A morte de Hugo Chávez recebeu registro quase unânime da mídia brasileira. Unanimidade criada pela animosidade ao presidente venezuelano que entrou agora na história. Embutido nas entrelinhas brotou um sentimento de alegria pelo fim do líder político que, a partir da Venezuela, abriu no continente o conflito entre governos progressistas e os grupos jornalísticos conservadores, que, articulados, estão em guerra contra a democratização da informação.
“Nada muda sem choque.” Com essa frase, Chávez alertou para o problema, em entrevista a CartaCapital, realizada na embaixada venezuelana, em Brasília, em 2006. É impossível evitar confrontos quando se pensa em mudanças. E o confronto proposto por Chávez, repetido na Argentina e no Equador, tinha apenas começado. Ele acreditava que Lula, -Kirchner e Evo Morales, entre outros que viriam, formavam “uma corrente”. O embate com a mídia está adormecido, porém, na maioria dos países latino-americanos.
Vai despertar, no entanto, ora acolá, ora aqui no Brasil. Nas entranhas do governo Lula, nasceu uma proposta de regulamentação dos meios de comunicação. Ela foi, e ainda é, bombardeada pela mídia – que se movimenta entre o conservadorismo e o reacionarismo – sob o pretexto de evitar intenções de amordaçamento dos meios de comunicação.
Pura vilania. O objetivo da proposta não vai além da simples regulamentação de artigos da Constituição de 1988, mais precisamente no capítulo 5º. Os objetivos dos constituintes, nesse ponto, foram abandonados por se chocarem com a lógica do monopólio da informação e da concentração de poder no seleto grupo dos “Barões da Mídia”.
A proposta de mudança no Brasil ainda não saiu do papel. Ou melhor, sobre o papel está sentado o digníssimo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Que conta, diga-se como atenuante para ele, sem melhor juízo, com a concordância silenciosa da -presidenta Dilma Rousseff.
Por quê? In dubio pro Dilma. Talvez seja falta de oportunidade e não falta de coragem política. Mas é possível, também, que ela esteja orientada por maus conselheiros. A propósito, o que pensa a ministra Helena Chagas sobre tudo isso? É contra, a favor ou muito pelo contrário?
Dilma contorna o confronto com a mídia. Fogo que a assessora para essa questão não apaga. A presidenta suporta. Seu silêncio sufoca reações mais fortes. Ela sofre o cerco da mídia conservadora. Esse cerco é muito diferente da tarefa democrática de vigilância ao poder.
A presidenta às vezes reage com estocadas elegantes dos espadachins. Fez assim ao decretar luto oficial de três dias e ao divulgar nota sobre a morte de Chávez, comemorada pela mídia. Ela lamentou: “Uma grande liderança (…) e, sobretudo, um amigo do Brasil, um amigo do povo brasileiro (…), deixará um vazio na história e nas lutas da América Latina”. A mídia brasileira, por unanimidade, não gostou disso. Nunca antes se juntou tão firmemente como agora.
A francesa Anne Marie Smith, no livro Um -Acordo Forçado – O consentimento da imprensa à censura no Brasil, sobre situações dos tempos da ditadura, registra: “Havia considerável falta de solidariedade na imprensa. Em vez de aliar-se para enfrentar o regime, com frequência se ocupavam em atacar-se e criticar-se mutuamente”. Ela põe o dedo na ferida: “Concorrência empresarial”. Ou seja, tudo vale a pena se a grana não é pequena.
Agora, os barões, na democracia, estão unidos como nunca dantes. Foram apanhados de surpresa com a ascensão de Lula e com a vitória de Dilma. Enfim, une-os a animosidade contra governos petistas. E, desta vez, transformaram a próxima disputa presidencial em guerra para a qual adotaram claramente um princípio militar: em 2014, só não vale perder.Mauricio Dias-CartaCapital
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