dos países", disse a mandatária.

Já o presidente do Peru, Alan García, disse hoje que espera um "estreitamento" das relações entre os Estados Unidos e a América do Sul. "Não viemos [à reunião com Obama] com uma atitude de reclamo ou de mendicância", prosseguiu. "Viemos para falar sobre nossas economias e para fazer os Estados Unidos entenderem que somos parceiros de grande importância."

"Há nos Estados Unidos 45 milhões de latinos, muitos deles trabalhadores", ressaltou. "Essa gente é uma força fundamental para ajudar a solucionar a crise", disse García. "Somos um mercado mais importante que o da China, tanto em relação ao consumo quanto à produção per capita. Por isso, os Estados Unidos devem mudar sua lógica" afirmou.

Michelle Bachelet, a presidente do Chile, que também exerce a presidência temporária da Unasul, indicou que o encontro de hoje representou "o primeiro passo para a construção da confiança e para alterar as relações entre Estados Unidos e América do Sul".

A mandatária afirmou que houve um diálogo muito franco, em que os governantes sul-americanos escutaram as palavras de Obama e aceitaram sua disposição de "promover uma relação de respeito mútuo e a construção de uma agenda concreta, que permita satisfazer nossas necessidades".

UOL, Com as agências internacionais

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