Gisele Federicce _247 – Um
ano e meio depois, a análise sobre a cobertura da mídia durante a eleição
presidencial de 2010, feita pela dupla de jornalistas Palmério Dória e Mylton
Severiano, acaba de ser recheada com novas histórias, mais detalhes e uma
interpretação sobre o que está por vir no próximo ano. "Crime de
Imprensa", lançado em outubro de 2011 em uma banca de jornal da Avenida
Paulista, ganha uma versão digital – revista e ampliada – pela Livraria 247.
"Para mim o lançamento é agora", afirma, em entrevista ao 247,
Palmério Dória – autor também de "Honoráveis Bandidos", sobre a
ascensão da família Sarney -, com o mesmo parceiro.
Paraense de Santarém, o
escritor acrescenta que a nova versão, porém, não será impressa. "Não
adianta encarar certas paradas. A internet está aí para isso. Vimos que a
melhor saída era essa", explica, ao se lembrar que "a mídia não deu
uma mísera nota" sobre o livro em 2011. "Teve lançamento em Floripa e
em Belém, mas a verdade é que ele circulou num circuito restrito mesmo".
Segundo o jornalista, o novo texto faz um balanço, sempre com bastante humor –
"parece às vezes uma paródia" – de 2004 a 2010, "e pode ser lido
como uma premiere do que vem aí".
Para Palmério Dória, a
eleição que levou Dilma Rousseff à presidência da República no segundo turno,
quando derrotou o tucano José Serra, foi como um "trem-fantasma", que
a cada curva tinha um susto diferente, sempre promovido pela imprensa. O livro
trata desses sustos, passados pela então candidata. Um exemplo é o fato de o
jornal O Estado de S.Paulo, da família Mesquita, assumidamente apoiador da
campanha de Serra, ter noticiado que o tucano estava em dois lugares no mesmo
dia e no mesmo horário. "Eles vão repetir os mesmos erros nessa campanha
de 2014. E já estão operando", afirmou, sobre os jornais.
Leia abaixo os principais
trechos da conversa:
Qual a diferença dessa
edição revista e ampliada?
Bom, a gente acrescentou
muita coisa. Por exemplo, a gente acha que a grande mídia vai fazer tudo igual
ao que fez em 2010, só que diferente: eles estão mais unidos e coesos. Estava
faltando também um pouco mais de eleições passadas. Falamos de uma operação
Teodoro, levada à cabo pela TV Globo, em 89, para evitar a chegada do [Leonel]
Brizola ao segundo turno. Eu acho que eu não vi nada até agora sobre isso... e
está nessa versão. Tem coisas interessantes que a gente acrescentou que foram
acontecendo depois do lançamento, como o fato ocorrido no dia 9 de dezembro de
2011, quando se celebrava o Dia Internacional Contra a Corrupção. Nesse dia, o
[jornalista] Amaury Ribeiro Junior lançou um livro bem adequado à data, A
Privataria Tucana. Só que a imprensa passou mais de uma semana para tomar o
conhecimento do livro, enquanto se ocupava em perseguir o [ministro] Fernando
Pimentel. Além de recontar melhor coisinhas como no fato de nas eleições de
2002 o [candidato à presidência] José Serra estar em dois lugares ao mesmo
tempo – em um estúdio em São Paulo e numa grande manifestação popular em
Tocantins. O Estadão deu isso: era o mesmo horário e o mesmo dia. O livro está
realmente muito mais redondo. Esses pequenos e grandes crimes da imprensa estão
mais evidentes.
Por que a cobertura
jornalística da campanha presidencial de 2010 chamou tanta atenção, a ponto de
você decidir escrever um livro sobre o assunto?
Porque o que está na frente
da gente, diante do nariz, normalmente as pessoas não fazem. Esse é o único
livro sobre as eleições de 2010, segundo o [jornalista] Ricardo Kotscho. Agora,
é muito importante porque eles (os jornais) vão repetir o mesmo esquema, agora
maior, também revisto e ampliado, de 2010. Porque eles já fazem isso há
décadas.
Quais são os principais
fatos da eleição citados no livro?
Partimos do episódio da
bolinha de papel [contra José Serra], e vamos para a frente. Falamos que a
eleição de Dilma parecia um trem-fantasma: a cada curva era um susto. Então
vamos falando desses sustos que a Dilma e o País passou, terminando com o Papa
entrando na discussão sobre o aborto.
E vocês veem esses
acontecimentos com humor...
Sempre. Parece às vezes uma
paródia. Só dá para entender o que está acontecendo hoje em dia no Brasil pelo
viés do humor, como dizem os intelectuais. Não tem outra forma.
O título é Crime de
Imprensa. Que crime é esse?
São os pequenos e grandes
golpes da mídia para derrubar os governos populares.
Você chama a imprensa
brasileira de murdoquizada. Qual a relação da mídia no País com os veículos do
magnata Rupert Murdoch, na Inglaterra?
A revista Veja grampeou o
José Dirceu numa operação que depois se viu que até o Carlinhos Cachoeira
estava envolvido. Um repórter entrou no hotel, botou câmeras e tudo o mais. São
os métodos que o pessoal do Murdoch usou.
Sobre um fato que ocorreu
após a publicação do livro... o que pensa sobre a relação de Carlinhos
Cachoeira com a Veja?
De novo a piada prevalece. O
Cachoeira na verdade era o publisher da Veja. Tudo vira piada porque você vê,
como no caso do [julgamento do 'mensalão' pelo] STF, que a ausência de fatos é
mais importante que os fatos. E a imprensa vai criando esses fatos. A Folha vai
ter que ampliar o seu "Erramos" para o caderno inteiro, e tendo como
editora a [colunista] Eliane Cantanhêde.
O que você espera exatamente
para o ano que vem?
Uma maior coesão. O
"Rolando ladeira abaixo de Mesquita", o "Rolando ladeira abaixo
Frias", Civita... eles vão repetir os mesmos erros nessa campanha de 2014.
E já estão operando. O meu parceiro, o Mylton Severiano, tem um livro sobre o
Estadão – que também não tem a menor divulgação –, chamado "Nascidos Para
Perder". Só que nascidos para perder não são mais só o Estadão, tenho a
impressão de que esses jornalões se viciaram nisso, perder causa dependência.
E eles perderam também em
2010?
Ah, sim. O Estadão assumiu,
foi o único que fez editorial, defendendo meio que envergonhado a candidatura
Serra, chamado "O mal a evitar". O mal a evitar seria a Dilma, no
caso. Agora todos, de maneira geral, entraram nessa fria.
O que os jornais estão
fazendo agora que é similar a 2010?
Similar a 2010 é se
constituir como partido político. A grande mídia, os jornalões, estão unidos e
coesos. Então um repercute o outro, não existem mais nuances, não há fato novo,
eles vão em bloco, como numa ação coordenada, são concorrentes comparsas. É claro
que eles têm seus interesses próprios, mas existe uma cumplicidade.
No fundo, no fundo, o grande
objetivo é evitar os avanços sociais. Uma discussão antiga. Por isso que o
livro precisava falar de outras eleições, para ficar mais claro. Na prática, a
gente faz um balanço de 2004 a 2010, mas evidente que fala mais da eleição que
passou – e pode ser lido como uma premiere do que vem aí, que já está
acontecendo.
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