Jurista Ives Gandra
Martins, um dos mais respeitados do País, concede entrevista bombástica à
jornalista Mônica Bergamo; nela, afirma que estudou todo o acórdão da Ação
Penal 470 e não encontrou uma única evidência contra o ex-ministro da Casa
Civil; mais: disse ainda que a teoria do domínio do fato, importada pelo STF
para julgar o caso específico de Dirceu, não é usada nem na Alemanha; Gandra
diz ainda que, depois do precedente, abre-se um território de grande
"insegurança jurídica" no País para executivos e empresários, que
poderão ser condenados da mesma forma; detalhe: Gandra é um dos mais notórios
conservadores do País e antagonista histórico do petismo
247 - A entrevista
do jurista Ives Gandra Martins à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.
Paulo, cairá como uma bomba no meio jurídico. Um dos mais respeitados e
consistentes juristas do País, Gandra Martins afirma que, em todo o acórdão da
Ação Penal 470, não se encontra uma única prova contra o ex-ministro da Casa Civil,
José Dirceu. Ele afirma ainda que a condenação imposta a ele pelo Supremo
Tribunal Federal atira o País num terreno de grande "insegurança
jurídica", em que empresários e executivos poderão ser condenados pela
teoria do "domínio do fato" – que não é aplicada nem na Alemanha.
A entrevista será o
assunto mais comentado nos meios políticos e jurídicos nos próximos dias, mas,
curiosamente, a Folha não deu sequer chamada de capa a ela, em sua edição
dominical. Confira, abaixo, os pontos mais importantes do que Ives Gandra
Martins, que é também um dos mais notórios conservadores do País, disse a
Mônica Bergamo (a entrevista completa pode ser lida aqui):
O domínio do fato
Você tem pessoas
que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você
não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela – e basta um só
depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está
condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora
esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com
56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no
Supremo foi a do "in dubio pro reo" [a dúvida favorece o réu].
Dirceu, condenado
sem provas
O domínio do fato é
novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram
de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base
nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás,
pela teoria do domínio do fato, o maior beneficiário era o presidente Lula, o
que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.
Embargos
infringentes
Eu me dou bem com o
Zé, apesar de termos divergido sempre e muito. Não há provas contra ele. Nos
embargos infringentes, o Dirceu dificilmente vai ser condenado pelo crime de
quadrilha.
A pressão da mídia
O ministro Marco
Aurélio [Mello] deu a entender, no voto dele [contra os embargos infringentes],
que houve essa pressão. Mas o próprio Marco Aurélio nunca deu atenção à mídia.
O [ministro] Gilmar Mendes nunca deu atenção à mídia, sempre votou como quis.
Eles estão preocupados, na verdade, com a reação da sociedade. Nesse caso se
discute pela primeira vez no Brasil, em profundidade, se os políticos
desonestos devem ou não ser punidos. O fato de ter juntado 40 réus e se
transformado num caso político tornou o julgamento paradigmático: vamos ou não
entrar em uma nova era? E o Supremo sentiu o peso da decisão. Tudo isso
influenciou para a adoção da teoria do domínio do fato.
Julgamento político
Pode ter alguma
conotação política. Aliás o Marco Aurélio deu bem essa conotação. E o Gilmar
também. Disse que esse é um caso que abala a estrutura da política. Os
tribunais do mundo inteiro são cortes políticas também, no sentido de manter a
estabilidade das instituições. A função da Suprema Corte é menos fazer justiça
e mais dar essa estabilidade. Todos os ministros têm suas posições, políticas
inclusive.
A postura de
Ricardo Lewandowski
Ele ficou
exatamente no direito e foi sacrificado por isso na população. Mas foi mantendo
a postura, com tranquilidade e integridade. Na comunidade jurídica, continua
bem visto, como um homem com a coragem de ter enfrentado tudo sozinho.
A postura de Joaquim
Barbosa
É extremamente
culto. No tribunal, é duro e às vezes indelicado com os colegas. Até o governo
Lula, os ministros tinham debates duros, mas extremamente respeitosos. Agora,
não. Mudou um pouco o estilo. Houve uma mudança de perfil.
Os choques entre
poderes
A tradição, por
exemplo, de nunca invadir as competências [de outro poder] não existe mais. O
STF virou um legislador ativo. Pelo artigo 49, inciso 11, da Constituição,
Congresso pode anular decisões do Supremo. E, se houver um conflito entre os
poderes, o Congresso pode chamar as Forças Armadas. É um risco que tem que ser
evitado. Pela tradição, num julgamento como o do mensalão, eles julgariam em
função do "in dubio pro reo". Pode ser que reflua e que o Supremo
volte a ser como era antigamente. É possível que, para outros [julgamentos],
voltem a adotar a teoria do "in dubio pro reo".
Insegurança
jurídica
A teoria do domínio
do fato traz insegurança para todo mundo.
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