07/05/2009
“Cidadão não é aquele que vive em sociedade; é aquele que a transforma”
Augusto Boal
Paulo Pimenta*
A comunicação passa por um processo de transformação, em que as novas tecnologias aproximam, cada vez mais, o cidadão das decisões políticas, econômicas e sociais no mundo. Sabemos que não existem mais fronteiras para a informação. As distâncias físicas, já, em parte, superadas pelos convencionais canais midiáticos, caíram diante da consolidação da internet. Entretanto, aliado às novas ferramentas da tecnologia deve estar o compromisso em defender e despertar o público para uma reforma mais profunda na maneira de ver, pensar e agir.
Nos últimos dias, a reação provocada na sociedade brasileira, que por consequência forçou a reflexão e a mudança de atitude do Congresso Nacional, foi provocada pelas revelações do site Congresso em Foco no tema das passagens aéreas. A falta de uma regra clara sobre os limites da utilização da cota mensal de cada gabinete contribuiu para uma cultura questionável, na qual, praticamente todos nós, mergulhamos, tratando-a como um complemento salarial. É evidente que a venda de passagens ou sua utilização de maneira a obter um ganho financeiro, além de extrapolar esse limite, configura-se como ato ilegal, que merece apuração e responsabilização.
No entanto, sob meu ponto de vista, a questão central não é essa. Se a utilização da cota estivesse on-line, em tempo real e à disposição da sociedade e da imprensa, o assunto não viria à tona como uma denúncia. A fiscalização pública regularia o limite entre o ético e o legal. Tão importante quanto as revelações feitas pelo site Congresso em Foco são os avanços que o Poder Legislativo deve obstinar, a partir desse episódio.
Digo isso porque tenho insistido na Casa para a importância do Projeto de Lei 4805/2009, que apresentei em março, e que cria o que convencionamos chamar de Cidadão Digital.
Inicialmente, o projeto foi pensado para resolver a questão da efetiva participação da sociedade – encaminhamento de leis pela iniciativa popular – prevista na Constituição Federal de 1988, direito nunca exercido devido à burocracia que exige procedimentos humanamente impossíveis e incompatíveis com o modelo de sociedade em que vivemos: recolhimento manual de 1% de assinaturas, referentes ao número do eleitorado nacional, distribuídos por pelo menos cinco estados, e o encaminhamento das listas nominais até Brasília. Diante de inúmeros procedimentos exigidos, o estatuto da participação popular, nos termos consagrado pela Constituição Federal, ainda não foi praticado, sendo inclusive, classificado por alguns juristas como “instituto decorativo”.
Estive recentemente com o presidente Michel Temer, oportunidade em que sugeri a ele a necessidade de atualizarmos e ampliarmos os mecanismos de participação popular no Congresso, provocando o amadurecimento dessa sistemática que, comprovadamente, impede que as idéias evoluam e cheguem até ao Legislativo.
Insisti para que essa fosse uma marca positiva da sua gestão, reunindo também outros projetos sobre o tema e alterando qualitativamente a presença da sociedade nas atividades parlamentares. No entanto, os últimos acontecimentos precipitaram a necessidade de acelerarmos aquilo que seria a segunda parte do projeto: a criação de uma relação de transparência, que permita um controle social efetivo das iniciativas legislativas e nas ações administrativas da Câmara.
O Cidadão Digital, além de promover o acesso da população ao parlamento, será uma ferramenta real de fiscalização da sociedade. Aliado a isso, o projeto deve fomentar a colaboração, criando um canal em que a inteligência da sociedade brasileira, hoje tão distante da pauta do Congresso, encontre um caminho de reaproximação.
Já temos a verba indenizatória à disposição na internet, agora também teremos as passagens. No meu entender, o próximo passo deverá ser a disponibilização das informações sobre pessoal, efetivo e terceirizado. O cidadão tem esse direito, de saber quem trabalha em um órgão público, sua função e onde pode ser encontrado.
Tenho a humildade de ser parte integrante desse processo de mudanças, entendendo que todos os funcionários da casa, suas atividades, lotações, emails e telefones funcionais devem ser disponibilizados nos portais da Casa. Isso evitará, no futuro, denúncias, porque o que é de fato público não poder ser “revelado”, pois disponível já está. A partir disso, que cada um responda pelas suas decisões, considerando as particularidades de cada mandato.
Cada gabinete, comissão, liderança, estrutura da Mesa, com suas atividades cotidianas, devem estar ao livre acesso e acompanhamento da sociedade, que poderá, desta forma, exercer seu controle e contribuir para que a instituição se fortaleça. O Congresso Nacional deve estar preparado para trabalhar de forma sintonizada com um nível de exigência cada vez maior, em um período histórico distinto daquele que inaugurou determinadas práticas, que até então não tínhamos tido a determinação e, talvez, coragem de aboli-las.
*Paulo Pimenta é deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul e jornalista.
“Cidadão não é aquele que vive em sociedade; é aquele que a transforma”
Augusto Boal
Paulo Pimenta*
A comunicação passa por um processo de transformação, em que as novas tecnologias aproximam, cada vez mais, o cidadão das decisões políticas, econômicas e sociais no mundo. Sabemos que não existem mais fronteiras para a informação. As distâncias físicas, já, em parte, superadas pelos convencionais canais midiáticos, caíram diante da consolidação da internet. Entretanto, aliado às novas ferramentas da tecnologia deve estar o compromisso em defender e despertar o público para uma reforma mais profunda na maneira de ver, pensar e agir.
Nos últimos dias, a reação provocada na sociedade brasileira, que por consequência forçou a reflexão e a mudança de atitude do Congresso Nacional, foi provocada pelas revelações do site Congresso em Foco no tema das passagens aéreas. A falta de uma regra clara sobre os limites da utilização da cota mensal de cada gabinete contribuiu para uma cultura questionável, na qual, praticamente todos nós, mergulhamos, tratando-a como um complemento salarial. É evidente que a venda de passagens ou sua utilização de maneira a obter um ganho financeiro, além de extrapolar esse limite, configura-se como ato ilegal, que merece apuração e responsabilização.
No entanto, sob meu ponto de vista, a questão central não é essa. Se a utilização da cota estivesse on-line, em tempo real e à disposição da sociedade e da imprensa, o assunto não viria à tona como uma denúncia. A fiscalização pública regularia o limite entre o ético e o legal. Tão importante quanto as revelações feitas pelo site Congresso em Foco são os avanços que o Poder Legislativo deve obstinar, a partir desse episódio.
Digo isso porque tenho insistido na Casa para a importância do Projeto de Lei 4805/2009, que apresentei em março, e que cria o que convencionamos chamar de Cidadão Digital.
Inicialmente, o projeto foi pensado para resolver a questão da efetiva participação da sociedade – encaminhamento de leis pela iniciativa popular – prevista na Constituição Federal de 1988, direito nunca exercido devido à burocracia que exige procedimentos humanamente impossíveis e incompatíveis com o modelo de sociedade em que vivemos: recolhimento manual de 1% de assinaturas, referentes ao número do eleitorado nacional, distribuídos por pelo menos cinco estados, e o encaminhamento das listas nominais até Brasília. Diante de inúmeros procedimentos exigidos, o estatuto da participação popular, nos termos consagrado pela Constituição Federal, ainda não foi praticado, sendo inclusive, classificado por alguns juristas como “instituto decorativo”.
Estive recentemente com o presidente Michel Temer, oportunidade em que sugeri a ele a necessidade de atualizarmos e ampliarmos os mecanismos de participação popular no Congresso, provocando o amadurecimento dessa sistemática que, comprovadamente, impede que as idéias evoluam e cheguem até ao Legislativo.
Insisti para que essa fosse uma marca positiva da sua gestão, reunindo também outros projetos sobre o tema e alterando qualitativamente a presença da sociedade nas atividades parlamentares. No entanto, os últimos acontecimentos precipitaram a necessidade de acelerarmos aquilo que seria a segunda parte do projeto: a criação de uma relação de transparência, que permita um controle social efetivo das iniciativas legislativas e nas ações administrativas da Câmara.
O Cidadão Digital, além de promover o acesso da população ao parlamento, será uma ferramenta real de fiscalização da sociedade. Aliado a isso, o projeto deve fomentar a colaboração, criando um canal em que a inteligência da sociedade brasileira, hoje tão distante da pauta do Congresso, encontre um caminho de reaproximação.
Já temos a verba indenizatória à disposição na internet, agora também teremos as passagens. No meu entender, o próximo passo deverá ser a disponibilização das informações sobre pessoal, efetivo e terceirizado. O cidadão tem esse direito, de saber quem trabalha em um órgão público, sua função e onde pode ser encontrado.
Tenho a humildade de ser parte integrante desse processo de mudanças, entendendo que todos os funcionários da casa, suas atividades, lotações, emails e telefones funcionais devem ser disponibilizados nos portais da Casa. Isso evitará, no futuro, denúncias, porque o que é de fato público não poder ser “revelado”, pois disponível já está. A partir disso, que cada um responda pelas suas decisões, considerando as particularidades de cada mandato.
Cada gabinete, comissão, liderança, estrutura da Mesa, com suas atividades cotidianas, devem estar ao livre acesso e acompanhamento da sociedade, que poderá, desta forma, exercer seu controle e contribuir para que a instituição se fortaleça. O Congresso Nacional deve estar preparado para trabalhar de forma sintonizada com um nível de exigência cada vez maior, em um período histórico distinto daquele que inaugurou determinadas práticas, que até então não tínhamos tido a determinação e, talvez, coragem de aboli-las.
*Paulo Pimenta é deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul e jornalista.
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