terça-feira, 23 de dezembro de 2008

SÓ FALTOU FALAR DO FALASTRÃO E ASSECLAS

Minocarthismo


Briga comercial é embrulhada com ideologia por jornalistas

por Márcio Chaer


Está em cartaz em alguns espaços da imprensa brasileira uma epopéia retumbante: o grande combate entre o bem e o mal. Do lado do ‘bem’ estão o delegado da Polícia Federal, Protógenes Queiroz; o juiz Fausto De Sanctis; pessoas afastadas dos seus ofícios, como o ex-delegado Paulo Lacerda, o ex-juiz Walter Maierovitch e o ex-advogado Dalmo Dallari e um magote de fundamentalistas perdidos pela Internet. Do lado do ‘mal’ estão o presidente do Supremo Tribunal Federal, colegas seus; o juiz Ali Mazloum; setores do governo e do Congresso; a Rede Globo e a Editora Abril e, entre outros, este site.


A bandeira dos benzistas, dizem eles, é a eliminação da corrupção de colarinho branco no país. Ao que se depreende da insistente pregação, isso acontecerá se o banqueiro Daniel Dantas for retirado de circulação. Sempre segundo os neo-idealistas, isso não aconteceu até agora porque Daniel Dantas é “o dono do Brasil”. Ou seja: por meios pérfidos ele tem sob seu comando a turma do mal — o que explica seu continuado sucesso nos negócios, na política, na imprensa e no Judiciário.


O criador desse enredo chama-se Luís Roberto Demarco, um homem de habilidades múltiplas. Ele tem atuado como roteirista da Polícia Federal, redator de ações subscritas pelo Ministério Público, pela Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados; e de textos publicados por seus parceiros na imprensa. Ex-sócio do Opportunity, Demarco vende tecnologia e antídoto para anular os venenos de Dantas a seus concorrentes e adversários.


Outra característica de Demarco é o apoio decidido que dá a jornalistas de marca, cuja carreira afunilou e, apesar do talento, já não encontram tantas oportunidades no mercado. Segundo Paulo Henrique Amorim, juntos, eles criaram a Organização Não Governamental “Brasil Limpo” para amparar profissionais da imprensa que queiram escrever para eles.


Essa luta do bem contra o mal, na vida real, é uma guerra entre grupos econômicos, claro. O troféu da disputa é uma fatia do mercado brasileiro de telefonia avaliada em 30 bilhões de reais por ano. As regras são do tipo vale-tudo.


Pode ser que Demarco e seus parceiros Mino Carta, Paulo Henrique Amorim, Luís Nassif e outros menos freqüentes tenham virado aríetes contra Dantas por razões humanistas. Por idealismo. Ao menos no caso do juiz De Sanctis, essa ressalva é fundamental. Ele e a legião de pessoas que o admiram sinceramente também querem tirar Dantas de circulação, mas não necessariamente pelos motivos dos missionários de Demarco. Por isso é essencial tentar entender algumas coincidências e por que o grupo minocarthista resolveu dedicar-se em regime de exclusividade a essa cruzada.


A revista Carta Capital, de Mino Carta, viabilizou-se com apoio financeiro do empresário que se tornaria em seguida presidente do Consórcio Telemar — Carlos Jereissati. Ele foi acusado, em 1998, pelo ex-ministro da Infra-estrutura Luiz Carlos Mendonça de Barros de ser chefe de uma telegangue que comprou do governo a mais capilar das operadoras de telefonia do país com dinheiro do próprio governo. Mendonça de Barros perdeu o emprego com a divulgação de um grampo clandestino. O grampo flagrou confidências e inconfidências de metade do governo FHC, inclusive do presidente da República.


Nos cerca de dez anos que durou a disputa, Jereissati e Dantas se bateram pelo mesmo prêmio. Jereissati ganhou a parada fazendo dobradinha com Sérgio Andrade, um dos donos da Andrade Gutierrez, apontado como o maior doador de fundos para a campanha presidencial de Lula em 2006.


A justiça de primeira instância já condenou o colunista Diogo Mainardi duas vezes por ter afirmado que Mino Carta era subordinado a Jereissati na tarefa de fulminar Dantas. Na verdade, o empresário apenas garantiu o lançamento da revista com um contrato de patrocínio publicitário para seus dois primeiros anos de existência. Os dois parceiros, donos de gênios fortes, acabaram se desentendendo. É quando entra em ação Luís Roberto Demarco.
Ele garante a sobrevivência do projeto com o dinheiro da Telecom Itália e da ala petista gerenciadora dos fundos de pensão — que hoje comandam a Brasil Telecom e, em conseqüência, o iG, provedor que hospeda a revista Carta Capital. Paulo Henrique Amorim também andou por lá e saiu. Segundo o portal, foi afastado porque seu projeto não estava funcionando como se esperava. Ele inaugurou então um novo endereço para o seu blog em domínio virtual de propriedade de Demarco. Para substituí-lo no iG foi chamado Luís Nassif. A característica em comum entre Dantas e os patrocinadores de Mino Carta era a meta: ser cabeça das duas grandes operadoras. Quem eliminasse os outros ficaria com o despojo do inimigo.


Quando os acionistas da Telecom Italia ficaram sabendo que uma montanha de dinheiro fora despejada no Brasil sem a contrapartida esperada, começa (lá) a caça ao tesouro perdido (aqui). Os depoimentos apontam para um propinoduto que irrigou a horta de policiais, de deputados, políticos e, claro, os músicos da orquestra de Demarco.


Teoricamente, os destinos estão selados. O pobre Daniel Dantas, afirma-se na imprensa neutra, receberá algo como 2 bilhões de reais pela “derrota” (venda de sua participação na Telemar e na Brasil Telecom). Ainda não se sabe quanto os donos da BrT e do iG receberão para desocupar as cadeiras que hoje ocupam, mas já se sabe que o portal deverá ser fechado ou vendido pela nova administração. A disputa entre doadores de campanha de Lula e os fundos ainda não terminou. Mas sabe-se que a operação Satiagraha aumentou o poder de negociação dos fundos.
A orquestra de Demarco toca em ritmo de fanfarra para encobrir o ruído incômodo das acusações, certamente injustas, de que seus músicos — e pintores — alugaram seus dotes artísticos para um empresário engolir o outro.

É o caso de Luís Nassif. Sua aparição repentina nesse cenário atraiu atenção para os motivos de seu afastamento da Folha de S.Paulo. Coube à revista Veja dar a primeira das decepcionantes informações sobre o autoproclamado introdutor do jornalismo eletrônico e de serviços no Brasil. Nassif publicara, com sua assinatura, ao menos um texto escrito por Demarco. O material, uma peça de artilharia contra Daniel Dantas, fora remetido a diversos jornalistas, mas só a coluna de Nassif na Folha o publicou. Sem esclarecer que era um relise.


O segundo golpe veio com a revelação de que o repentino e eloqüente apoio do jornalista ao governo tinha motivação extra-ideológica: um empréstimo de RS$ 4 milhões do BNDES que, como não foi saldado, teve uma parte perdoada e outra alongada para um prazo de dez anos.
Mais. Outra notícia — confirmada pelo próprio diretor do jornal, Otavio Frias Filho — indicou que Nassif negociava o seu espaço editorial na Folha, mas quem ficava com a verba era a empresa Dinheiro Vivo, de propriedade do jornalista. O exemplo dado envolveu o então secretário de segurança Saulo de Castro.


Uma pesquisa cruzando o banco de dados da Folha de S.Paulo com o portal de pagamentos feitos pela administração direta federal (Siafi), mostra uma sucessão de pagamentos recebidos do governo federal. Com uma coincidência: os órgãos pagadores eram elogiados ou tinham seus interesses defendidos por Nassif na Folha.


Há um número considerável de odes e elegias ao BNDES. Mas não é o único caso. No dia 27 de janeiro de 2006, o colunista da Folha publicou no jornal de Frias um panegírico do Ministério da Ciência e Tecnologia (Clique aqui para ler — acesso restrito para assinantes UOL ou da Folha) e defendendo freneticamente, de forma pouco comum, o papel da pasta. Segundo o Siafi, a empresa Dinheiro Vivo — Agência de Informações recebeu do Ministério da Ciência e Tecnologia a quantia de R$ 15.930,00 (Clique aqui para conferir). e outros R$ 16.130,00 da Agência Nacional de Petróleo (Clique aqui para conferir).


Em duas datas de 2004 (30 de março e 15 de junho), Nassif, na Folha, destacou a importância do Inmetro com entusiasmo especial. O colunista sugeriu ao governo expandir o papel do Instituto para o campo da pesquisa, de forma a transformá-lo no “Nist brasileiro”, em referência ao National Institute of Standards and Technology dos Estados Unidos. O colunista se mostra aflito com a possibilidade de o governo criar um órgão que diminua os poderes do Inmetro e chega ao delírio dizendo que o órgão público é “uma das principais armas competitivas de que dispõe o país”. Clique aqui para ler —— acesso restrito para assinantes UOL ou da Folha).

Coincidentemente, o Inmetro destinaria à Dinheiro Vivo Consultoria Ltda. a quantia de R$ 15.000,00 (Clique aqui para conferir), acompanhados de outros R$ 7.910,00 do Ministério das Cidades (Clique aqui para conferir). A “ação de governo” que justificou o pagamento à empresa de Nassif não é um serviço normalmente oferecido por jornalistas: “controle metrológico”.


Luís Nassif é autor da proposta de que jornalistas de aluguel que usam a profissão para influir em jogadas empresariais devem ser enquadrados por formação de quadrilha (Clique aqui para ler) . A proposta foi lançada pelo blogueiro no dia 29 de abril de 2008 — três dias depois da publicação do furo de reportagem de Andrea Michael na Folha de S.Paulo que o delegado Protógenes Queiroz usou para criminalizar a notícia. A sugestão ou presságio de Nassif, na opinião de Mino Carta, é coisa de quem entende de formação de quadrilha. Já o delegado, pelo que se vê, gostou da idéia.


Jornalistas não precisam ser imparciais. Mas convém que sejam honestos. É impossível proibir a troca de favores ou a lealdade a fontes. O dinheiro não é um corpo estranho na relação entre empresas governos e jornais, blogs e revistas — a partir do momento em que os veículos de comunicação o recebem de personagens das notícias pelas portas do departamento comercial. O desejável é que não se misture publicidade com informação jornalística. Quando um órgão de informação passa a trabalhar a favor ou contra empresário, político ou empresa, seria conveniente que informasse frontalmente seus motivos. A Folha de S.Paulo, há muitos anos, instituiu a prática de aceitar convites de promotores de eventos, mas revela o patrocínio com naturalidade.


No caso da revista Carta Capital, de Nassif, de Paulo Henrique Amorim e demais parceiros coordenados por Demarco, isso não é feito. Eles cumprem um papel claro e definido com naturalidade, porque dizem acreditar estar combatendo um personagem nefasto e defendendo o aprimoramento institucional do país. Sem informar seus leitores que estão ganhando para fazer pregação.


Revista Consultor Jurídico, 23 de dezembro de 2008

Sobre o autor:


Márcio Chaer: é diretor da revista Consultor Jurídico, de propriedade do imparcial o Estadão, e assessor informal de imprensa de Gilmar Mendes.

Comentário.

Não estrou aqui para defender, até porque já os critiquei aqui, nenhum desses jornalistas que o sabujo citou, mas, sinceramente, um puxa-saco de Gilmar Mendes não pode dar lição de moral em ninguém.Esse camarada só faltou comer a merda de Gilmar Mendes na entrevista que o falastrão deu no Programa Roda Vida.

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