quinta-feira, 23 de outubro de 2008

O SEQUESTRO DA NOTÍCIA



por Mário Augusto Jakobskind

Eloá Cristina Pimentel, uma adolescente de 15 anos, Nayara Silva e Lindembergue Alves, foram protagonistas, em Santo André, de um fato que terminou em tragédia. Eloá morreu, Nayara levou um tiro na face e o seqüestrador Lindembergue está preso e deverá responder pelo que fez, se até lá não virar presunto. Seus nomes com o correr do tempo serão esquecidos pelos leitores e telespectadores, mas outros que tiveram algum tipo de envolvimento com os fatos continuarão na ordem do dia. É o caso do Governador José Serra, que pediu desculpas à população por ter divulgado uma informação errada, tendo por fonte a Secretaria de Segurança, antecipando em 48 horas a morte de Eloá. A TV Globo divulgou a falsa informação em primeira mão.

Este episódio lamentável comprova o relacionamento promíscuo entre a TV Globo e o governador José Serra. Ou seja, qualquer informação divulgada pelo Governador de São Paulo vale mais do que outra de algum repórter da emissora. Explico melhor: por que a TV Globo divulgou o “furo” em primeira mão sem ao menos consultar os repórteres que acompanhavam o desenrolar dos acontecimentos com os médicos no hospital? Se não prevalecesse a promiscuidade entre o governo do PSDB e a Rede Globo, antes de divulgar a versão de Serra não seria o caso de consultar os repórteres? Em outros termos, a palavra do governo do PSDB na prática vale mais do que a dos profissionais de imprensa da própria emissora? É isso que acontece quando um veículo de informação se transforma em diário oficial de um grupo político. Foi assim durante a ditadura, quando as Organizações Globo divulgavam apenas o que os generais de plantão queriam. E hoje, quem diria, posam de democratas desde criancinha...

Como se apenas isso não bastasse, a TV Globo e demais emissoras aproveitaram a tragédia de Santo André para incrementar uma corrida desenfreada atrás da audiência. Ou seja, adotaram como prática o sensacionalismo, como tinham feito poucos meses antes quando uma menina foi jogada da janela pela madrasta e pelo pai em um bairro de São Paulo. Tudo se deve a filosofia segundo a qual os big-shots midiáticos têm a concepção de que a notícia é uma mercadoria e assim sendo vale qualquer expediente que leve a vender mais. As distorções continuarão, porque os responsáveis pelos veículos de comunicação correm sempre atrás do lucro fácil, muito mais do que da notícia propriamente dita.

E esta teia midiática passa também pelo crivo ideológico. O que aconteceu em São Paulo no confronto entre a PM e policiais civis é uma prova contundente nesse sentido. Foi dado o maior espaço possível para José Serra acusar o movimento grevista de estar sendo manipulado por políticos com interesses eleitorais. Além de evitar o diálogo com os policiais que percebem salários de fome, Serra preferiu a opção pelo confronto e com o apoio das Organizações Globo.

Posteriormente, entidades representativas de policiais militares se posicionaram afirmando que o conflito entre policiais civis e militares nas portas do Palácio dos Bandeirantes, que deixou 32 feridos, foi resultado da "política salarial perversa adotada pelo governo do Estado e endossada pela Assembléia Legislativa”. A TV Globo nada informou sobre o tema. Afinal, quem manda lá é a patota do Governador Serra. Para a Globo, os tempos agora não são mais de pró-ditadura, mas pró-tucanato, que joga todas as suas cartas no Governador José Serra.

Poucas semanas antes, Yeda Crusius, governadora do Rio Grande do Sul, também do PSDB, havia feito o mesmo em relação aos bancários e antes aos Sem Terras. Ordenou a PM baixar o cacete em manifestantes. É o recado tucano aos movimentos sociais. Podem imaginar o que aconteceria no Brasil se este grupo político tivesse o controle da área de segurança a nível federal?

A propósito de segurança, passou pelo Rio de Janeiro, procedente de Brasília, onde participou de um seminário sobre Direitos Humanos promovido pela Câmara dos Deputados, o advogado Martin Almada, descobridor dos arquivos da operação Condor e Prêmio Nobel da Paz alternativo de 2002. Ele fez uma grave denúncia, a de que o “Condor continua voando”. Ou seja, desde pelo menos a década de 90 militares latino-americanos estão se reunindo para, entre outras coisas, trocar lista de “terroristas latino-americanos”. Almada pediu ao Ministro da Defesa, Nelson Jobim que responda a dúvida se o Brasil está participando dessas reuniões, que na prática fazem parte do esquema Condor II. O Prêmio Nobel exortou políticos, jornalistas e representantes dos movimentos sociais a fazerem a mesma pergunta a Jobim.

Outro ponto importante levantado por Martin Almada foi o pedido feito a reitores de universidades brasileiras no sentido de solicitarem oficialmente ao governo paraguaio cópias dos arquivos da Operação Condor. Desta forma, segundo Almada, aumentaria a segurança para evitar algum imprevisto que resulte no desaparecimento do importante material comprovativo de como os serviços de inteligência do Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia agiam em conjunto naqueles anos de chumbo.


Fonte: Direto da Redação

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