segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Genro:Por preconceito, chamam Dilma de mandona’


O Globo - 04/01/2010

O ministro da Justiça, Tarso Genro, deverá ser o primeiro da equipe do presidente Lula a deixar o posto em Brasília para se dedicar exclusivamente à campanha eleitoral. Candidato do PT ao governo do Rio Grande do Sul, Tarso pretendia sair da Esplanada dos Ministérios em dezembro, mas fica pelo menos até fevereiro. Um dos principais nomes do PT, o ministro gaúcho avalia, nesta entrevista, o potencial de crescimento da candidatura da ministra Dilma Rousseff — que, segundo ele, vai decolar quando começar o horário eleitoral na TV, em agosto —, diz que a fama de “mandona” dela é fruto de preconceito contra a mulher e que fazer retoques na imagem é natural. Como legado no Ministério da Justiça, Tarso acredita que deixará o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), um plano de cerca de cem diferentes iniciativas orçadas em mais de R$ 8 bilhões. Reconhece que ainda não será desta vez que o governo terá condições de apontar queda significativa nos índices de violência. A melhora, segundo ele, ainda é “imperceptível”.

Jailton de Carvalho

O GLOBO: O senhor iria sair do ministério em dezembro, mas tem agenda até fevereiro. Por que mudou de ideia?

TARSO GENRO: O presidente pediu que eu tirasse férias e depois conversasse com ele em definitivo. Mas não vai ser uma data muito distante da que eu vou voltar. Vai ser uns 15 ou 30 dias próximos à minha volta das férias, que é 24 de janeiro.

Então é no fim de fevereiro?

TARSO: Não temos data definida ainda, mas é por aí ou talvez antes.

Antes, portanto, dos outros ministros candidatos.

TARSO: O que tenho de concreto é que tenho uma exigência do partido para uma agenda específica de trabalho regional a partir de fevereiro, e eu pretendo atender a essa demanda.

E a ministra Dilma, vai ficar até o término do prazo de desincompatibilização (abril)?

TARSO: Cada caso é um caso. Eu, por exemplo, tenho condições de dizer ao presidente que minha agenda está integralmente cumprida. Como o presidente não quer inovação neste último ano, ele fica absolutamente tranquilo para colocar aqui uma pessoa que dê continuidade ao trabalho que já está num nível excelente de solidez.

Vem um técnico ou político?

TARSO: O presidente não decidiu. Mas as duas pessoas que estão sendo comentadas informalmente são o Luiz Paulo Barreto, meu secretário-executivo, um grande quadro, em quem tenho integral confiança, e o José Eduardo Cardozo, um grande quadro político, um jurista de porte. Ambos têm condições de tocar isso aqui muito bem.

Qual tem mais chances?

TARSO: Não tenho ideia, porque o presidente pode ter até um terceiro nome que não tenha revelado. A decisão de indicar um ministro é de total autonomia dele. Referi a esses dois porque são os dois mais comentados aqui no nosso meio.

O presidente Lula causou desconforto no PMDB ao falar de lista tríplice para a escolha do vice da ministra Dilma. Não estava certo que seria o deputado Michel Temer?

TARSO: Será uma decisão do PMDB. O PMDB terá que tirar uma posição oficial sobre manter-se na coalizão. Quando o presidente fala em lista tríplice ele está, na verdade, fazendo um movimento em homenagem ao PMDB, dizendo que eles têm mais de um. Mas o presidente sabe perfeitamente que quem vai indicar é o PMDB.

O PMDB não gostou...

TARSO: Na verdade teve uma coincidência. No momento em que o presidente fez a homenagem, começaram a salpicar notas de que o presidente do PMDB estaria sendo investigado pela Polícia Federal. Não é verdade. Ele me telefonou, conversamos. A Polícia Federal não investiga o presidente de um Poder. Quem faz essa investigação, se é que é necessária, para qualquer presidente, é o Supremo Tribunal Federal. A PF não está investigando o presidente da Câmara. Essa coincidência é que irritou um pouco o presidente Temer, mas acho que ele ficou satisfeito com as explicações dadas.

Surgiram rumores de que, se a candidatura da ministra Dilma tivesse dificuldade para decolar, o presidente poderia se licenciar para se engajar na campanha. Isso tem fundamento?

TARSO: Não tenho ideia. O presidente está com uma agenda internacional muito forte e uma licença só seria decidida por ele numa situação muito específica e acredito, sinceramente, que não vai acontecer.

A candidatura da ministra preocupa, diante dos números das pesquisas? TARSO: Sinceramente não estou preocupado. A Dilma tem três condições fundamentais para decolar no momento adequado. Primeiro, um partido que vai lhe dar apoio muito forte. Segundo, tem, provavelmente, o melhor cabo eleitoral do mundo, o presidente Lula. E terceiro, capacidade de gestão. No momento que o debate político começar efetivamente, no momento em que a televisão começar a funcionar, vamos ver a realidade de cada candidatura.

E essa imagem de que ela é autoritária, mandona...

TARSO: É que uma mulher, quando tem autoridade, normalmente é vista como mandona. Ela tem autoridade e, na minha opinião, exerce essa autoridade de maneira muito correta. Como existe semeada na sociedade uma série de preconceitos em relação à mulher, logo a indicam como mandona.

Os marqueteiros sugeriram que ela tentasse suavizar a imagem?

TARSO: Eventualmente pode ter ocorrido isso. Agora todos os candidatos terão orientações de publicitários, marqueteiros, porque a campanha eleitoral hoje não é somente um discurso político articulado e bem feito. É também uma imagem que se projeta através do discurso. Todos os candidatos fazem isso.

E a campanha para o governo gaúcho? O senhor está bem cotado, mas seu provável principal adversário, José Fogaça, está conseguindo ampla aliança. O PT pode ficar isolado?

TARSO: O Fogaça ainda não apresentou sua candidatura. Ele disse que poderia ser candidato se o PDT o apoiasse, e o partido não tomou ainda sua decisão. O sistema de alianças no Rio Grande do Sul está pendente para todo mundo. Não temos nenhuma sensação de isolamento no estado. Muito pelo contrário, pela primeira vez, depois de 15 anos, estamos com uma sensação muito boa.

Em relação ao italiano Cesare Battisti, até agora não tem uma decisão clara do gover no. No atual quadro, ele permanece no Brasil ou volta para a Itália?

TARSO: O Supremo tomou duas decisões aparentemente contraditórias. Mas só aparentemente. Na primeira decisão, o Supremo disse que meu despacho estava errado, portanto, deveria ser cassado pelo tribunal. Na segunda decisão, disse que, embora errado o meu despacho, a decisão em última instância de acolher ou não o refúgio é do presidente da República, porque conectou essa visão com a norma constitucional. Entendi sempre que nulo, equivocado e ilegal era o Supremo cassar o meu despacho, porque a norma que regula o refúgio é clara. Diz que, quando o ministro concede o refúgio, cessa o pedido de extradição. O tribunal entendeu diferente. Respeito profundamente, mas acho que a decisão é errada. Mas, num segundo momento, o STF diz que é uma questão externa. Portanto, ele integra essa decisão minha no âmbito da política.

O senhor disse que uma eventual decisão contrária do Supremo poderia usurpar o direito do presidente de deliberar sobre política externa.

TARSO: É isso mesmo. Sempre defendi isso. Sustentei politicamente que uma decisão do Supremo nesse sentido abriria um precedente perigoso porque invadiria um âmbito de competência estrita do presidente. E esta foi a decisão do Supremo. Os ministros que estavam defendendo essa posição não faziam isso por motivação subalterna. Faziam por convicção jurídica. Mas a convicção jurídica que vingou foi a que eu defendia.

O senhor lançou o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci). Considera que hoje o Brasil é um país mais seguro ou a mudança é imperceptível?

TARSO: É imperceptível. O Pronasci é o início da mudança, não a mudança. É o início de uma mudança que se dará ao longo dos quatro, oito, dez anos próximos se ele for mantido. Ele tem recursos garantidos por mais três anos. Não é projeto do Tarso Genro, nem do presidente da República, é um plano do governo e se transformou em projeto de Estado por lei federal. Temos que ter, sim, atividade, objetividade, foco. Mas também paciência. A situação da segurança pública é originária de 40 anos de omissões.

Um comentário:

José Lira disse...

Em matéria de política, mulher mandona é melhor do que homem frouxo.