quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

MAIS SOBRE A VITÓRIA DO POVO INDÍGENA


Martelo (quase) batido
10/12/2008

Filipe Coutinho


Com oito votos contrários à ação que reivindicava a ilegalidade da demarcação em área contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o Supremo Tribunal Federal virtualmente bateu o martelo em torno do caso mais polêmico envolvendo os direitos indígenas no País. Os ministros também votaram pela retirada dos não-indígenas da reserva.

O julgamento foi suspenso quando votaria o ministro Marco Aurélio Mello, que pediu vista do processo, apesar de os três votos ainda não proferidos serem insuficientes para reverter o resultado. Os ministros Celso de Melo e Gilmar Mendes deverão votar somente após a retomada do julgamento, o que deverá ocorrer no início de 2009.

Apesar da maioria absoluta, o resultado do julgamento ainda não pode ser oficialmente declarado. Além dos outros votos, o regimento interno do STF permite que os ministros mudem o voto, algo improvável.

O primeiro a votar foi o ministro Carlos Alberto Direito, responsável pelo primeiro pedido de vista, feito em agosto. O ministro votou parcialmente favorável à demarcação contínua das terras onde vivem 19 mil índios. Direito, entretanto, listou 18 ressalvas à demarcação, todas elas relacionadas a questões de "soberania nacional e interesse público".

Em síntese, as condições propostas pelo ministro têm como objetivo garantir que a demarcação das terras em faixas de fronteira não seja um impasse para a atuação do Exército brasileiro e de outros órgãos federais. "O usufruto das riquezas do solo pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver o interesse público da União", determinou.

Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) feito a pedido de Direito, 57% das faixas de fronteira do País são ocupadas por indígenas. Para o ministro, as ressalvas serão determinantes para os próximos casos de demarcação de terra indígenas a serem julgados. "A decisão desse caso vai certamente consolidar o entendimento da Suprema Corte sobre o procedimento demarcatório com repercussão também para o futuro, daí a necessidade do dispositivo explicitar a natureza de seu alcance".

O relator do processo, ministro Carlos Ayres Britto, acatou as propostas de Direito. "Em linha de princípio, eu concordo", disse. Os ministros Eros Grau, Ellen Gracie, Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski também seguiram o voto de Direito. "A suposta ameaça à soberania nacional chega a ser ofensiva", resumiu Lewandowski. O ministro, aliás, foi o único a defender abertamente a retirada "imediata" dos não-índios.

A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, preferiu acatar 15 das 18 recomendações feitas por Direito, e votou pela demarcação contínua das terras. O ministro Joaquim Barbosa votou a favor da demarcação contínua, mas não comentou as ressalvas apresentadas por Direito.

Com exceção de Direito e Joaquim Barbosa, todos os ministros que se pronunciaram também adiantaram o voto para cassar a liminar que mantém os arrozeiros na região. Após insistência do relator Ayres Britto para oficializar a cassação da liminar, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, preferiu aguardar o voto de Marco Aurélio Mello. A pressão de Ayres Britto irritou Mello. “Indago se o plenário ainda é um colegiado”, disse. Além de Mendes e Marco Aurélio, falta votar o ministro Celso de Mello.

O julgamento do caso Raposa Serra do Sol começou em agosto. Os ministros julgam o pedido de anulação das terras feito pelos senadores de Roraima Augusto Botelho (PT) e Mozarildo Cavalcanti (PTB). Além do jogo de interesses em relação a uma área de 1,7 milhão de hectares, o caso ganhou dimensão em razão do conflito eminente entre indígenas e arrozeiros que vivem na região. O ministro Eros Grau classificou o julgamento como o "mais sério conflito social" desde que ele chegou ao tribunal, em 2004.

Os arrozeiros e o governo de Roraima defendiam que a reserva deveria ser em “ilhas”. O governo federal, por meio do Ministério da Justiça e Fundação Nacional do Índio (Funai), é a favor da demarcação contínua das terras, justamente como votaram os oito ministros.

A lista completa com as 18 condições apresentadas pelo ministro Carlos Alberto Direito pode ser conferida em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=100568.
Fonte:CartaCapital.

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