Hoje é um dia de muitas notícias e pensamentos. Meu espírito se divide entre escrever sobre cinema brasileiro ou sobre a crise financeira mundial. Sei que a crise é grave, mas é que não tenho um centavo aplicado em bolsa - ao contrário, sinto até uma alegria mesquinha porque até pouco tempo sentia-me um pouco idiota por não ter, quando podia, comprado alguma ação da Petrobras e agora posso me sentir esperto novamente. Comecemos pela economia. Falo de cinema lá no final.
Tenho a impressão que o momento agora é de comprar. Estamos na baixa, o capital estrangeiro fugiu para seus países de origem, assim como pessoas mimadas que gritam mamãe quando enfrentam qualquer problema mais grave. É hora do brasileiro aproveitar e comprar barato o que seguramente será valorizado no futuro.
Além do mais, o dinheiro não desaparece. Apenas muda de mãos. Se os especuladores estão perdendo dinheiro, isso é otimo para os trabalhadores. Talvez não no curto prazo, por causa da confusão causada à economia, mas no médio e longo prazo certamente as atividades econômicas não especulativas serão beneficiadas com o estouro da bolha artificial do mercado financeiro. Lembrem-se que a industrialização brasileira apenas acelerou-se a partir de 1929, após o crash da bolsa de Nova York. E os próprios EUA, depois da Grande Depressão, encontrou uma harmonia melhor entre Estado e capital, obtida com a eleição daquele que talvez tenha sido o melhor presidente norte-americano de todos os tempos, Roosevelt, eleito quatro vezes sucessivas(morreu no início do quarto mandato), que não só tirou a economia americana do buraco como consolidou a nação como grande super-potência global. Vencer Hitler, Mussolini e os nazistas japoneses é um detalhe nada desprezível.
Graças a Deus o Congresso americano não deu mais um cheque em branco ao Bush, desta vez no valor de US$ 700 bilhões. Que se danem os bancos, seguradoras, as bolsas! Que vão todos à falência. Sou a favor de um Estado forte e regulador, mas nunca de um Estado paternalista. E o que é pior: paternalista de banqueiros! Aí é demais. Hoje li os três: Globo, Estadão e Folha. No Estadão tem um artigo do Marco Macial lembrando, com orgulho, do Proer. Tolinho, esse Maciel. Eu estava atrás desses dados há tempos, e o próprio ex-vice-presidente de FHC os entrega de bandeja. Lembram-se do Proer? Alguns anos após o plano Real, implantado em 1994, o sistema financeiro nacional começou a entrar em colapso. Então, a equipe econômica neoliberal tucana resolveu ajudar os pobres banqueiros, e compraram papéis podres (o que significa que deram dinheiro, de graça, para os bancos em crise) no valor de R$ 20,4 bilhões (total gasto com o programa, que durou até meados de 1997), em valores da época, que correspondiam a 2,7% do PIB brasileiro. Em valores atualizados, considerando o PIB de 2007 de R$ 2,7 trilhões, o Proer custou ao bolso dos brasileiros a bagatela de R$ 69,66 bilhões. Lembrando: o Bolsa Familia, tão criticado nos primeiros anos do governo Lula pela oposição e maior parte dos colunistas, custou, em QUATRO ANOS, de 2003 a 2006, um total de R$ 24 bilhões, ou média de 0,45% do PIB. Ou seja, para a direita o Estado foi criado para salvar banqueiro de apuros, mas nunca para ajudar uma família pobre a se alimentar decentemente.
É a mesma coisa com esse pacote de Bush. Ele equivale a mais que o dobro do PIB da África, de toda a África. O dinheiro, se fosse usado para livrar a África da miséria, poderia transformar o grande continente negro num grande mercado consumidor de produtos americanos. Mas Bush prefere comprar papéis podres de bancos falidos e gastar dinheiro mandando mísseis de 3 milhões de dólares sobre cabanas de palha no Afeganistão.
Editorial do jornal O Globo, há poucos dias, afirmou que o governo brasileiro errou ao não engolir a ALCA, a aliança comercial que os EUA queriam nos empurrar goela abaixo. Esses editorialistas do Globo são burros ou malucos. Não é a tôa que o Globo, uma das maiores empresas do país, tem dívida superior a US$ 1 bilhão e torce para o Serra ganhar para poder dar o cano no governo, principal credor. E tem a cara de pau de afirmar que o comércio exterior brasileiro não vai muito bem. A balança comercial brasileira tem batido recordes sucessivos nos últimos anos - e com a moeda valorizando, o que é ainda mais impressionante! Miriam Leitão, desde que o Real começou a ganhar impulso, roga praga contra as exportações - e quebra a cara toda vez que os números da Secretaria de Comércio Exterior são publicados. Recorde em cima de recorde. O superávit comercial hoje caiu não porque as exportações caíram, mas porque as importações cresceram muito. Isso é ótimo. Ficar contra a importação e torcer por superávits estratosféricos é outra mania de pobre, quer dizer, de rico burro com espírito (ele sim) terceiro-mundista. Um país em desenvolvimento tem que importar muito também. A gente também quer beber vinho italiano e uísque escocês. Mas o mais legal é que a maior parte das importações brasileiras não é composta de artigos de consumo, mas de máquinas, bens de capital e produtos de informática, que revelam o investimento de nossas indústrias na ampliação de suas instalações. A ignorância (ou má fé) do Globo chega ao cúmulo de acusar o governo de realizar uma política externa "ideológica", beneficiando o chamado "terceiro-mundo", em detrimento das economias tradicionais. É demais. Quem é terceiro-mundista e ideológico é a nossa imprensa. Os caras não se dão ao trabalho nem de pesquisar na internet. Pois bem, eu o fiz. Pesquisei e editei os dados fornecidos gratuitamente pela Secretaria de Comércio Exterior, através do Sistema Alice, a qualquer interessado. Aliás, às vítimas de complexo de vira-lata, que consideram tudo que fazemos inferior ao realizado no estrangeiro, afirmo que o nosso sistema estatístico on-line é o mais moderno do mundo. Como jornalista, acompanho os sistemas do mundo inteiro e não existe nada que se compare ao brasileiro.
A tabela que publico abaixo traz as exportações brasileiras para os principais grupos geopolíticos do mundo. Confiram: o principal grupo comprador de nossos produtos é o de "Países em desenvolvimento" e a América Latina e Caribe compram mais produtos brasileiros que os Estados Unidos e a União Européia. Mais que isso, América Latina e países em desenvolvimento pagam mais pelos produtos brasileiros, pois adquirem muitos artigos manufaturados, enquanto as nações ricas, que têm seus mercados fechados para produtos industrializados, importam preferencialmente matérias-primas de baixo valor agregado, como minério de ferro, café em grão verde e soja crua. Vamos aos números. Nos últimos 12 meses, setembro de 2007 a agosto de 2008, o Brasil exportou US$ 189,5 bilhões, o que representou um aumento de 174% sobre o valor exportado há seis anos, 2002/03, no mesmo período. o grupo composto por América Latina e Caribe importaram US$ 48,64 bilhões, ou 25,7% do total das exportações brasileiras, e pagaram uma média de US$ 1.165 a tonelada. Enquanto isso, a União Européia, composta por 27 países, importou US$ 46,53 bilhões, ou 24,6% do total, e pagou US$ 342 por tonelada, com aumento de 165% do valor registrado há seis anos. Os EUA, por sua vez, importaram US$ 27,35 bilhões em 2007/08, aumento de 63% em seis anos, e pagaram US$ 908 por tonelada, em média.
Ou seja, não tem nada de ideológico! Os países "morenos" compram mais e pagam melhor! Que espécie de capitalismo é esse, defendido por nossa direita escalafobética, que não gosta de ganhar dinheiro! Que torce contra o crescimento econômico! Que combate programas de ajuda aos pobres e defendem grana grátis para banqueiros falidos!
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