Por Lula Miranda
Basta de
hipocrisia! Abaixemos as armas em nome da reforma política. Nos rendamos todos
em nome da utopia!
Jorge Amado
retratou com maestria em A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água a hipocrisia
das classes dominantes no Brasil. Grande história que nos foi contada, de modo
picaresco, pelo grande e saudoso escritor baiano. Leia o livro e/ou assista ao
filme. Tal qual Quincas nessa obra-prima da literatura brasileira, a velha
política e os velhos políticos vivem em meio à hipocrisia, promiscuidade e
falsa moral da classe dominante e precisam renascer e voltar o seu olhar e
afetos para os pobres, os pretos, as prostitutas e todos os desassistidos desse
país de imensa vastidão, que não cabe em regionalismos reducionistas, disputas
paroquiais e preconceitos rastaqueras.
Porém, a despeito
de todas as verdades gritantes, na vida real... As grandes obras literárias
mofam nas prateleiras das poucas bibliotecas públicas de que dispõem os
municípios brasileiros ou repousam esquecidas nas estantes das chamadas “casas
de família”. As lições se sucedem. Uma após a outra. Mas nada, ou muito pouco,
aprendemos. As verdades parecem sucumbir às mentiras e ao cinismo.
Escândalos de corrupção se repetem.
Sucessivamente. Freneticamente. Um após o outro. Um envolve os políticos do
partido “X”; outro envolve políticos do partido “Y”, um outro, os do partido
“Z”. É vasto, risível, enfadonho o abecedário partidário. Após tantos
escândalos nada parece mais nos escandalizar. Tamanha a lassidão e hipocrisia
de nossos homens públicos. Tamanha a
lassidão e hipocrisia de nossos jornalistas. Tamanha a lassidão e hipocrisia da
sociedade.
Mas eis que escuto
finalmente uma voz dissonante em meio ao falso moralismo e hipocrisia
dominantes, em meio às vozes de juízes e verdugos de um teatro montado para
entreter as galerias sedentas por Justiça.
Embora eles não saibam e não queiram saber o que vem a ser a Justiça de
fato.
Disse um novo
ministro que chega à Suprema Corte: "[O julgamento da AP 470] terá sido em
vão se não forem tomadas providências para a reforma do sistema político".
E disse mais ainda: "O país precisa com uma urgência desesperada de uma
reforma política, não importa se feita pelo Congresso federal ou por meio de
participação da sociedade" (...) Vale a pena ler a íntegra da fala do
ministro Barroso com bastante atenção.
Venho dizendo e
repetindo essas mesmas palavras aqui há meses, juntamente com alguns poucos e
raros jornalistas e comentaristas de política, numa espécie de “jornalismo de
resistência” [“resistência” às denúncias capciosas, ao falso moralismo e à
justiça seletiva/hipócrita e ao chamado “jornalismo de mercado”].
Venho dizendo e
repetindo essas mesmas palavras, aqui nesse espaço, há meses, em vão... Serão
também vãs as palavras desse novo ministro do Supremo, que me parece realmente
imbuído de nobre intento, que parece se colocar a serviço da cidadania e da
defesa da coisa pública [a República – que, já nos ensinou a história, se
sobrepôs ao velho e decadente regime monárquico dos conservadores e
escravocratas]? Para que uma nova ordem se instaure, a velha tem que morrer.
Enfim, por fim,
finalmente, um juiz da Suprema Corte não se dobra de joelhos diante do império
silente e hipócrita dos eternos “donos e senhores do Brasil” e se posiciona em
defesa da pátria e da Constituição?! Ou, melhor dizendo, em defesa daquilo que
nos constitui!
Quantas vezes os
velhos hipócritas e as oligarquias decrépitas, seus áulicos ou descendentes de
torpe estirpe, terão que morrer para que nasça o novo? Quantas mortes lhes
serão necessárias?!
Morte a todos os
caciques e oligarcas! Que morram e morram novamente, quantas vezes for necessário,
para uma morte definitiva.
Não, não devemos
nos preocupar ou perder tempo em nominá-los, pois o que importa – e a história
e os escritores insistem em nos ensinar essa lição – não são as pessoas, os
nomes ou os partidos que condenamos. Devemos condenar e mudar todo o sistema
espúrio, pois aí se esconde solerte a grande ratazana, que produz, em suas
pútridas entranhas, os pequenos ratos nos subterrâneos da política. Se não
exterminarmos a grande ratazana ela prosseguirá parindo suas crias imundas.
Não bastou o duro
processo do impeachment de Collor?! Os anões do Orçamento? Os deputados
comprados por FHC (ou, vá lá, por seus operadores)? Ou o caso Lunus? Não foi o
bastante o suposto “mensalão” tucano? Ou o petista? Ou o demista?
Não é ainda suficiente
o escandaloso caso do tal “propinoduto” tucano, agora nas manchetes?! Nada
parece ser o bastante para saciar a hipocrisia da parte mais reacionária e
conservadora da nossa elite. Eles ainda se sentem confortáveis em sua
Casa-Grande. E, para eles, filhos do império do conservadorismo, com sua
herança bastarda, que se dane a senzala!
Basta!!!
Nada parece ser
suficiente para aplacar a irrefreável fúria dos militantes e “guerreiros” de
uma estúpida batalha política que, insensata, se realiza sobre os escombros da
ética e da ruína da verdadeira causa original de nossa utopia: a construção de
uma grande nação e o bem-estar de todos os seus cidadãos.
Basta de
hipocrisia! Abaixemos as armas em nome da reforma política. Nos rendamos todos
em nome da utopia!
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