Um protesto que
chocou o Brasil e o mundo, no dia 20 de junho, quando manifestantes depredaram
e tentaram atear fogo no Palácio do Itamaraty, uma das obras-primas de Oscar
Niemeyer, teve o dedo de um integrante da Comissão Executiva Nacional da Rede
Sustentabilidade, partido que a ex-senador Marina Silva tenta criar para
concorrer ao Palácio do Planalto em 2014. Seu nome é Pedro Piccolo Contesini.
Identificado pela Polícia Civil do Distrito Federal, ele tentou se defender em
seu Facebook. "Não cometi crime", disse.
247-Hoje, na nota do
Correio Braziliense (Na rede da investigação) é dito que "mais três
manifestantes foram identificados pela Polícia Civil do DF como responsáveis
pela depredação do Palácio Itamaraty, em 20 de Junho". A nota cita meu
nome e afirma que apareço em imagens "com pedaços de madeira usados para
quebrar as vidraças do prédio tombado".
O que tenho a dizer
sobre isto.
Não cometi crime
20 de junho deste
ano, uma quinta-feira, dia da maior das manifestações acontecidas em Brasília,
dentro do ciclo de protestos de rua naquele período, em todo o país. Três dias
antes houvera outra, aquela na qual os manifestantes subiram nas cúpulas do
Congresso. Participei das duas. Na do dia 20, com mais de 60 mil pessoas
tomando a Esplanada, havia um contingente policial muito maior e mais
agressivo, com a presença da tropa de choque. Ao contrário da anterior, a
estratégia repressiva era de impedir a qualquer custo que as pessoas novamente
subissem sobre o Congresso ou passassem para a praça dos Três Poderes, onde fica
o Palácio do Planalto.
Primeiro foi o uso do
spray de pimenta, em seguida muitas bombas de gás lacrimogêneo e de efeito
moral para todos os lados. A tensão foi num crescendo e o único lugar que
parecia mais desguarnecido de tropas era o Palácio do Itamaraty, para onde a PM
praticamente empurrou uma parte dos manifestantes, ao continuar a jogar bombas
sobre o gramado diante do Congresso. O ar estava tomado de gás, os olhos
ardiam. Tirei a camiseta e coloquei no rosto para me proteger. E também corri para
o lado do Itamaraty.
Esse foi o contexto
de um dia no qual cometi muitos erros, mas só pude ter plena consciência deles
retrospectivamente. O primeiro foi usar na manifestação a camiseta da Rede
Sustentabilidade, que eu vestia porque vinha de uma atividade de coleta de
assinaturas para a formação do partido. Havia entre nós uma avaliação de que a
Rede deveria, como instituição, manter-se afastada das ruas, para evitar
qualquer acusação equivocada (ou manipulada) de que queríamos nos aproveitar
dos protestos, uma vez que, de várias maneiras, eles se identificavam muito com
nossa trajetória e preocupações. Ficara acertado que os membros da Rede que
quisessem participar deveriam fazê-lo como cidadãos, em caráter individual. No
dia 20, eu me orgulhava ingenuamente de estar com a camiseta, mas em nenhum
momento me passou pela cabeça o que estava por vir e que poderia ser danoso à
Rede, algo sob medida para ser explorado por pessoas de má-fé.
Participo de
movimentos sociais e manifestações locais desde que entrei na UnB, em 2006.
Também participei das manifestações na Rio+20, na Cúpula dos Povos e outras em
prol de direitos humanos e do meio ambiente. Mas nunca havia participado de
protestos do porte e do alcance temático e político dos que ocorreram no mês de
junho no Brasil e em Brasília. E nunca de nenhum que atraisse um aparato
policial tão grande e violento como no dia 20.
A manifestação do dia
17 ocorrera sem depredações ou violência, principalmente porque a PM não reagiu
ao acesso de manifestantes ao teto do Congresso. Fiquei extasiado, pois há
muito tempo não se via, no Brasil, um fenômeno deste tipo, em que a população
saía às ruas em peso clamando por causas que iam de melhores serviços públicos
até a refundação da política.
No dia 20, o clima
foi totalmente outro. Já começara com a declaração de confronto de autoridades
policiais, segundo as quais todas as pessoas que descessem na Rodoviária seriam
revistadas. A tensão aumentava na medida em que, a cada movimento da massa de
manifestantes em direção ao Congresso ou aos acessos à praça dos Três Poderes,
a polícia reagia violentamente. Até o momento em que nova investida da PM
provocou uma certa reação de pânico e uma parte dos manifestantes foi em
direção ao Itamaraty. Fui junto. Sem nenhuma intenção de depredar nada, mas
tomado de raiva e sob intensa pressão.
Quando cheguei ao
corredor estreito que dá entrada para o prédio, já havia ali muitas pessoas
concentradas e começava o quebra-quebra. Vários manifestantes jogavam
diferentes objetos contra as vidraças. Vi uma barra de ferro no chão e a
agarrei, inicialmente com a intenção de me defender, caso as coisas piorassem
por ali. Depois, com as emoções à flor da pele, a pressionei algumas vezes
contra diferentes pontos de uma estrutura também de ferro do próprio prédio e
em seguida a joguei. Não quebrei nada!
Fiquei ali por mais
alguns minutos e retornei ao gramado da Esplanada, onde fui atingido na perna
por uma bomba atirada pela polícia, que deixou um edema de uns 15 cms e uma
cicatriz que ainda tenho. Quando cheguei em casa, mais calmo, tive a clara
percepção de ter errado, mas fiquei aliviado por não ter, afinal, causado
nenhum dano a um prédio público e, além disso, tombado como patrimônio
nacional.
Quando a polícia
começou a procurar os participantes do quebra-quebra, fui identificado em fotos
nas quais estava com a barra de ferro nas mãos, mas em nenhuma delas estou
quebrando nada.
No dia 24 de julho,
por volta das 15 horas, enquanto trabalhava no processamento de documentos na
sede da Rede em Brasília, fui chamado para fora da sala por uma mulher e um
homem que se apresentaram como sendo da Polícia Civil. Disseram que eu deveria
acompanhá-los para prestar um depoimento sobre as manifestações no Itamaraty.
Pedi para ir no final da tarde, quando terminasse meu trabalho. Responderam que
era melhor ir naquele momento para “evitar constrangimentos”. No caminho
perguntei se não deveria chamar um advogado e me disseram que seria
desnecessário.
Fui conduzido à 5ª
Delegacia da Polícia Civil, onde falei com o delegado encarregado de
investigações extraordinárias. Eu estava bastante tenso, já que nunca estive
numa situação semelhante. Depois descobri que eu deveria ter ido apenas com uma
intimação formal e acompanhado de advogado.
O delegado me
inquiriu com uma câmera gravando. Perguntei mais uma vez se não precisaria de
presença de um advogado e ele me reiterou que não. Disse que fazia parte de uma
policia republicana e que a relação entre nós ali seria de confiança e que
seria honesto comigo, esperando reciprocidade. Relatei fielmente, respondendo a
suas perguntas, o que fui fazer na manifestação, a que horas cheguei, o
percurso da manifestação e o meu. Mostrou-me fotos das ações no Itamaraty e
admiti que estava lá e que escondia o rosto.
Após a inquirição, o
delegado informou que o processo seguiria para a Polícia Federal, onde seria
produzido um inquérito a ser enviado ao Ministério Público, que decidiria pela
abertura, ou não, de processo judicial. Depois disso, assinei um termo de
depoimento após ser mais uma vez ouvido por outro delegado. Declarei ainda qual
era meu estado emocional e que não ocasionei nenhuma depredação ao prédio do
Itamaraty. Finalmente, que agi por vontade própria, não tendo sido levado ou
orientado a nada, por nenhuma pessoa ou organização.
Hoje vejo com clareza
os excessos que cometi e o risco a que submeti a Rede, de ser caluniada ou
passar a ser objeto de insinuações de ter algo a ver com os quebra-quebras
durante as manifestações. Seria algo impensável, pois a linha política da Rede
vai em outra direção, sem nenhuma afinidade com soluções violentas, venham de
que lado vierem. Estou arrependido, errei politicamente, mas em nenhum momento
cometi crime.
O que me resta é
dizer a verdade, como estou fazendo aqui, e reconhecer meus atos. Peço
desculpas sinceras a todos os companheiros e companheiras da Rede. Reafirmo que
continuarei sendo um “enredado” convicto, persistente e esperançoso.
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