quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Lei Maria da Penha neles!


Fato curioso aconteceu com meu cunhado, de alcunha Maru.O camarada, já raspando os 70, envolveu-se com uma menina de 18 anos.Minha irmã, de nome Maria José, que é mais brava que um siri na lata, tomada por um ciúme da gota serena, partiu para cima do garanhão e meteu-lhe os dentes.A cada dentada que a bicha dava, Maru gritava: eu queria saber quem inventou essa danada de Lei Maria da Penha, quem criou essa maldita lei é um desgraçado, deveria ter criado uma para ferrar as mulheres. Cadê os direitos iguais?A cada grito de Maru, Zeza metia-lhe os dentes e dizia: quem manda ser safado, tu não sabe que esta menina só que a tua aposentadoria de um salário-mínimo?Te ajeita sujeito safado!Moral da história:depois dessa lambança Maru, o garanhão, nunca mais quis saber da tal namorada.

O CPP e a Lei Maria da Penha

O Código de Processo Penal vigente, de 1941, encontra-se, em vários sentidos, em descompasso com a atual realidade jurídica e sociocultural do país. A comissão de juristas que elaborou o anteprojeto de reforma do CPP no Senado Federal, apresentado como projeto de lei nº 156, de 2009, alcançou resultados altamente meritórios.

Considerando, porém, a abrangência, a complexidade e a importância do assunto, não há dúvida de que é necessário discutir exaustivamente as inovações normativas e a sistematização levada a cabo pelo anteprojeto -o que é possibilitado pela tramitação regular do processo legislativo.

Foi-me designada a sub-relatoria do projeto na parte que se refere aos recursos do processo penal. Procurada por inúmeras entidades do movimento feminino e pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, entendi que era meu dever avocar a responsabilidade de relatar também os aspectos relacionados ao impacto da citada reforma sobre a aplicação da lei nº 11.340, de 2006, a justamente famosa Lei Maria da Penha.

Não faltam motivos para preocupações. Tais preocupações nascem, antes de tudo, da consciência de que a Lei Maria da Penha surgiu para se contrapor a um fenômeno social da maior gravidade e de efeitos seríssimos sobre a dignidade, o bem-estar e a saúde física e mental de milhões de mulheres brasileiras.
Refiro-me à prática da violência familiar e doméstica contra a mulher, que ocorre, lastimavelmente, em patamares dos mais elevados em nosso país. Estatísticas recentes informam que 25% das mulheres brasileiras são vítimas de violência doméstica -ou seja, 1 em cada 4 mulheres convive com essa inaceitável agressão.

É ampla e generalizada a conclusão de que a Lei Maria da Penha tem tido, desde logo, um efeito decisivo para aumentar a denúncia dos casos de violência doméstica, levando as mulheres a se conscientizarem do direito à integridade física e mental e a lutarem por ele no plano jurídico.

Também começam a se mostrar claramente os efeitos da lei em seus objetivos finais, quais sejam, diminuir a incidência e a reincidência desse tipo de agressão por parte daqueles que mais deviam garantir respeito, solidariedade e companheirismo.

O preceito constitucional da igualdade de homens e mulheres em direitos e obrigações só pode se tornar efetivo com o enfrentamento da questão da violência, que atinge a mulher num contexto em que ela se mostra, paradoxalmente, mais desprotegida.

Sabemos das graves consequências que pode ter a noção, amplamente difundida, de que "em briga de marido e mulher não se mete a colher". Era preciso que uma lei especial, levando em conta as condições presentemente desiguais de homens e mulheres e as particularidades do contexto familiar, assumisse o papel de transformar essa realidade inaceitável.

Os desafios continuam enormes. As mulheres ainda se confrontam com intolerância e preconceito no seio da sociedade. Seja uma mãe que cumpre dupla jornada, cuidando da casa e dos filhos, num mercado de trabalho hostil, seja uma estudante universitária que é covardemente ofendida pelos seus colegas, refletindo um silencioso, porém forte, preconceito fomentado pela própria universidade -que, para o espanto de todos nós, resolveu expulsar aquela jovem que era a verdadeira vítima daquele ato coletivo de absurda intolerância.

Por isso lutamos tanto no Congresso Nacional: quer queiramos, quer não, ainda existe um pensamento subjacente, um preconceito escondido, um machismo atávico que pode eclodir a qualquer momento e degenerar em violência e desrespeito a saudável convivência entre os sexos.

Seria inaceitável que o projeto do Código de Processo Penal, que atualmente discutimos no Senado Federal, desconsiderasse as diversas peculiaridades contidas no bojo dessa legislação especial. Não podemos aceitar que a nova sistematização do processo penal venha gerar dúvidas sobre a aplicabilidade de todos os instrumentos jurídicos disponibilizados pela Lei Maria da Penha para combater a violência contra a mulher.

Apresentei algumas outras emendas que buscam garantir a aplicação, tal como prevista na Lei Maria da Penha, de uma série de medidas cautelares que visam a proteger a vítima, tais como a prisão preventiva ou o afastamento do agressor, sem as limitações estabelecidas no projeto de novo Código de Processo Penal.

Minha posição atende a uma demanda de entidades do movimento feminino e de representantes de órgãos e entidades públicos. Continuemos assim, na luta para garantir os direitos femininos, de igualdade, como prevê a Constituição deste país.



Serys Slhessarenko é senadora da República pelo PT do Mato Grosso e segunda vice-presidente do Congresso Nacional.

Artigo originalmente publicado na coluna Tendências/Debates do jornal Folha de São Paulo, edição de 07/01/2010. PT Org.

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