quinta-feira, 11 de julho de 2013

Quem é quem nos protestos



Em nossa última coluna, alertávamos para o risco do movimento dos jovens brasileiros estar sendo usurpado pelos que perderam ontem nas urnas e agora querem ganhar no grito, aproveitando-se de um movimento espontâneo nascido nas ruas de São Paulo, por causa de um reajuste nas tarifas de ônibus,  que acabou ganhando as ruas das principais cidades brasileiras.

Na minha coluna, citei o caso dos manifestantes de Miami, cerca de 400, segundo seus organizadores,  que, sob o pretexto de apoiar o movimento no Brasil pela melhoria dos serviços públicos em seus diversos segmentos, querem na verdade aproveitar a carona para pregar a derrubada do governo Dilma, legitimamente eleito pela maioria do povo brasileiro.  Confirmei com números do TSE que os brasileiros de Miami votaram com Serra, 59 por cento, e Dilma, 15 por cento. Portanto não é preciso ser genial para deduzir que ali, naqueles 400,  estavam muitos dos derrotados de 2010.

Alguns leitores entenderam que eu estava me colocando contra o direito de manifestação,  coisa que não existe em meu texto.  Ao contrário, sou plenamente favorável às manifestações populares em suas diversas formas, principalmente nas ruas, um legítimo exercício de cidadania. Nem poderia ser contra, pois eu mesmo participei de inúmeros protestos de rua, quando aluno da Faculdade Nacional de Direito, num tempo em que as forças da repressão não eram contemplativas como agora.

Mas o fato é que recebi comentários de alguns (poucos) leitores, aparentemente líderes das manifestações de Miami, que deixei de publicar por estarem eivados de ódio e ofensas pessoais, revelando bem a intransigência dessas pessoas que preferem agredir do que responder com argumentos a quem não se alinha com suas ideias.

Felizmente, não estou só em minhas observações.  Aliás, estou em ótima companhia.  Acabo de ler na revista Forum artigo do teólogo e escritor  Leonardo Boff (foto) cujas observações vão ao encontro das nossas.  Dele, cito alguns trechos que submeto à reflexão dos leitores:

É notório que a direita brasileira especialmente aquela articulação de forças que sempre ocupou o poder de Estado e o tratou como propriedade privada (patrimonialismo), apoiada pela midia privada e familiar, está se aproveitando das manifestações massivas nas ruas para manipular esta energia a seu favor. A estratégia é fazer sangrar mais e mais a Presidenta Dilma e desmoralizar o PT e assim criar uma atmosfera que lhes permite voltar ao lugar que por via democrática perderam.

Se por um lado não podemos nos privar de críticas ao governo do PT , mas críticas construtivas, por outro, não podemos ingenuamente permitir que as transformações politico-sociais alcançadas nos últimos 10 anos sejam desmoralizadas e, se puderem, desmontadas por parte das elites conservadoras. Estas visam a ganhar o imaginário dos manifestantes para a sua causa que é inimiga de uma democracia participativa de cariz popular.

Seria grande irresponsabilidade e vergonhosa traição de nossa parte, entregar à velha e apodrecida classe política aquilo que por dezenas de anos temos construido, com tantas oposições: um novo sujeito histórico,  o PT e partidos populares, com a inserção  na sociedade de milhões de brasileiros. Esta classe se mostra agora feliz com a possibilidade de atuar sem máscara e mostrando suas intenções antes ocultas: finalmente, pensa, temos chance de voltar e de colocar esse povo todo que reclama reformas, no lugar que sempre lhe competiu historicamente: na periferia, na ignorância e no silenciamento. Aí não incomoda nem cria caos na ordem que por séculos construimos mas que, se bem olharmos, é ordem na desordem ético-social.

Então, se devemos criticar  a nossa classe política por ser corrupta e o Estado por ser ainda, em grande parte, refém da macro-economia neoliberal, devemos fazê-lo com critério e senso de medida. Caso contrário, levamos água ao moinho da direita. Esta se aproveita desta crítica, não para melhorar a sociedade em benefício do povo que grita na rua, mas para resgatar seu antigo poder político especialmente, aquele ligado ao poder de Estado a partir do qual garantia seu enriquecimento fácil. Especialmente a mídia privada e familiar, cujos nomes não precisam ser citados, está empenhada fevorosamente neste empreitada de volta ao  velho status quo.

Por isso, as demonstrações devem continuar na rua contra as tramóias da direita. Precisam estar atentas a esta infiltração que visa a mudar o rumo das manifestações. Elas invocam a segurança pública e a ordem a ser estabelecida. Quem sabe, até sonham com a volta do braço armado para limpar as  ruas.

Dai, repetimos, cabe reforçar o governo de Dilma, cobrar-lhe, sim,  reformas políticas profundas, evitar a histórica conciliação entre as forças em tensão e o oposição para juntas novamente esvaziar o clamor das ruas e manterem um status quo que prolonga  benefíciois compartilhados.

Desta forma se enfrentarão as articulações da direita e se poderá com mais força reclamar reformas políticas de base que vão na direção de atender a infra-estrutura reclamada pelo povo nas ruas: melhor educação, melhores hospitais públicos, melhor transporte coletivo e menos violência na cidade e no campo.

Nesta quinta-feira,  transformada em Dia Nacional de Luta, milhares de manifestantes estarão nas ruas de todo o Brasil.  É preciso que estejam atentos à  presença daqueles que pretendem transformar os verdadeiros anseios populares em benefício de interesses políticos pessoais. A pureza do movimento popular não deve ser conspurcada por quem apenas está interessado em golpear as instituições.


Eliakim Araujo, Direto da Redação

2 comentários:

Unknown disse...

Mais uma vez, parabéns pelo artigo. Os protestos de junho nada têm a ver com os que ocorreram hoje em todo o país, cujas pautas foram legítimas. O que se viu em junho, salvo raras exceções, foi um bando de jovens sem rumo ou, talvez, com muito rumo: o rumo da direita radical.

Unknown disse...

Mais uma vez, parabéns pelo artigo. Os protestos de junho nada têm a ver com os que ocorreram hoje em todo o país, cujas pautas foram legítimas. O que se viu em junho, salvo raras exceções, foi um bando de jovens sem rumo ou, talvez, com muito rumo: o rumo da direita radical.