Paulo Sérgio Leite Fernandes é o decano dos criminalistas em São Paulo. Aos 79 anos, se define como um sobrevivente.
Na ativa desde 1960, Fernandes é autor de vários livros jurídicos e
romances. Foi professor de Processo Penal e conselheiro federal da Ordem
dos Advogados do Brasil.
“Procuro ensinar aos moços a arte de dizer não. Desgraçadamente, as
faculdades ensinam a obediência estrita. Formam advogados medrosos. É
ruim para o Brasil”, diz.
Ele deu o seguinte depoimento ao DCM sobre o juiz Sérgio Moro, a Operação Lava Jato e o sistema de delação premiada.
“Eu passei a ver o Direito no sentido quase psiquiátrico.
Classifico o juiz Moro como uma figura heroica, psicanaliticamente. Bem e
mal. O juiz Moro é jovem. Ele é a encarnação do vingador. Ele acredita
naquilo.
Nós precisamos de quem acredite. O ser humano precisa do ícone do
santo, do superhomem, do animal a ser seguido. Isso funciona até mesmo
entre as formigas vermelhas da Amazônia. Nós também agimos como agem os
cães ou os tigres que marcam seu território. Podemos até nos sofisticar,
mas o princípio é o mesmo. Nós somos iguaizinhos.
Temos os chamados animais alfa. O touro, que guia a boiada até o
precipício… Vão 500 bois atrás dele. Até as hienas têm liderança.
Dentro desta classificação meio zoológica, o juiz Moro é um animal alfa.
Além disso, ele tem legitimação jurídica para fazer o que faz.
Moro representa a entronização de tudo aquilo em que o povo acredita no
sentido do bem combater o mal.
Ele não é, obviamente, perfeito. O Chico Buarque fez uma canção
que fala que “procurando bem, todo o mundo tem pereba”. O Moro tem suas
perebas também.
O sistema processual penal francês é dicotomizado. Tem o juiz de
instrução e o juiz que se diria julgador. O juiz de instrução francês
tem origem no ministério público. Ele é um investigador. Colhe as provas
e as entrega ao poder judiciário encarregado do contraditório penal. O
juiz de instrução é, na verdade, um perseguidor.
O juiz penal, embora não seja inerte, é imparcial — ao menos em
tese. A gente sabe que não existe imparcialidade. Nós inventamos que ele
é imparcial. É coisa nenhuma. Ele depende até mesmo do estado de humor,
se trepou com a mulher na noite anterior etc. Você acorda bem, acorda
mal, acorda deprimido, impressionado.
O juiz acorda assim. Em tese, porém, a imparcialidade é prerrogativa do magistrado.
O juiz Moro é parcial e a parcialidade resulta desse pressuposto
de que ele é o salvador da moralidade do país. Ele veste a toga e se
torna o sacerdote mor da restauração moral do trato da coisa pública.
Moro acredita nisso. É um fenômeno biopsíquico. Não acredito que
isso seja especialmente uma boa distribuição da justiça. Esse tipo de
compulsão leva o julgador a exacerbar a atividade investigatória e a
esquecer a necessidade de equilíbrio que é a garantia do contraditório.
Esse jovem, embora convicto de praticar o bem, quando da
distribuição da justiça no sentido de equilíbrio entre acusação e
defesa, é um homem perigoso.
O perigo do arbítrio desmedido.
Hoje ele é o ser humano mais determinado que o Brasil conhece. Ele é um compulsivo. Ele busca o Santo Graal.
No caso da Venina, ele está funcionando como um juiz de instrução
[o Ministério Público Federal dispensou a ex-funcionária da Petrobras
Venina da Fonseca por “irrelevância”, mas o juiz Sérgio Moro decidiu
manter seus depoimentos].
Não é normal no sentido forense. Extrapola os limites. O juiz
penal brasileiro não é extático, mas é inerme. Com esse tipo de atitude,
ele vai além do limite. Se acusação e defesa concordam, você não tem
nem mesmo como reclamar por habeas corpus. Ele se introduz na zona
cinzenta e não passa confiança.
É herança de um imperialismo judicial. No sentido de
investigação, pode ser meritório. No sentido de obediência à nossa
teoria e prático do processo penal, é uma extravagância.
Moro é diferente do Joaquim Barbosa. Barbosa é uma criatura
emocionalmente desarticulada. O Moro tem componentes compulsivos bem
acomodados num comportamento externo obediente às normas de conduta
perante a comunidade.
Nós somos estritamente comportamentais. Na vida pública, ele
parece ser irrepreensível. Educado, trata as partes com cordialidade,
aparentemente tem saúde boa e está fazendo o serviço dele.
O doutor Barbosa vestiu uma capa de Batman para lutar contra os
meliantes. Se o juiz se conscientizar de que é um instrumento de
equilíbrio no combate entre o bem e o mal, ótimo. Ele nunca é o fautor.
Esse combate entre o bem e o mal é tão sinuoso que o bandido e o mocinho
se entrelaçam. É uma simbiose. Eu tenho a esquisita sensação de que o
mocinho é também o bandido.
Na delação premiada, para haver a chamada “colaboração eficaz”,
eu, agente do bem, ofereço a você, delinquente, o perdão se você delatar
seu confrade, seu irmão, sua mulher.
Ele cometeu uma infração talvez mais grave que o outro. Quando
ofereço o perdão, estou tergiversando porque eu não posso perdoar. Eu
posso perdoar quem se arrepende, talvez, mas não posso perdoar quem tem
como mérito único denunciar quem se comportou da mesma forma. Isso é
tergiversação, não importa o que diz a lei.
Mais ainda: não posso oferecer o perdão sob condição de não tomar
parentes como reféns. Isso é coação e constrangimento. Já houve casos
de negociação assim: “se você poupar minha mulher, eu confesso tudo”.
Isso aconteceu muito durante a ditadura.
O próprio Yousseff. Eu pensaria muito antes de acreditar nele. Há
advogados especialistas na delação premiada. Eu acho podre. O mocinho
vira bandido também. Ele comete um crime para realizar o bem.
Estou falando no sentido ético. Ela é legal. Mas era legal para
os nazistas mandarem os judeus para as câmaras de gás. Virou rotina no
Brasil. Nós copiamos dos Estados Unidos. Acredito que haverá uma reação
na sociedade dentro de cinco ou seis anos.”
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Um comentário:
EM SINTESE Moro é um juiz que esta a serviço da extrema direita, da CIA e ele sabe que essas forças ocultas que o apoiam tem poderes para mandar ele dizer e desdizer o que bem quer prender e soltar quem ele queira, tomar depoimento na tora a qualquer custo. essa é a orientaçao que Moro recebeu e ele esta fazendo exatamente o que mandam ele fazer. Se ele nao tivesse esse apoio ele nao se atreveria a tanto.
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