quarta-feira, 23 de maio de 2012

Teoria dos dois demônios

É isso aí, foi dada a partida para o Brasil realmente virar uma página infeliz da nossa história, parodiando Chico Buarque de Holanda. Os brasileiros com um mínimo de consciência assinam embaixo do que escreveram Urariano e o Mair neste espaço do DR sobre a Comissão da Verdade.


Claro que há algumas observações a fazer, uma delas a nomeação de Gilson Dipp, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, o mesmo que defendeu o Estado brasileiro na Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que condenou o Brasil com a exigência de as autoridades localizarem os restos dos combatentes da guerrilha do Araguaia assassinados por militares quando estavam fora de combate. A Comissão recomendou também a revisão da Lei da Anistia.


Como Dipp já advogou contra ós familiares de vítimas da guerrilha do Araguaia na OEA, cabe a pergunta se ele terá isenção nos trabalhos da Comissão da Verdade.


Nenhuma Comissão da Verdade em qualquer parte do mundo teve caráter punitivo. Não é esta a função dela. Fica, portanto, no mínimo estranho que a todo momento integrantes da Comissão, principalmente o Ministro Dipp, destaquem a vigência da Lei da Anistia de 1979.


Se a opinião pública pressionar, nada impede de o Ministério Público apresentar denúncia contra os agentes do Estado ainda vivos que torturaram e mataram presos políticos.


No meio do avanço, apesar de alguns pesares, que representa a Comissão da Verdade surgem setores advogando a chamada “teoria dos dois demônios” querendo igualar os que combateram a ditadura, geralmente jovens com armas na mão ou não, e os crimes perpetrados pelo regime ditatorial através de agentes do Estado, civis e militares.


Há quase 30 anos na Argentina, no Uruguai e mais recentemente no Chile, quando da instalação de Comissões da Verdade, surgiram os defensores da tal teoria, mas suas observações não colaram.


Na verdade, consciente ou inconsciente, os propugnadores da teoria dos dois demônios objetivam na prática evitar que a verdade, ainda não conhecida, apareça. Tentam imobilizar a busca da verdade.


Não adianta figuras como, por exemplo Boris "Meu Passado Me Condena e Envergonha" Casoy espernear enfatizando a teoria dos dois demônios. Até porque, o lado de quem combateu foi já investigado a fundo durante a ditadura mesmo.


Os que levantam a tese, sejam eles civis ou militares, foram apoiadores da ditadura e colheram a informação, muitas vezes na base da tortura, divulgada anos a fio sem praticamente direito de defesa. Não teria sentido que depois de tudo isso fossem novamente investigados, como querem os que na época das atrocidades ou apoiavam ou silenciavam. A Comissão da Verdade investigará a prática de terrorismo do Estado.


Os militares da reserva que tiveram postos de comando durante a ditadura ou que participaram da comunidade de informações, torturando e matando, estão se portando mal e tentando de todas as formas envolver as Forças Armadas na defesa de quem tem culpa no cartório e ainda está vivo.


Na Argentina, no Chile, no Uruguai não foram as comissões da verdade que levaram civis e militares a julgamentos e condenações, mas sim a pressão da sociedade e vontade política do Estado.


No Chile, vale sempre repetir, tudo está sendo feito mesmo seguindo em vigor a Lei da Anistia promulgada em acordo na transição da ditadura para a democracia com o objetivo de manter impunes agentes do Estado torturadores e assassinos.


Por estas e muitas outras são descabidas as manifestações de associados do Clube Naval e Militar no sentido de criarem uma comissão da verdade paralela a que está em funcionamento e terá dois anos para concluir os trabalhos.


Em suma: o Brasil está maduro e quer conhecer o passado, sobretudo os familiares de vítimas da ditadura que ainda nem puderam enterrar seus entes queridos.

Nesse sentido, o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, está a dever um esclarecimenteo. Ele convocou familiares de vítimas da ditadura citados no livro Memórias da Guerra Suja.


Segundo informa Romildo Maranhão, irmão de desaparecido Ramires Maranhão, o Ministério pediu a conta bancária, cpf, o informe sobre o horário da passagem e de uma hora para outra a reunuão foi suspensa. O que aconteceu então?


Quanto a CPI mista do Carlos Cachoeira de lama, o negócio caminha para a lama. Estão blindando a revista Veja, que foi pautada vergonhosamente pelo Cachoeira, conforme escancarou a TV Record. De quebra, os governadores Agnelo Queiroz (PT), Sergio Cabral (PMDB) e Marconi Perillo (PSDB) também estão sendo contemplados .


Alega-se que não há evidências para convocar os mencionados neste momento. Não há? E Cabral participando da gan dos guardanapos em Paris com o chefão da Delta?


Pois bem, aguarda-se então outro momento apra os depoimentos. Mas pelo andar da carruagem, sabe-se lá quando surgirá o outro momento.


“Você é nosso e nós somos teu”, foi o que o deputado Cândido Vacarezza disse a Sergio Cabral em relação à proteção na CPI que o PT está fornecendo ao Governador do Estado do Rio de |Janeiro e foi constatado pelo jornalismo do SBT.


Se a CPI continuar nesse diapasão, pode-se imaginar como será a conclusão dos trabalhos. Vai dar em pizza com sabor de lama e a opinião pública exigirá ser consumida pelos integrantes.

Mário Augusto JakobskindÉ correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE Direto da Redação


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