Quinta, 9 de outubro de 2008
Em Bragança, um "grampo a serviço do povo"
Bragança Paulista (SP) vive um escândalo de vulgarização de tórridos grampos civis no YouTube.
Bragança Paulista (SP) vive um escândalo de vulgarização de tórridos grampos civis no YouTube.
Bob Fernandes e Claudio Leal
Novela exemplar, à espera dos bordões de togados, congressistas, ministros e editorialistas. Bragança Paulista, a 75 km de São Paulo, 136.264 habitantes, simboliza a vulgarização dos grampos no Brasil. Grampos feitos por civis, e não pelas polícias, pelo Estado, diga-se de passagem. Para os que ainda se surpreendem com o vazamento de conversas banais em Brasília, segue uma história do submundo rural dos arapongas.
Em setembro, a campanha da cidade paulista subiu de tom. Escutas telefônicas ilegais foram postadas no YouTube para prejudicar o candidato a prefeito Gustavo Sartori (PSB) e sua vice, Fabiana Alessandri. Conversas íntimas, claramente editadas, são atribuídas aos dois.
O incidente teve o efeito esperado: os eleitores se debruçaram sobre computadores para conferir o material destrutivo. Promissora, a candidatura do jovem vereador foi abatida a grampos. Sartori terminou em terceiro lugar, com 15.933 votos. O atual prefeito, Jango (PSDB), foi reeleito com o dobro: 30.640.
No ar desde 25 de setembro, um dos vídeos é apresentado como "grampo a serviço do povo". Decerto um alívio aos democratas.
Outra gravação, postada no YouTube em 18 de setembro, já tinha quase seis mil exibições na noite de 8 de outubro. Os editores se escondem por trás de pseudônimos. A ilegalidade é assumida nos letreiros iniciais. Ao fim, o brado: "E você o que pensa em fazer? Votar neles ou exigir respeito?". Num município conservador, afeito a fofocas, há uma resposta implícita no julgamento da moral alheia.
Eleição em Bragança não é para almas sensitivas. Jogo desleal, beira a brutalidade. Depois dos ataques a Sartori, o prefeito Jango e um jornalista local também provaram ofensas virtuais - desta vez, sem conversas telefônicas. Vídeos devassam, sem provas, as vidas privadas, expostas à luz da internet.
Noutra frente, a divulgação dos grampos passou pelos correios. Cartas anônimas chegaram às caixas postais de professores e de vereadores, recheadas com Cds de diálogos telefônicos dos candidatos do PSB. Enviadas de Campo Grande (MS) e Jundiaí (SP), traziam o nome de um remetente digno de folhetim: "Associação dos moralistas de Bragança." Nada mais apropriado.
Os ataques já passam por investigação policial. Procurado por Terra Magazine, o candidato derrotado Gustavo Sartori, vítima da arapongagem civil, permaneceu em silêncio e desligou o telefone; não mais atendeu às ligações.
Uma centena de vídeos sobre a guerra suja pode ser localizada no YouTube. Isso redunda em dezenas de milhares de acessos - e, certamente, influenciou boa parte dos 88.375 votantes da última eleição. A cidade fervilha o escândalo.
O grampo ilegal - e inócuo do ponto de vista do conteúdo, ao contrário dos tórridos grampos bragantinos - de uma conversa entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), provocou tempestades na República. Em Bragança, e na rede, outro grave enredo de espionagem se desenrola.
Caso para a "associação" dos moralistas de Bragança. Caso de mais um grampo privado para fazer o Brasil de cima pensar sobre o que anda a discutir.
Terra Magazine.
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