domingo, 18 de agosto de 2013

A morte e a morte da velha política



Por Lula Miranda 


Basta de hipocrisia! Abaixemos as armas em nome da reforma política. Nos rendamos todos em nome da utopia!


Jorge Amado retratou com maestria em A Morte e a Morte de Quincas Berro d’Água a hipocrisia das classes dominantes no Brasil. Grande história que nos foi contada, de modo picaresco, pelo grande e saudoso escritor baiano. Leia o livro e/ou assista ao filme. Tal qual Quincas nessa obra-prima da literatura brasileira, a velha política e os velhos políticos vivem em meio à hipocrisia, promiscuidade e falsa moral da classe dominante e precisam renascer e voltar o seu olhar e afetos para os pobres, os pretos, as prostitutas e todos os desassistidos desse país de imensa vastidão, que não cabe em regionalismos reducionistas, disputas paroquiais e preconceitos rastaqueras. 

Porém, a despeito de todas as verdades gritantes, na vida real... As grandes obras literárias mofam nas prateleiras das poucas bibliotecas públicas de que dispõem os municípios brasileiros ou repousam esquecidas nas estantes das chamadas “casas de família”. As lições se sucedem. Uma após a outra. Mas nada, ou muito pouco, aprendemos. As verdades parecem sucumbir às mentiras e ao cinismo.

 Escândalos de corrupção se repetem. Sucessivamente. Freneticamente. Um após o outro. Um envolve os políticos do partido “X”; outro envolve políticos do partido “Y”, um outro, os do partido “Z”. É vasto, risível, enfadonho o abecedário partidário. Após tantos escândalos nada parece mais nos escandalizar. Tamanha a lassidão e hipocrisia de nossos homens públicos. Tamanha  a lassidão e hipocrisia de nossos jornalistas. Tamanha a lassidão e hipocrisia da sociedade.

Mas eis que escuto finalmente uma voz dissonante em meio ao falso moralismo e hipocrisia dominantes, em meio às vozes de juízes e verdugos de um teatro montado para entreter as galerias sedentas por Justiça.  Embora eles não saibam e não queiram saber o que vem a ser a Justiça de fato.

Disse um novo ministro que chega à Suprema Corte: "[O julgamento da AP 470] terá sido em vão se não forem tomadas providências para a reforma do sistema político". E disse mais ainda: "O país precisa com uma urgência desesperada de uma reforma política, não importa se feita pelo Congresso federal ou por meio de participação da sociedade" (...) Vale a pena ler a íntegra da fala do ministro Barroso com bastante atenção.

Venho dizendo e repetindo essas mesmas palavras aqui há meses, juntamente com alguns poucos e raros jornalistas e comentaristas de política, numa espécie de “jornalismo de resistência” [“resistência” às denúncias capciosas, ao falso moralismo e à justiça seletiva/hipócrita e ao chamado “jornalismo de mercado”].

Venho dizendo e repetindo essas mesmas palavras, aqui nesse espaço, há meses, em vão... Serão também vãs as palavras desse novo ministro do Supremo, que me parece realmente imbuído de nobre intento, que parece se colocar a serviço da cidadania e da defesa da coisa pública [a República – que, já nos ensinou a história, se sobrepôs ao velho e decadente regime monárquico dos conservadores e escravocratas]? Para que uma nova ordem se instaure, a velha tem que morrer.

Enfim, por fim, finalmente, um juiz da Suprema Corte não se dobra de joelhos diante do império silente e hipócrita dos eternos “donos e senhores do Brasil” e se posiciona em defesa da pátria e da Constituição?! Ou, melhor dizendo, em defesa daquilo que nos constitui!

Quantas vezes os velhos hipócritas e as oligarquias decrépitas, seus áulicos ou descendentes de torpe estirpe, terão que morrer para que nasça o novo? Quantas mortes lhes serão necessárias?! 

Morte a todos os caciques e oligarcas! Que morram e morram novamente, quantas vezes for necessário, para uma morte definitiva.

Não, não devemos nos preocupar ou perder tempo em nominá-los, pois o que importa – e a história e os escritores insistem em nos ensinar essa lição – não são as pessoas, os nomes ou os partidos que condenamos. Devemos condenar e mudar todo o sistema espúrio, pois aí se esconde solerte a grande ratazana, que produz, em suas pútridas entranhas, os pequenos ratos nos subterrâneos da política. Se não exterminarmos a grande ratazana ela prosseguirá parindo suas crias imundas.

Não bastou o duro processo do impeachment de Collor?! Os anões do Orçamento? Os deputados comprados por FHC (ou, vá lá, por seus operadores)? Ou o caso Lunus? Não foi o bastante o suposto “mensalão” tucano? Ou o petista? Ou o demista?

Não é ainda suficiente o escandaloso caso do tal “propinoduto” tucano, agora nas manchetes?! Nada parece ser o bastante para saciar a hipocrisia da parte mais reacionária e conservadora da nossa elite. Eles ainda se sentem confortáveis em sua Casa-Grande. E, para eles, filhos do império do conservadorismo, com sua herança bastarda, que se dane a senzala!

Basta!!!

Nada parece ser suficiente para aplacar a irrefreável fúria dos militantes e “guerreiros” de uma estúpida batalha política que, insensata, se realiza sobre os escombros da ética e da ruína da verdadeira causa original de nossa utopia: a construção de uma grande nação e o bem-estar de todos os seus cidadãos.


Basta de hipocrisia! Abaixemos as armas em nome da reforma política. Nos rendamos todos em nome da utopia!

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