segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Frases presas

  
Hoje, quero comentar algumas frases que foram cunhadas na semana que passou. Não são frases soltas, pois são construções formais que expressam conteúdos ideológicos bem definidos.  Algumas delas mostram que nem tudo está perdido para aqueles que, como eu, perseguem suas utopias. Outras, porém, revelam a imensidão do caminho a perseguir para que, aqui no Brasil, alcancemos os nossos melhores desígnios.



1.     Melhor ouvir isso do que ser surdo?

Em artigo publicado em “O Globo”, o colunista Artur Xexéo estranhou a ausência do pessoal do “Black Bloks” no “Rock in Rio”. Ele aventou como uma possível razão o fato de a Cidade do Rock ficar muito longe... Eu já acho que são mesmo públicos distintos aqueles que se esgoelam histericamente diante de certos sons infernais – entre eles o tilintar das caixas registradoras do Medina e da Globo - , e aqueles que gritam reivindicações de cunho social, levando porrada da policia. O músico “Marcel Schmier”, da banda “Destruction” (?), teria dito, para deleite do público do “Rock in Rio”:  “Meu português é uma merda, so let’s speak in the language of heavy metal” . Felizmente, não tive que ouvir nenhuma das duas linguagens...

2.     Uns assumem , outros negam ...

Enquanto estamos assistindo, apesar dos pesares, à posse de  diversos médicos estrangeiros em lugares inóspitos, municípios esquecidos desse Brasil para onde os nossos profissionais não querem ir , somos, com frequência, sacudidos com as reações corporativas da classe médica nacional, que já perdeu essa parada para o povo, a julgar pelas pesquisas realizadas.  A última declaração é para se incorporar aos anais: o presidente de um dos Conselhos Regionais  de Medicina , ao renunciar ao cargo para não ter que conceder os registros provisórios aos  formados no exterior, citou Martin Luther King ao mencionar uma posição que  “não é segura, não é elegante, não é popular”, mas que tem que ser feita “porque a  nossa consciência nos diz que é essa a atitude correta”.  Hipócrates e o próprio Luther King, não sei se de mãos dadas, devem estar protestando no Além. Em tempo: não houve informações sobre se o demissionário  se aproveitou do embalo e  também se demitiu da profissão...

3.     Os homens públicos e as privadas

A semana teve um episódio emblemático, com repercussões idem. O personagem foi  o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) , cujas palavras e atos são tratados pela mídia como folclóricos, mas que traduzem, no fundo, um posicionamento aplaudido por todos os saudosos da ditadura que ainda andam por  aí.  Inserindo-se onde – por razões óbvias -  não foi chamado , quando da visita da Comissão da Verdade às antigas dependências do DOI-CODI, reagiu aos que não o queriam ali e foi acusado de dar um soco (que ele nega e chama de “empurrão por baixo”), no Senador Randolfe Rodrigues, do PSOL. Quando alertado de que haveria uma representação do PSOL contra ele, Bolsonaro foi enfático: “Estou me lixando para essa representação! Se chegar no meu gabinete, vou colocar na privada”. Suprema ironia: o deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) – que em 2009 disse que estava “se lixando para a opinião pública” – foi escolhido nesta quinta-feira como relator da representação. 

4.     Soberaria,  submissão e  silêncio

O episódio da espionagem americana gerou frases de diversas naturezas. As de Dilma foram as esperadas: a soberania brasileira requeria mesmo que fossem proferidas e diante da  plateia correta, a assembleia da ONU:  “O que temos diante de nós é um sério caso de violação dos direitos humanos e desrespeito à soberania. Jamais uma soberania pode firmar-se em detrimento de outra “. Mas temos no Brasil, sempre tivemos, o pensamento entreguista de plantão, o da turma que acha que “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. Ler as cartas dos leitores da grande imprensa é um prato cheio para um exame dessa natureza. É a tal alienação, ou seja, a exaltação dos valores alheios em detrimento dos próprios. O ruim mesmo é quando a coisa vem de outros segmentos. Um exemplo: o senador Jarbas Vasconcelos (que recordo com saudades do tempo em que combatia a ditadura) ,  talvez por confundir a cabocla e pequena política partidária nacional com  interesses maiores da cidadania, afirmou: “ Foi um expediente totalmente eleitoreiro, medíocre, que envergonha a história da política externa brasileira. Uma iniciativa ruim para a senhora Dilma Rousseff e seu partido, porém muito pior, muito mais grave, para o Brasil, como nação". Mas houve também frases não ditas: as de Obama. Não sei o que considero pior nesse caso: a conveniente subserviência de alguns brasileiros ou a arrogância acintosa do estrangeiro agressor.

5 -  Celso de Mello x  Midia. Vindo de quem vem...

O Ministro Celso de Mello, sempre apontado como um cidadão ínclito, em entrevista a uma jornalista da Folha, desabafou: “Eu honestamente, em 45 anos de atuação na área jurídica, como membro do Ministério Público e juiz do STF, nunca presenciei um comportamento tão ostensivo dos meios de comunicação sociais buscando, na verdade, pressionar e virtualmente subjugar a consciência de um juiz”. Em editorial do dia seguinte, a Folha reagiu: “Ainda que houvesse a tal tentativa de subjugação, seria impróprio tratar todos os veículos de comunicação como um corpo monolítico. Se muitos opinaram contra o cabimento do recurso, tantos outros manifestaram-se a favor dele. Segundo --e mais importante--, a confusão entre a legítima manifestação de opinião na esfera pública e a perniciosa tentativa de intimidar magistrados”. Duas posições. Uma, vindo de quem vem, merece reflexão. A outra é bem previsível.  É seguir acompanhando para tirar conclusões a respeito.


Rodolpho Motta LimaAdvogado formado pela UFRJ-RJ (antiga Universidade de Brasil) e professor de Língua Portuguesa do Rio de Janeiro, formado pela UERJ , com atividade em diversas instituições do Rio de Janeiro. Com militância política nos anos da ditadura, particularmente no movimento estudantil. Funcionário aposentado do Banco do Brasi.Direto da Redação.

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