Berna (Suiça) - Comentando meu artigo prevendo a vitória do socialista François Hollande para a presidência da França, um leitor de direita, mal informado pela grande imprensa brasileira e mal humorado, comentou que eu decretara a vitória de Hollande.
Engano, foi o povo francês, cansado das estrepolias e traições do atual presidente Sarkozy, quem decretou, e isso tornou visível, já faz algumas semanas, a vitória de François Hollande.
Tudo ficou ainda mais evidente com o debate de três horas, desta quarta-feira, diante das câmeras da televisão francesa (foto), depois do qual os comentaristas políticos franceses e pessoas entrevistadas dão a vitória para o candidato socialista. Foi um verdadeiro duelo, com a surpresa de se ver Hollande, que era chamado de fraco e sem presença, se transformar num agressivo, forte e convincente candidato.
A hora da verdade será domingo, quando cerca de 53% dos eleitores mostrarão a porta dos fundos do Palácio do Eliseu para uma saída discreta do irrequieto Sarkozy por não cumprir suas promessas, por ter falhado na contenção do desemprego, por ter baixado os impostos para os ricos e aumentado para os pobres e outras tantas peraltices.
Sarkozy correu como um hiperativo insone para tentar debelar a crise econômica européia, contando com o apoio da chancelar alemã Angela Merkel, mas o plano de austeridade concebido pela dupla franco-alemã aguarda o momento de ser abortado. A União Européia sabe que as regras vão mudar domingo e seus dirigentes esperam as novas orientações de Paris, que não serão mais na direção do neoliberalismo.
Tudo vai mudar, porque já é historicamente reconhecido que a França tem sempre um papel de liderança e de vanguarda, no continente europeu, seja no mundo das idéias, dos costumes, como na economia e na política.
Assim como Jean-Luc Mélenchon eletrizou o povo francês adormecido e desencantado com sua nova leitura do socialismo, revivendo comícios dignos da Revolução Francesa, da Comuna de Paris ou da vitória do Programa Comum da esquerda que levou Mitterrand à vitória, em 1981, é certo que a derrota da direita de Sarkozy, em franco adultério com a extrema-direita de Le Pen, despertará os ideais socialistas nos eleitores europeus.
Os ventos vão mudar a partir de domingo, mas um espectro ressuscitado por Sarkozy, na louca tentativa de conseguir obter mais votos, ficará rondando à espera de intervir e de transformar a vitória de domingo numa catástrofe.
Sarkozy no seu desespero diante da derrota fez, como Fausto, um pacto com o Diabo e, pela primeira vez, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, ressurgiu na boca de uma presidente francês a linguagem do marechal Pétain, colaborador de Hitler após a ocupação da França.
No afã de conquistar os votos da extrema-direita francesa do Front National, liderada agora pela filha de Le Pen, Marine, o já quase ex-presidente deu legitimidade e tornou compatível o discurso racista, anti-estrangeiros e nacionalista popular dos neonazistas franceses.
Mas tudo em vão, porque Marine Le Pen, que promete restabelecer a pena de morte, expulsar os estrangeiros e branquejar a França, tem outro plano – fragmentar e destruir a direita francesa para reconstituí-la como um forte partido híbrido de extrema-direita.
Em outras palavras, após a derrota de Sarkozy e os ajustes de contas que se seguirão, o partido do presidente derrotado implodirá, e no seu lugar surgirá um Front National com outro nome, versão light, enquanto Marine Le Pen, aparentemente lavada dos seus perigosos extremismos, poderá se sentar como líder entre os políticos franceses.
Como num pesadelo, ressurgirá na França um partido nacionalista, cujo programa lembrará os espectros do passado. E o pior poderá acontecer se François Hollande falhar no seu posto de presidente.
Mas, mesmo na versão otimista de um bom governo Hollande, haverá na cena política francesa a ameaça latente da ideologia fascista e nazista, numa versão mais leve e adoçada, porém com o mesmo veneno dos anos 30, escondido no seu interior. Essa a herança de Sarkozy.
Rui Martins - BernaJornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, ex-membro eleito no primeiro conselho de emigrantes junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreve para o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress.Direto da Redação.
Um comentário:
Sarkozi é um arrivista, filho de imigrante lascado da Hungria, que chegou na França sem nada e aos poucos foi criando seu pé de meia. Ele não tem escrúpulo nem diplomacia. Só pensa no poder e em atacar os imigrantes. É o ressentimento de imigrante que quer se vingar dos outros.
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