Decisão adiada
O Supremo Tribunal
Federal (STF) poderia ter resolvido na quinta-feira se aceita ou não os tais
embargos infringentes e, assim, abreviado, pelo menos em cinco dias, o
julgamento da infindável Ação Penal 470. Mas o ministro-presidente, Joaquim
Barbosa, preferiu adiar o desenlace dessa preliminar. Assim, caberá ao decano
Celso de Mello, na próxima quarta-feira, decidir se a condenação dos réus do
escândalo do mensalão poderá, finalmente, transitar em julgado, ou se, aceitos
os recursos apresentados pela defesa de 12 réus, terá início a revisão das suas
sentenças.
Uma reviravolta na
apreciação do mérito desses veredictos condenatórios, embora improvável, poderá
resultar, jamais na absolvição completa, mas pelo menos na redução das penas de
José Dirceu e companheiros. E, politicamente mais relevante, anularia o
atestado judicial de que os antigos dirigentes do Partido dos Trabalhadores
(PT) formaram uma quadrilha para comprar apoio parlamentar((muito importante esse parágrafo).
Nesse que é o mais
longo e mais importante julgamento da história do STF, Joaquim Barbosa
construiu, como relator do processo, a reputação de rigoroso e obstinado
inimigo dos privilégios e da impunidade dos poderosos. Mas foi estranho ter
encerrado abruptamente a sessão, impedindo que Celso de Mello - que havia
pedido para votar, prometendo fazê-lo rapidamente - proferisse seu voto.
Manifestações anteriores do decano podem levar a supor que ele se inclina pela
admissibilidade dos embargos infringentes - o que afrontaria a opinião pública,
que já está perdendo a paciência com esse processo infindável, mas cujo
resultado aplaudiu e gostaria de ver respeitado.
Mas, durante o
julgamento do mérito, Celso de Mello foi, sempre, um dos juízes mais severos.
Proferiu votos que são categóricos libelos acusatórios, dos quais o ministro
Gilmar Mendes fez questão de citar um trecho: "Formou-se na cúpula do
poder um estranho e pernicioso poder constituído para cometer crimes, agindo
nos subterrâneos do poder, à sombra do Estado".
Se o voto de Celso
de Mello vier a admitir os novos recursos da defesa, o processo certamente se
prolongará, o que ninguém parece desejar, a não ser os próprios réus. Mais do
que isso, o voto favorável tornará possível que, com a nova composição da
Corte, o julgamento do mérito venha a ser reformado. Ou seja, eventual exame
dos novos embargos certamente abrirá novas esperanças para condenados como José
Dirceu, que almeja ser beneficiado com o cumprimento da pena em regime
semiaberto. Nesse caso, a reputação de probidade e retidão consagrada pela
Suprema Corte - uma instituição que deve pairar acima da paixão política - no
julgamento do mensalão certamente será maculada aos olhos da Nação.
É mais do que hora
de a Ação Penal 470, iniciada há sete anos e há mais de um ano em julgamento,
chegar a termo. Mas essa responsabilidade não se pode cumprir ao preço do
açodamento e do voluntarismo, incompatíveis com a ideia de justiça. Manobras
como a praticada na última quinta-feira, mesmo que para neutralizar expedientes
protelatórios, são reprováveis porque nivelam por baixo uma disputa que deveria
ser elevada. Produzem o mesmo efeito deletério da modificação do corpo
julgador, após a proclamação das sentenças, sentindo-se os novos ministros à
vontade para julgar recursos a decisões que não prolataram.
E é aí, nos limites
legais, no ordenamento jurídico que disciplina o trabalho da Justiça, que
parece se encontrar o grande nó que embarga o desenvolvimento relativamente
tranquilo dos feitos judiciais no Brasil. Bom exemplo disso é essa absurda
controvérsia a respeito da admissibilidade ou não dos chamados embargos
infringentes nas ações penais em julgamento pelo Supremo Tribunal Federal.
Embora, talvez, sem o teor "expresso" reclamado pelos exegetas mais
cartesianos, a Constituição e a lei ordinária já revogaram o instituto do
embargo infringente constante do artigo 333 do Regimento Interno do STF. Esta
disposição perdura no regimento pelo simples fato de que até agora simplesmente
ninguém se preocupou em eliminar a absurda contradição que ela representa. É de
esperar que, daqui para a frente, os ministros da Suprema Corte se animem a
encarar o problema.
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